Alguém sabe me dizer onde ficam as cucuias? Lembro que às vezes eu ouvia familiares falarem “foi para as cucuias” e, mesmo sem ter a menor noção de onde seria isso, dava para perceber, pela entonação de voz e pela oportunidade de uso, que deveria ser relativamente longe. E que não era bom ir até lá. Alguma coisa tinha sido perdida, algo que se desejava teria escapado ou fugido para esse lugar: era isso o que eu imaginava e não estava errado. Nova destinação era quando entre os amigos, no curso que então se chamava Primário, uns mandavam os outros à merda. Bem mais perto, mas nada higiênico. Coisa assim como ocorreu com um colega que certa vez teve um problema intestinal em plena aula e, sem que nenhum dos outros o tivessem mandado, acabou por lá. Isso até ter sido levado para casa, com transporte de emergência.

Depois, quando a mesma gurizada foi ficando mais taluda, passaram a citar as progenitoras dos outros como destino recomendado, incluindo ainda a prática sexual remunerada como sendo ramo de atividade das mesmas. Ou usavam o “vai” antecedendo o verbo “tomar”, mas que não era nem no sentido de beber, nem no de tirar algo de alguém. Aos dois, se seguia a indicação de uma região anatômica que todos nós temos e que indica que se pode ter medo. Coisa de criança, ou nem tanto assim.

Do Ensino Médio em diante, novos lugares foram sendo incluídos, alguns como desejo da própria pessoa, sem que outra recomendasse. Um bom exemplo é a tal de Pasárgada, que a literatura nos trouxe através de Manuel Bandeira. Se sabia ser uma monarquia, uma vez que ele seria inclusive amigo do rei. E o melhor de tudo nesse lugar é que se podia escolher a mulher que se desejasse. Não sei o que as nossas colegas meninas imaginavam, mas para nós não era nada mal. Na vida real não se conseguia nem as menos desejadas, imaginem só as outras.

Enfim, acabei descobrindo que as tais cucuias eram o brejo onde a vaca vai parar quando algo não dá certo. Nos dicionários consta isso, quando apresenta como significado falha ou malogro. Na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, tem o Cemitério da Cacuia: ou seja, bateu na trave, só pela troca da sua primeira vogal. Não fosse isso seria mais fácil explicar. Que malogro poderia ser pior do que a morte? Em 1904 tal cemitério foi inaugurado, levando o nome do seu bairro. Para ele foram aos poucos transferidos os corpos que estavam em outros dois endereços, ambos na Freguesia, próximos à Igreja Nossa Senhora da Ajuda, até ele se tornar o único. Isso sem considerarmos o povo nativo que existia no lugar, uma vez que os Temiminós também tinham espaços específicos para que seus mortos fossem sepultados. Só que se perderam devido à ação do tempo e dos colonizadores, sempre pouco respeitosos com as tradições, usos e costumes dos “não civilizados”.

Os Temiminós era uma tribo indígena que habitava a baía da Guanabara em área próxima aos seus vizinhos Tupinambás. Ambas tinham traços culturais comuns entre si e com outros agrupamentos também tupis. A mesma língua, crenças e costumes. Mas estou fugindo um pouco do assunto central, se bem que se poderia indicar que algum desafeto fosse visitar esses últimos locais. Não hoje em dia, mas no passado – se isso fosse possível –, uma vez que ambas as tribos eram canibais, apesar de também fazerem uso da agricultura de subsistência. Ou seja, eles tinham uma alimentação balanceada: carne com legumes e grãos.

Para finalizar, em momentos de fúria, pessoas vez por outra dizem “vá para o raio que o parta”. Mas isso não significa necessariamente desejo efetivo de que o outro perca a vida, desta forma tão brutal. É uma raiva passageira, em geral. Uma explosão de energia, para evitar que tal sentimento se transforme em uma úlcera, por exemplo. Agora, sendo o mais preciso possível, um raio não partiria a pessoa nem ao meio, nem sequer em dois pedaços desiguais. Iria era torrar o atingido. E eu, para não torrar mais a paciência de ninguém, sendo por isso mandado a um destes locais citados, paro por aqui.

02.05.2023

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O bônus musical de hoje é A Tonga da Mironga do Kabuletê, de autoria de Toquinho e Vinícius de Moraes, cantada pelo primeiro. A gravação foi feita durante apresentação ao vivo no Teatro WTC, do Hotel Sheraton, em São Paulo (25/03/2016). As palavras tonga, mironga e kabuletê seriam da língua iorubá, falada pelos nagôs, designação que identificava todo e qualquer negro escravizado, que era comercializado na antiga Costa dos Escravos, áreas costeiras dos atuais países Benim, Togo e Nigéria.

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