O Governo Federal, depois de inúmeros e acalorados encontros de sua equipe econômica, diz ter descoberto finalmente uma solução para evitar que o preço dos combustíveis em nosso país continue estratosférico e crescendo. Alguém deve ter gritado EUREKA!, numa daquelas reuniões palacianas, que nunca mais teve vídeo algum divulgado, depois daquele fatídico de bom tempo atrás, que escancarou a estratégia do “passar a boiada”, impropérios e defecações diversas. Irão conceder subsídios. Ou seja, teremos mais do mesmo, a brilhante e repetida alternativa de fazer caridade com o chapéu alheio.
Como eu sou daqueles chatos, que gostam das coisas bem explicadas e esclarecidas, antes de irmos adiante precisamos nos deter em alguns significados. Eureka é uma palavra de origem grega (etimologicamente heúreka), que na verdade é o pretérito perfeito do indicativo do verbo heuriskéin, que é achar, descobrir. Portanto, tem a acepção de achei, descobri. Como exclamação, foi atribuída a Arquimedes, que a teria proferido em voz alta, durante um banho, ao se dar conta da lei do peso específico dos corpos. Até hoje, muita gente diz que embaixo de um bom chuveiro encontra as melhores ideias do seu dia. E subsídio é quando os poderes públicos concedem recursos de forma indireta, com a isenção de impostos para atividades econômicas determinadas. Em geral isso é feito para estimular exportações, dando aos produtores nacionais mais poder de competitividade. Mas também pode, eventualmente, ser usado para segurar preços.
Acontece que, ao abrir mão de receita, para que acionistas da Petrobrás não deixem de receber seus polpudos dividendos – sobre os quais, inclusive, não pagam quaisquer impostos –, será necessário reduzir investimentos públicos. E alguém sabe em que áreas esses cortes são sempre feitos pelo atual governo? Acerta quem responde na saúde, educação, infraestrutura, ciência e tecnologia. A população inteira paga, muito mais quem está na base da pirâmide social, para que poucos permaneçam com os seus privilégios intocados. Uma decisão política, portanto. E coerente com a proposta de quem está no poder. O pessoal do térreo segue financiando a festa que está ocorrendo na cobertura. Mas tem um detalhe: isso será assegurado apenas até o final deste ano. Ou para pouco depois das eleições presidenciais, da mesma forma que ocorre com o Auxílio Brasil. Depois desse prazo, salve-se quem puder.
Existem outros momentos em que algo semelhante ocorre. Vamos para um exemplo típico e comovente: situações de desastres climáticos são ideais para o entendimento da lógica perversa. Como aconteceu agora, recentemente, em Petrópolis. O presidente sobrevoa a área atingida para observações – as imagens da TV nunca são suficientes, porque não mostram a consternação estampada nos rostos das autoridades –, com uma comitiva considerável formada por ministros, militares, equipes de segurança e apoio, o escambau. Daí concede entrevistas e informa a primeira e mais importante das medidas: autoriza o saque dos recursos do FGTS dos trabalhadores que perderam suas casas. A promessa é de uma liberação emergencial e imediata. Ou seja, irão permitir que as pessoas façam uso de um dinheiro que já é delas para o atendimento de necessidades prementes que resultaram da falta de investimento público em prevenção. Uau! Isso é brilhante. O cara sai nas manchetes dos jornais, posa para fotos e a conta é paga por quem quase nada tem, não pelo seu governo. E é capaz de ainda render algum voto.
Assim, as pessoas pagam com o seu futuro o problema presente. Até porque, mesmo que muita gente nem mais lembre disso, se é que algum dia soube, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço foi criado como uma compensação, “para proteger trabalhadores demitidos sem justa causa”. Uma espécie de poupança compulsória, portanto, para facilitar coisas como a compra de uma casa própria ou pelo menos pagar pelos remédios que venham a ser necessários na velhice. Isso porque o seu consumo aumenta com o tempo e a aposentadoria do INSS em geral não é suficiente, sendo mais curta do que coice de porco.
Voltando ao tema central, os brasileiros perdem pagando caro pelos combustíveis, mesmo a gente sente auto suficiente em petróleo. Para se ter uma ideia, a gasolina aqui no Brasil já era, antes do último aumento, 71,12% mais cara do que no estado da Virgínia, nos EUA. Isso que por lá o salário mínimo é 11 vezes maior do que o nosso – e nós vendemos óleo bruto para eles. Voltam a perder, em virtude da inflação que dispara, corroendo seus ganhos. Depois, perdem uma terceira vez com a redução significativa dos recursos para investimentos, devido aos subsídios já citados. Uma bola de neve, apesar de sermos um país tropical.
Como se vê, essa foi a mais “acertada” das decisões. Mas é verdade que ela não atinge a todos. O general que preside a Petrobrás, bem como os muitos outros militares que estão ocupando postos na empresa, receberam agora em março uma bonificação bem generosa. Isso porque a equiparação dos preços internos ao dólar, que não querem seja nem sequer discutida e muito menos abandonada, ajudou para que fosse alcançado o lucro recorde de R$ 106,7 bilhões no último ano. Houve uma valorização de 1.400% em relação ao período anterior. Esses devem ter ficado mais felizes do que os acionistas, porque não investiram nem um tostão e tiveram todo esse retorno.
18.03.2022

O bônus de hoje é duplo. Temos a música Brasil, com um grupo de artistas homenageando o autor, Cazuza. E também o áudio de Rolando Boldrin, com Embolada da Carestia.
DICA DE LEITURA
PRÉ-SAL: A SAGA – A história de uma das maiores descobertas mundiais de petróleo
É incrível como se sabe tão pouco sobre um termo que se difundiu tão rapidamente. Afinal, o que é o pré-sal – expressão que desde 2007 tomou o Brasil e o mundo – e qual sua importância? Nos primeiros anos do século XXI, um seleto grupo de geólogos de primeira linha da Petrobras conduziu a estatal à descoberta de novas e imensas reservas de petróleo numa região até então insuspeita, a uma profundidade total de 6 mil metros sob o mar da costa brasileira. A abertura dessa nova fronteira exploratória colocou o país num patamar até então inimaginável em termos de reservas energéticas. Marco Antônio Pinheiro Machado, geólogo do grupo que trabalhou nessa investigação (além de cunhar o termo pré-sal), realiza uma verdadeira façanha: recupera essa história de excelência científica 100% brasileira e a torna acessível a todos, numa leitura envolvente. Mostra, ainda, o fascínio da geologia – uma ciência que não é propriamente exata –, lembrando que achar petróleo em grandes proporções também tem a sua arte.
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É desesperador o que contas. A gente acha que conhece a realidade do país, mas há mais alguma coisa terrível para acontecer. Com teu texto volta-me a pergunta: o que poderá fazer o próximo governo? Imaginando que este será derrotado nas urnas.
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Vai depender do número de cadeiras conquistadas no Congresso.
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