Evidente que eu aprendi a reconhecer as cores muito antes de ser apresentado para essa expressão. Mas, várias vezes ouvi na minha casa algum adulto falar que algo era da “cor de burro quando foge”. Só que, quando eu perguntava, ninguém sabia me dizer como ela era, com qual outra se parecia. Depois passei a imaginar que nem eles mesmos deveriam saber, pois se o burro havia fugido não estava mais ao alcance do olhar deles. Se mudou o tom do seu pelo, isso ocorreu bem longe. Outra coisa: nem nós nem ninguém que eu conhecia, nas redondezas, tinha um burro sequer. Então, que raio de cor seria essa? E por que ela era citada, se não se tinha sequer referência para imaginar?

Eu passei boa parte da minha infância – acho mesmo que depois dela também – imaginando coisas que não precisavam de referência alguma para que fossem criadas. O que me fez entender em parte inclusive essa tal cor desconhecida, com o tempo. Dias atrás alguém comentou que eu “viajava” sem ter experimentado nada que alterasse nem minha percepção, nem meu estado de consciência. O que é uma verdade absoluta, mas não vem ao caso agora. O que interessa, nessa minha memória, é afirmar que os adultos às vezes ao mesmo tempo que nos atrapalham, também nos estimulam. Eu seguia longe, em pensamento, atrás desse burro inexistente e tão real ao mesmo tempo.

Cores são percepções visuais, apenas isso. Células especializadas que temos na retina recebem um feixe de fótons provindos de um reflexo da luz que incide sobre alguma superfície, algum objeto, e a transmitem como uma informação pré-processada para o nervo ótico e daí para o cérebro. Enfim, se eu preferir usar a física como elemento para fazer a análise, ao invés da biologia, digo que cor é uma frequência de onda que é refletida. Ou seja, tudo adquire a cor equivalente ao comprimento de onda que não absorve, mas reflete. Algo é verde se retém todas as demais frequências, refletindo apenas aquela que equivale ao verde. E assim com todas as demais cores e suas tonalidades.

Todos nós temos nossas cores preferidas. Essa era uma das perguntas sempre feitas naqueles cadernos com questionários das nossas colegas, nos primeiros anos em que se estava nos bancos escolares. Questionavam junto com o signo, com o que se pretendia ser no futuro, o time que se torcia – o que também muitas vezes tem relação profunda com as cores –, a comida de que mais se gostava, os nomes da melhor amiga e do amigo, essas coisas todas. Cada um tinha direito a preencher uma página inteira ou mais, com as perguntas sendo todas elas numeradas. Vez por outra alguém arriscava tentar descobrir com elas também paixões daquelas que se tinha escondidas ou nem tanto. Em geral as meninas participavam, mas sempre sobravam páginas que a autora permitia que algum de nós preenchesse.

Hoje em dia tem gente que se especializa em determinar palhetas de cores que mais combinam com o estilo de vida das pessoas, com suas personalidades. Asseguram que essas escolhas aplicadas nas roupas podem mesmo atingir a importância determinante de sucesso ou fracasso, em geral no nosso meio profissional. Mas, que não se duvide também afetarem as questões afetivas. Não sei se é assim tão real, porém prefiro estrategicamente não duvidar. Até porque boa apresentação, isso se sabe que faz diferença. No mais, pessoas coradas parecem ser mais saudáveis do que as que são ou estão pálidas. Cor dos olhos muitas vezes é algo que impressiona e o mesmo se fala dos cabelos. Não por nada foram inventados produtos para maquiagem. Pintamos nossas casas; os carros há muito deixaram de ser apenas no preto clássico; objetos de decoração mudam tanto um ambiente ao harmonizarem suas cores. E vivemos todos com uniformes, escolares ou não, e sob bandeiras e estandartes que nos identificam.

Além de tudo, tem sangue azul quem é nobre; jogamos verde para colher maduro; o sorriso fica amarelo quando sem graça; levamos um cartão vermelho quando se é expulso de algum lugar ou mesmo de um assunto; os contratos se assina preto no branco; se alguém faz isso em nosso nome é porque tem carta branca; e receber sinal verde é estar autorizado. Isso tudo se entende com facilidade. Aquele burro, no entanto, continua me intrigando. Mas, acho que não apenas a mim.

08.02.2024

P.S.: A verdadeira origem dessa expressão é ser ela uma corruptela da frase original “corro de burro quando foge”. Se tratava de um alerta contra o comportamento agressivo do animal, que poderia dar coices nessas circunstâncias. Foi bem depois que passou a designar uma cor que não se pode definir com precisão qual seja.

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4 Comentários

  1. Belíssimo seu texto, parabéns meu amigo! Também adorei as cantoras e respectivas músicas, não conhecia! Grande abraço!

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