Pouco tempo atrás tive o privilégio de entrevistar três lideranças religiosas no programa Espaço Plural, todas juntas em encontro único. Eu o apresento todas as tardes de segunda à sexta-feira e se trata de uma produção conjunta da Rede Estação Democracia com a RadioCom Pelotas, que têm a parceria de 26 emissoras de rádio e webtvs do Rio Grande do Sul, sul de Santa Catarina e Brasília, com transmissão simultânea. Eram Humberto Maiztegui Gonçalves, que é bispo da Igreja Episcopal e membro do Fórum Inter-Religioso e Ecumênico do RS; Renato Kuntzer, teólogo e pastor da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil; e José Marcos Gomes de Luna, sacerdote católico na diocese de Palmares, teólogo com doutorado em Filosofia, professor na Universidade Católica de Pernambuco.
A conversa foi proveitosa e passeou por diversos temas. Mas as respostas que deram às perguntas finais do programa é que resolvi reproduzir hoje, por serem agora ainda mais oportunas, faltando poucos dias para as eleições presidenciais. A lucidez deles pode assegurar alguma reflexão. Eu busquei saber as opiniões dos três sobre em quem Jesus votaria em outubro, se estivesse agora outra vez entre nós, voltando como um cidadão brasileiro e tendo, portanto, essa obrigação. Queria saber de cada um dos entrevistados basicamente se Cristo se deixaria enganar por candidatos que se apresentam como cristãos, sem nunca terem de fato seguido os seus ensinamentos. E a outra questão versava sobre o que caracterizaria um bom e um mau candidato, do ponto de vista do verdadeiro cristianismo.
Antes de mais nada, todos eles foram unânimes ao manifestarem que cabe às igrejas se envolver com questões sociais e políticas do seu tempo. Entendem que as estruturas religiosas não são organismos à parte e que lhes cumpre envolvimento em outros aspectos que não os meramente espirituais, como aqueles culturais, econômicos e políticos, por exemplo. E isso se deve ao fato de todas elas estarem inseridas na comunidade. Falaram que a Bíblia é a fonte principal e comum a todos os cristãos, mas que há também a tradição da igreja como fonte. Que ela está no polis, que é a cidade e, portanto, transpira cidadania.
Desta forma, entendem que o envolvimento não é errado. E que o único erro é associar-se com aquilo que não é cristão de fato. Posto isso, disseram que Jesus, hoje em dia, não se omitiria. Mas asseguraram que é fácil saber em quem Ele NÃO VOTARIA. Que seria em todos aqueles cujas ideias agridem as noções de vida, de compartilhamento, de paz e de humanidade. Portanto, defenderam os convidados para o debate, Ele jamais daria o seu voto e o seu apoio a candidatos que não tivessem na justiça social o seu foco. Jamais estaria ao lado daqueles que não tivessem de fato Deus no coração, pois apenas da boca para fora isso não tem valor. Desse modo, basta equiparar pregação com prática para caracterizar um candidato verdadeiramente cristão. Por isso chamo a atenção dos leitores para alguns pontos.
Jesus protegia as crianças e as mulheres. Não seria contra a vacinação e a favor da violência que normaliza até mesmo o estupro. Jesus não se armava a não ser com a palavra, com a verdade: jamais faria arminhas com os dedos ou concordaria com a disseminação de mentiras. Ele pregava a mansidão e não aprovaria a agressividade que tira vidas de opositores. Jamais pediu aos seus discípulos que matassem os romanos. Ele foi torturado, mas nunca defendeu tortura nem exaltou torturadores. Ele multiplicou pães e peixes, não trabalharia para recolocar o país no odioso mapa da fome. Ele cobrou que atirassem pedras apenas aqueles que estivessem sem pecado, defendendo Maria Madalena. Nunca diria que merecem ser perseguidas pessoas por suas opções sexuais, suas configurações familiares. Ele não tinha preconceitos e tratava a todos de forma igual. Não discriminaria negros e indígenas. Ele educava seu povo, não iria destruir as estruturas de ensino e de pesquisa. Ele curava doentes, não iria retirar recursos da saúde pública. Ele nasceu em um estábulo, nunca lhe passaria pela cabeça adquirir mais de cem imóveis, ainda mais com recursos de origem duvidosa.
Dito isso, pense um pouco. O candidato a quem você está inclinado a dar o seu voto age de que forma? Me refiro a agir, não a falar. Essa pessoa já cometeu ou comete alguma das ações nada cristãs citadas acima? Pense bem antes de apertar os botões da urna eletrônica. Será que Jesus aprovaria essa sua escolha? Você e Ele estariam do mesmo lado? Nós todos fomos criados com a condição do livre arbítrio. E temos responsabilidade pessoal e social em virtude disso. Não podemos nos esconder atrás do arrependimento, depois da decisão equivocada. Ainda mais quando o que fazemos atinge tanta gente além de nós. Pense bem. E honre o cristianismo que você defende.
25.09.2022

O bônus de hoje é o áudio da música Mano Cidadão, de Zeca Baleiro.
Se você dispuser de uma hora do seu tempo, pode ver e ouvir a íntegra da entrevista feita no programa Espaço Plural, em julho de 2022, com os três religiosos citados nesta crônica. O acesso está facilitado abaixo.
Deixe um comentário