Os números ainda não consideram o ano de 2022, quando devem ter se acentuado. Mas, segundo dados oficiais da Receita Federal, nos três primeiros do governo Bolsonaro, entre o primeiro dia de 2019 e o último de 2021, 2,1 milhões de pessoas em nosso país declararam rendimentos anuais superiores a R$ 1 milhão. Desse total, 562 mil brasileiros ingressaram nesse seleto grupo nesse período. No mesmo espaço de tempo, mais de um quarto da população tem dúvidas sobre a possibilidade de assegurar a próxima refeição. E apenas em 2021, nada menos do que 62,5 milhões de pessoas estavam enquadradas no que se convencionou chamar de “vulnerabilidade financeira”.

O mesmo estudo mostra que a partir do processo de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff se intensificou a concentração de renda e de privilégios em nosso país. Outra coisa interessante que ele aponta é que o eixo São Paulo-Rio de Janeiro perdeu importância relativa em termos de centralização das riquezas, mesmo ainda as tendo em números absolutos. Essas passaram a seguir o mesmo caminho do agronegócio, devido às isenções de impostos e grandes incentivos que o setor tem recebido, em detrimento de outros, como o industrial. Com Bolsonaro em Brasília, Roraima e Rondônia foram os estados que mais registraram aumento no número de endinheirados, com 67% e 63% de crescimento, respectivamente. Tocantins e Mato Grosso os seguem, vindo depois Santa Catarina, Pará, Goiás e Maranhão, nessa ordem. Isso explica com clareza a razão de cinco desses Estados terem concentrado votações expressivas para a manutenção do atual governo – as exceções foram Tocantins, Pará e Maranhão –, como também o fato de estarem empresários de lá patrocinando as ações de resistência ilegal ao resultado do pleito.

Voltando à questão da renda, foi acentuado o alargamento da base da pirâmide, com um número imenso de miseráveis. Ao mesmo tempo, o ápice da estrutura social se projetou para distâncias maiores em relação a quem está embaixo. Essa proposta gráfica e visual foi um modo de tornar mais perceptível um conceito sociológico, permitindo analisar e interpretar indivíduos e grupos sociais, baseado em dados e condições socioeconômicas comuns. Essa estratificação, no âmbito dos estudos da Sociologia, tenta agrupar e reproduzir o funcionamento de determinadas organizações hierárquicas. Assim, se aplica para renda como também para questões como as etárias, de gênero, etnia, escolaridade e outras tantas. Ver as distinções facilita enxergar as desigualdades, que são todas resultantes de uma construção, uma forma política de agir sobre a realidade.

Numa pirâmide, a base sempre é maior do que o cume. Por isso, essa forma geométrica é perfeita para representar o que sempre se soube: o número de pessoas com menos acesso aos recursos todos que a nossa sociedade produz será sempre infinitamente maior do que o das que dispõem de posses superiores à necessidade pessoal e familiar. Pelo menos é assim dentro do sistema capitalista, que hoje vigora em quase todo o mundo. E se dá o nome de mobilidade social à capacidade – em geral restrita – de se ascender ou decair entre as camadas. Aliás, no Brasil, como provam os dados coletados junto à Receita, o que temos tido é um fenômeno de elasticidade, resultando no estreitamento da parte mais central, com a redução da classe média. O surpreendente é que ela, junto com boa parte dos que estão abaixo e são cooptados, quase sempre garante a eleição de representantes que tratam de afastar suas possibilidades de sequer sonhar com o topo.

06.12.2022

O bônus de hoje é a música Zé Ninguém, com a banda Biquini Cavadão. A gravação do clipe foi no início de 2016.

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