Nunca gostei nem um pouco de traças. E o motivo é que elas gostam muito de algo que eu também adoro: livros. Raios! Será que não existe nada melhor do que papel para elas se alimentarem? Na verdade, elas também gostam de tecidos, que o diga uma antiga calça de lã que eu tive. Era quase nova e descobri que estava inutilizada, quando o inverno chegou. Mas, papel parece ser o prato predileto desse inseto vil. Há muito tento acabar com a sua presença, mas agora que minha edição de Toda Mafalda foi perfurada, perdi a paciência de vez. Farei uma blitz, tipo desocupação – sem dó nem piedade –, cumprindo a reintegração de posse do que guardo com tanto carinho nas estantes. Por isso, estou realizando uma cuidadosa pesquisa na internet para descobrir algum modo prático de me transformar no seu inimigo número um. Evidente que de preferência sem o uso de venenos químicos.
Traça é um bicho triste. Tem um corpo molóide, que praticamente se dissolve quando se acerta um chinelo nele. Se fosse do tamanho de uma barata, seria igualmente nojenta. É rápida como ela, disparando quando percebe que o perigo que corre é real, buscando se esconder onde não possa ser alcançada. Sorte que não voa. Mas também gosta daqueles ambientes escuros e úmidos que sempre temos em algum lugar de casa. Elas entram pelas janelas, por baixo das portas e algumas vezes de carona com objetos que trazemos para dentro. Uma vez instaladas, se tornam uma das pragas domésticas mais comuns.
Agora, após interromper temporariamente essa escrita para consultar o oráculo contemporâneo chamado Google, descobri que existe mais de um tipo delas. Essa que resolveu dar seu parecer sobre a brilhante obra de Quino é uma Lepisma saccharina, sendo adoradora de papel. As que destroem roupas são parentes suas, mas atendem pelo nome de Tineola uterella. Ainda existem outras, que preferem alimentos que nós humanos também consumimos. Essas últimas são da ordem Lepidoptera – esses nomes todos parecem nos remeter ao período em que falar Latim era sinônimo de muita cultura –, gostando de farinhas, leite em pó, cereais, biscoitos, frutas secas e as rações dos pets. Terminando o momento “cultura inútil”, voltemos àquelas que eu pretendo eliminar. As mesmas que também inutilizaram tempos atrás um retrato da minha mãe. Inseto sem sentimento algum, sem consideração nem com a cultura nem com a memória afetiva das pessoas.
Traças podem ser combatidas com a simples aplicação de vinagre e água na proporção um por um, em um pano com o qual se limpa as superfícies internas nos móveis. Depois de tirar seu conteúdo, lógico. Após arejar, basta que se recoloque tudo no lugar outra vez. No caso de livros e revistas, o melhor é ficarem em prateleiras que não estejam encostadas na parede, porque a ventilação reduz a umidade. A insolação também ajuda, porque a luz natural afugenta as traças. Ou seja, elas atacam geralmente à noite, tipo guloso faz à geladeira ou vampiros aos pescoços. Roupas jamais devem ser guardadas sem que tenham sido lavadas. Cravo-da-índia e pimenta-do-reino só fazem algum efeito se a infestação não for grave. Inseticidas em spray não são muito eficazes e as naftalinas apenas oferecem solução em ações muito localizadas, em perímetros pequenos e temporariamente. Além disso, deixam um cheiro desagradável que afugenta também as pessoas.
Para deixar todos que estejam lendo com mais nojo ainda, ingressando no meu “Exército de Salvação Bibliotecária” – defenderemos todas as bibliotecas –, saibam que sua reprodução é sexuada. Que as fêmeas depositam 50 ou mais ovos em duas ou três semanas. Que esses ovos têm uma cobertura com secreção gosmenta que permite aderência aos locais, eclodindo alguns dias depois. Jovens e adultos são idênticos, exceto pelo tamanho, que atinge até um máximo de 1,5 cm. Mas, o pior de tudo: elas podem sobreviver longo tempo sem estarem se alimentando. Vai ver que é por isso que quando começam a comer fazem tanto estrago, buscando recuperar o tempo da dieta forçada.
23.10.2021

No bônus de hoje, na falta absoluta de uma música que fale de traças, o que seria pedir muito, mesmo para os muito criativos compositores do nosso país, Mosca na Sopa, de Raul Seixas. Esse outro inseto que é pouco agradável está citado em uma das faixas do álbum Krig-Há, Bandolo, de 1973, produzido por Mazola.
Adorei tem teu humorístico. Alguma graça também faz bem à saúde, apesar do nojo que compartilhei durante toda a leitura. Obrigada pelas informações, as traças daqui de casa não vão gostar.
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I have a song about moths for you! It’s “The Moth”, by Aimee Mann:
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I am terrified of moths…even though they are harmless except to clothes. 😀 I am not afraid of snakes, tigers, alligators or most other creatures. Humans are strange!!
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