Let It Be foi o último álbum lançado pelos Beatles, há exatos 50 anos atrás – ele foi distribuído em maio de 1970. Não o último que gravaram, porque depois ainda produziram em estúdio o lendário Abbey Road, aquele em que na capa está a foto do grupo atravessando rua londrina, em faixa de segurança. Só que esse acabou sendo comercializado antes, porque o anterior dependia de estar pronto um filme que sairia junto. A canção que dá título ao trabalho Let It Be (Deixe Estar) é a sexta do Lado A, no antigo LP, que tinha um total de 12 faixas. E ela normalmente é figura certa em relações que indiquem quais as dez mais da história da lendária banda. Não importa quem opine e selecione, muito raro é ela ficar de fora.
Paul conta que escreveu a letra após ter sonhado com a sua mãe, que havia morrido anos antes. Ela o acalmava nesse sonho, dizendo que tudo se resolveria bem. Um conselho importante, num momento tumultuado pelo qual tanto a banda – morrera o empresário Brian Epstein e as brigas internas só aumentavam – quanto ele pessoalmente, estavam passando. Antes de saber da origem real da “inspiração”, muita gente chegou a acreditar que se tratava de um conteúdo religioso. O verso Mary comes to me (Maria vem até mim) poderia indicar mesmo isso. Mas a mãe da canção era de fato Mary McCartney e não a genitora de Jesus. Ela teve câncer de mama e realizou mastectomia no dia 31 de outubro de 1956. Superprotetora, antes de ir para o hospital deixou a casa arrumada e até mesmo os uniformes escolares de seus dois filhos prontos para uso no dia seguinte. Nunca mais os viu usá-los, pois faleceu de embolia 24 horas depois da cirurgia. Ela era fumante e, mesmo com um relativo “histórico de atleta” – usava bicicleta para todos os seus deslocamentos –, o estado dos pulmões não contribuíram para a recuperação desejada. Consta que suas últimas palavras foram ditas para a cunhada, que a acompanhava no hospital: “Eu gostaria de ter visto os meninos crescerem.”
John Lennon não parecia ser muito fã desta música, mas aceitou que ela fosse incluída. Uma tarefa que não foi fácil: fizeram 27 versões dela antes da derradeira, que foi efetivamente gravada. E ele nem mais estava no grupo quando o trabalho foi tornado público. Foram os três restantes que concluíram I Me Mine, de George Harrison, que ainda dependia de alguns detalhes para a versão final. Em 10 de abril a banda foi extinta, mas apenas em 8 de maio começaram as vendas deste LP. Muito simbólico também foi o fato da mudança de nome: o disco inicialmente seria chamado de Get Back (Retorne), mostrando a intenção de uma volta às origens, que jamais aconteceria. O “deixe estar” ficou muito mais apropriado. O documentário simultâneo traz registros das gravações dos dois últimos álbuns e do show que deram no telhado dos estúdios da Apple, que acabou sendo o seu último. No ano seguinte ele foi agraciado com o Oscar de Melhor Trilha Sonora Adaptada, que terminou sendo uma espécie de premiação póstuma.
Mesmo tendo oficialmente existido apenas entre 1960 e 1970, os Beatles parecem eternos em função de tudo o que fizeram, revolucionando o cenário musical em todo o mundo. Eles adotaram estratégias de marketing e utilização massiva da mídia a seu favor, o que também explica muito o sucesso meteórico. Fizeram o primeiro show em um estádio, atraindo 55 mil pessoas em Nova Iorque, algo até então impensado. Junto com Elvis Presley, foram precursores na elaboração de videoclips e de paradas estratégicas em meio às turnês – o que permitia mais tempo para produção em estúdios, qualificando os trabalhos. Nesses momentos, desenvolveram técnicas como feedback, compressão, loops, microfonia, colagens sonoras, mudança de fase, overdubs e equalização. E também inovaram em coisas mais prosaicas, como colocar as letras das músicas em encartes nos álbuns, o que ninguém fazia. Outra coisa em que foram pioneiros foi na transmissão de um programa ao vivo, via satélite, que cobriu boa parte do planeta, em 1967. Foi o especial Our World, onde receberam celebridades de muitas nacionalidades diferentes, levando uma mensagem de paz e tolerância. All You Need Is Love (John Lennon) e Baby, You’re a Rich Man (Paul McCartney) foram compostas especialmente para a ocasião.
Não foi por acaso, portanto, que 27 de suas canções ocuparam o primeiro lugar nas paradas de sucesso. Sua influência na moda e no comportamento da juventude são inegáveis. Até entre quem não vivia em sua época. Mas deixa especial saudade, atualmente, seu saudável e quase ingênuo ativismo político e social. Parece que era mais fácil sonhar naquela época.
15.05.2020
Let it be, é uma das minhas 5 músicas preferidas dos Beatles. Conheço boa parte da história dos meninos de Liverpool, mas esta sobre a mãe do Paul, eu não conhecia! Muito interessante. Estamos falando da banda de maior influência de todos os tempos! Provavelmente daqui a 50, 100, 200 anos ou mais, continuará sendo muito valorizada pela sua história e conteúdo. Let it be para mim, fica bem mais valorizada, depois de eu ler este texto. Como sempre, mais um belo trabalho do meu amigo Solon. Adorei… Grande abraço!
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Como sempre, mais uma vez o Kruger sendo generoso. Abraço!
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