O final da Segunda Guerra Mundial se deu em setembro de 1945, com a rendição do Japão. Aquele país insular da Ásia Oriental foi obrigado a aceitar esta condição depois que os EUA usaram duas bombas atômicas e destruíram as cidades de Hiroshima e Nagasaki, vitimando milhares de civis. Para que a destruição não continuasse – e essa era a ameaça que lhes foi feita – houve a deposição das armas. A Itália já havia capitulado, ainda em 8 de setembro de 1943. Dois anos antes, portanto. Depois foi a vez da Alemanha, em 8 de maio de 1945, quando o Exército Soviético chegou até Berlim.
Tão logo o Exército Imperial Japonês – Dai-Nippon Teikoku Rikugun – se entregou, os militares dos EUA enviaram o fotojornalista Joe O’Donnell (1922-2007) ao Japão, para que documentasse como haviam ficado as duas cidades atingidas pelas bombas nucleares. Isso era importante, até para que fosse entendida a exata dimensão daquilo que haviam feito. Aquelas haviam sido duas experiências reais e sem precedentes, e a realidade precisava ser comparada com o que era até então apenas suposto e imaginado. Durante sete meses ele viajou para o oeste daquele país, fotografando cenas de morte, de muita dor e sofrimento humanos, bem como a devastação total das cidades.
Certo dia ele se deparou com um menino de cerca de dez anos, descalço e com ferimentos nas pernas, roupa pouca e suja, levando nas costas um bebê, acomodado por tirantes, como se fosse uma mochila. Ele tinha feições sérias, como se com elas demonstrasse estar diante de uma missão solene. Naquela época e país, era relativamente comum crianças carregarem seus irmãos menores nas costas. Mas O’Donnell notou que havia algo errado. E fez o registro da imagem. O bebê estava pendente e imóvel, como mergulhado em sono profundo. Então o fotógrafo se deu conta de que daquele sono ele não acordaria: a criança estava morta.
O maior seguiu imóvel, por vários minutos. E o norte-americano também não se afastou, buscando entender o que acontecia. Depois, homens com roupas brancas e máscaras se aproximaram, desamarraram as alças que sustentavam a criança morta e a conduziram até uma pira próxima, onde queimavam outros cadáveres. O menino e o fotógrafo seguiram até o local, onde o pequeno outra vez permaneceu imóvel e sério, vendo o bebê ser consumido pelas chamas. Segundo o relato posterior de O’Donnell, ele apenas mordeu o lábio inferior. Em silêncio estava e em silêncio permaneceu até o final. Então, virou-se e foi embora. Depois detalhes foram descobertos: a morte ocorrera em Nagasaki, onde os pais dos dois também sucumbiram. Coube ao sobrevivente garantir a dignidade de que ao menos um membro da família fosse acompanhado na cerimônia final.
Precisa ser considerada, no entanto, a possibilidade de que essa foto, independente de todo o seu significado e simbolismo, não seja do autor indicado. Ele se envolveu em algumas controvérsias ao longo de sua vida profissional. O jornal New York Times chegou a relatar várias situações que afetavam sua credibilidade, com fotos que alegava serem suas de fato sendo de outros profissionais. Dois destes casos são a de um grupo de aliados na Conferência de Teerã, em 1944; e outra, ainda mais famosa, de John Kennedy Jr. em reverência diante do caixão de seu pai, durante o velório em 1963. O’Donnell comprovadamente não estava na capital do Irã naquele período e nunca fez parte do grupo de imprensa da Casa Branca.
Como ele trabalhava para a Agência de Informação dos Estados Unidos, um escritório ligado ao Secretário de Estado – isso depois de ter atuado junto ao corpo de fuzileiros navais –, sempre foi muito difícil levantar seu histórico de viagens. O governo durante décadas fez de tudo para que isso fosse dificultado, não apenas em relação a ele. O que não mudou muito hoje em dia, onde tudo que interessa ao poder central é listado como “informação sensível”, do interesse da segurança nacional. De qualquer forma, o menino e a sua história são verdadeiros. E, nesse caso, muito mais importante é o “milagre”, não o “santo”.
24.04.2023

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