O INCÔMODO DAS CÁRIES

A dor de dentes está longe de ser a pior que uma pessoa pode enfrentar. Eu já tive algumas vezes. Quase todo mundo já teve alguma vez. Mas também conheci a causada por cálculos renais, por exemplo. Em três ocasiões desesperadamente semelhantes. É coisa assim de você suar às bicas, ficar paralisado, ter certeza que alguém te apunhalou pelas costas. Nem quero lembrar. Até porque o assunto de hoje é esta outra dor, bem mais tolerável e comum, em geral proveniente das cáries.

A cárie é um dos problemas de saúde de maior incidência em toda a humanidade, segundo informa a Organização Mundial da Saúde (OMS). O registro mais antigo que se tem de sua presença data de 5.000 anos antes de Cristo, aproximadamente, e foi entre os Sumérios. Também entre eles foi pela primeira vez constatada a adoção de métodos de higiene oral. Em crânios humanos encontrados em tumbas no Egito elas foram igualmente constatadas, sendo que os estudiosos as associavam ao consumo de pães duros e vegetais fibrosos. Já a Rainha Isabel I, da Inglaterra, enfrentou o problema graças à obsessão por doces, estando em 1578 com seus dentes bastante escuros.

Durante a Idade Média ocorriam extrações de dentes sem anestesia e feitas em praça pública, por barbeiros. Esse “espetáculo” talvez ainda fosse decorrente da crença que existia antes, creditando a existência de cáries à ação de pequenos vermes ou, ainda pior, de demônios que cavavam orifícios em dentes e gengivas, para penetrar no corpo de suas vítimas. Quando ocorriam essas extrações, na maior parte das vezes coletivas, era usado um instrumento que chamavam de “pelicano dental”, nada mais do que uma espécie de fórceps.

As primeiras manifestações físicas que indicam o surgimento de uma cárie são a perda da translucidez do esmalte. O local fica então com cor esbranquiçada e textura rugosa, sem brilho. Isso decorre da ação da placa bacteriana sobre a superfície do dente. Nesta fase ainda existe a possibilidade de um tratamento tópico, com aplicação de produtos que estimulem a remineralização da área lesada. Se isso não for feito, vem a fase da cavitação, nome dado ao buraco que surge. O tipo de dieta alimentar da pessoa, a flora bacteriana, a qualidade química da sua saliva e o volume da salivação, a própria estrutura dental mais ou menos resistente e os hábitos de higiene, todos esses fatores influenciam.

A pasta de dentes mais antiga que se tem notícia tinha mirra, cinzas, casca de ovos e pedra-pome na sua composição. Bem depois, na Roma Antiga e na Grécia, faziam com ossos e conchas de ostras trituradas. Na Inglaterra, por volta do Século XVI, usavam porcelana e pó de tijolos. E foi por lá que surgiu em 1780 – já no Século XVIII, portanto – a primeira escova de dentes. Foi o empresário William Addis que a confeccionou, usando ossos de vacas para o corpo e pelos de javali para as cerdas. Mas, em produção industrial e ofertada no comércio, surgia apenas em 1930, nos Estados Unidos. Vejam que não se passaram ainda cem anos.

Agora, se quisermos saber de algo tão ou mais terrível que as piores dores de dentes, os dentes postiços que eram implantados nas pessoas, em pleno Século XIX, eram de cadáveres. Ou seja, os dentes dos mortos tinham valor de mercado. Foi por isso que após a conhecida Batalha de Waterloo, região logo ao sul de onde hoje está Bruxelas, na Bélgica, na qual se estima que 45 mil soldados tenham perdido a vida, houve retirada de milhares de dentaduras dos mortos. E outra informação que se pode considerar chocante: no Japão existia uma moda, da qual ainda se encontra adeptos, na qual mulheres procuravam odontólogos para que deformassem seus dentes. Esse hábito, por lá chamado de yaeba, consistia em destruir padrões estéticos, afinando e desalinhando os dentes das adeptas. Finalizo com um horrorzinho básico e bem brasileiro: tem pastores pentecostais oferecendo orações para combater dor de dente. Só não sei se o serviço está incluído no plano básico, do dízimo, ou se o valor é cobrado à parte. Ou seja, não há o que não haja.

30.07.2022

O bônus de hoje é vídeo com a música Pra Curar Essa Dor, com Fernanda Takai e Samuel Rosa. Na verdade se trata de dor de amor, mas ilustra o texto. Até porque é bem improvável que algum compositor tenha feito letra específica para dores de dente. Se eu descobrir, acrescento. Logo depois você pode ouvir o áudio de O Mal é o Sai da Boca do Homem, música de Pepeu Gomes, Galvão e Baby Consuelo.

O Mal é o Que Sai da Boca do Homem – Pepeu Gomes

DICA DE PRESENTE

RELÓGIO DE PULSO HAYLOU RS4 PLUS SMARTWATCH

O Dia dos Pais está chegando, mas esse é o tipo de presente que você pode dar também para si próprio(a). O relógio é para homens e mulheres, tem tela sensível ao toque com incrível profundidade de cor e clareza, permitindo que você personalize o fundo conforme seu gosto. É também monitor de frequência cardíaca e de sono. Pode ser usado como cronômetro, despertador, acusa chamadas recebidas em seu celular e oferece previsão do tempo. É feito sobre estrutura metálica muito resistente, sendo também à prova d’água.

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AMANHÃ VAI SER MAIOR

O livro é de 2019. Portanto, quando ele foi escrito a situação em nosso país já estava ruim mas, com certeza, era menos grave do que atualmente. Isso é óbvio, uma vez que só tem piorado desde então, como se a gente buscasse o fundo de um poço sem fundo. Seu título é o que está repetido nessa crônica, numa apropriação em homenagem, sem nenhuma intenção de ser um furto intelectual. Amanhã Vai Ser Maior – O que aconteceu com o Brasil e possíveis rotas de fuga para a crise atual, escrito pela cientista social e antropóloga Rosana Pinheiro-Machado mais do que merecer, precisa ser lido.

Na orelha da obra está uma apresentação da autora que no mínimo a torna digna de uma imensa curiosidade dos leitores, a respeito das ideias que ela defende com seu texto claro e objetivo. Atualmente leciona no Departamento de Ciência Política e Social da Universidade de Bath, no Reino Unido, sendo também colunista no The Intercept. Gaúcha, natural de Porto Alegre, ela vem estudando os impactos de ordem política e econômica do comércio do “Sul Global”, em especial da China e Brasil. Mas, nessa obra em especial, se debruça sobre o período de tempo que vai desde as jornadas de junho de 2013 até a vitória de Jair Bolsonaro, nas eleições presidenciais de 2018.

A apresentação dos textos não é feita na tradicional forma de capítulos. A autora preferiu dividir tudo como se fosse uma peça teatral. Tem na abertura, depois do prefácio assinado pela também antropóloga e professora na Universidade de Brasília, Debora Diniz, uma introdução. E o conteúdo segue dividido em cinco partes: prelúdio, três atos distintos e um réquiem. No Prelúdio ela analisa o ativismo do Século XXI com as suas peculiaridades muito próprias, partindo dos rolezinhos que eram feitos por jovens periféricos nos shoppings, passando pelos protestos contra o aumento no preço da passagem no transporte público – a revolta dos 20 centavos – e chegando na greve dos caminhoneiros. No Ato I discute como se deu o avanço da direita, desde 2014, o que é complementado no Ato II, quando se dedica a explicar o simultâneo recuo da esquerda. No Ato III se debruça enfim sobre o bolsonarismo propriamente dito. E depois dedica o Réquiem da Desesperança para dar alguma visibilidade para as formas de luta e de resistência, que foram se anunciando por todos os lados. Formas essas que só fizeram crescer, desde que o livro foi lançado. Mas que podem ser  melhor compreendidas em sua gênese, com a leitura da obra.

A autora busca mostrar ao leitor aquilo que colheu em pesquisa de campo, nos relatos obtidos em entrevistas feitas com pessoas reais. Ilumina a cena e facilita a visão sobre a vida de sujeitos das classes mais populares, para mostrar o quanto houve de abalo causado pela crise econômica. E isso evidencia razões pelas quais uma boa parcela dos mais pobres aderiu ao discurso lamentável do atual presidente. Ela fez isso ao entender que não há como buscar rotas de fuga senão com o entendimento de como se deu a história completa dessa trajetória rumo ao poço.

Um aspecto que mereceu especial atenção da antropóloga foi aquele oferecido pelo movimento #EleNão. Essa manifestação, que varreu o Brasil de ponta a ponta, não resultou em ganho eleitoral para Haddad, como teria sido desejado, em 2018. Mas serviu para marcar encontro histórico da política nas ruas com a esperança feminista de, afinal, termos uma transformação social. É nesse trecho que o livro melhor dialoga também com outras formas emergentes de lutas contra o capitalismo, que estão sendo agora pautadas por questões de gênero, raça e sexualidade.

Enfim, por abordar o bolsonarismo a partir de aspectos menos falados, o livro nos oferece outras explicações para esse fenômeno de aparente emburrecimento coletivo que tomou conta do país. Mas tem o poder de nos anunciar um amanhã. E fez isso muito antes das eleições que se aproximam. Antecipou, então, a certeza de que existe um futuro que nos acalenta, de dias muito melhores que virão. Convêm que se leia e logo. Porque esse é o tipo de combustível que se precisa nessa reta final.

28.07.2022

Hoje teremos outra vez bônus duplo. Primeiro um videoclipe com a música O Grito, do grupo porto-alegrense Capitão Rodrigo. Trata-se de gravação feita ainda quando foram deflagradas, na capital gaúcha, as manifestações contra o aumento no preço da tarifa do transporte público. Um fenômeno que depois se espraiou pelo país todo. Depois temos Ana Cañas com a excelente Mulher.

O Grito – Capitão Rodrigo (Porto Alegre)
Mulher – Ana Cañas

DICA DE LEITURA

AMANHÃ VAI SER MAIOR – O que aconteceu com o Brasil e possíveis rotas de fuga para a crise atual

Rosana Pinheiro-Machado – 192 páginas – R$ 23,99

Desde as grandes manifestações de 2013, boa parte dos brasileiros possui uma única pergunta: o que está acontecendo com o país? Muitas pessoas se sentem em um trem desgovernado por causa de transformações profundas que o Brasil sofreu nos últimos anos, sem saber como dar sentido, viver e combater o caos diário. Este livro da professora, antropóloga e colunista Rosana Pinheiro Machado possui dois objetivos. Primeiro, jogar luz sobre este período de crise, trazendo uma análise do cenário político e social desde as “Jornadas de Junho” até a eleição de Jair Bolsonaro, sem jargão acadêmico. Depois, apontar as saídas que se delineiam no horizonte – e mostrar que já estamos construindo possibilidades de resistir em tempos sombrios. Leitura mais do que apropriada para AGORA, antes das eleições de outubro.

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