Quem gosta do gênero pode tanto me criticar pela escolha, uma vez que vários outros títulos também poderiam estar aqui, quanto pelo fato de ter apontado apenas três. Eu sei disso e entendo ambas as situações. Eu mesmo não tenho certeza se, parando para pensar um pouco mais, não iria decidir por outro. Mas foram três porque adicionando nomes deixaria de ser uma crônica, que tem como característica concentrar em pouco espaço qualquer dos temas que aborda. De qualquer modo, nada impede que outros venham a ser incluídos, em nova listagem e texto. Por enquanto, vamos lá: cito três faroestes que entendo serem realmente notáveis.
Para mim, não poderia começar por outro título que não fosse Era Uma Vez no Oeste (1968), de Sergio Leone. É um clássico, recheado de momentos nos quais as expressões faciais, os olhares mostrados em closes e as atuações primorosas de um elenco de luxo, prendem nossa atenção. Henry Fonda, Charles Bronson, Claudia Cardinale e Jason Robards estão todos perfeitos e seu trabalho está emoldurado pela música inigualável de Ennio Morricone. Harmônica (Bronson), também chamado de “Pistoleiro Sem Nome”, é um homem cheio de mistério e com presença que cresce ao longo da narrativa. Ele enfrenta o bandido frio vivido por Fonda (Frank), que mata sem dó nem piedade até mesmo mulheres e crianças, obedecendo as ordens de chefões inescrupulosos. E que no passado matou seu irmão – vingança é um dos pratos mais servidos nesses filmes. O assassino está a serviço dos responsáveis pela construção de uma estrada de ferro, com a qual dominam toda a economia local e também a vida das pessoas. Cheyenne (Robards) é carismático, sendo constituído por um misto de ameaça e humor. E os três personagens masculinos terminam orbitando no entorno de Jill McBain (Cardinale), que é uma mulher linda e de personalidade marcante, buscando sobreviver em um ambiente nada fácil. Merece bom destaque a ambientação, com a cidade sendo uma estrutura complexa, que funciona ao seu modo, com suas leis próprias, no meio da sujeira do meio. Um filme para ver e rever, pois não envelhece.
O segundo que cito é Os Imperdoáveis (1992), de Clint Eastwood. Esse o que tem de especial é que desconstrói o mito do pistoleiro implacável. Os três personagens centrais são Inglês Bob (Richard Harris), o xerife Little Bill Daggett (Gene Hackman) e o assassino brutal e covarde William Munny (Clint Eastwood). E temos ainda o jovem Kid (Jaimz Woolvett), que deseja se tornar um justiceiro, depois de passar toda a sua infância ouvindo histórias contadas por seu tio. Para ele, William passa a ser um exemplo, um ídolo. O “cimento” que os une é quando um grupo de prostitutas resolve pagar uma pequena fortuna pela morte de um homem que mutilou uma delas. Acontece que essa notícia se espalha e cresce o número de desejos de fazer o serviço e receber a recompensa oferecida. Inglês Bob, por exemplo, está sempre com uma indumentária elegante e preta, tem um revólver que é peça de arte e vive dizendo que ter uma rainha é muito maior do que ter um presidente e que ingleses são mais civilizados do que americanos. Ele está sempre acompanhado por um biógrafo, que tem a missão de registrar suas aventuras. O xerife Little Bill no fundo não segue regras e tem puro e simples prazer de matar e William Munny é um homem assombrado pelo seu passado, pelas atrocidades que já praticou. O filme tem uma inteligência sutil, está em patamar acima do velho oeste clássico. A construção psicológica dos personagens e da narrativa tem a densidade de uma boa obra literária. É diversão, mas com profundidade e elaboração.
Fecho o trio com Bravura Indômita (2010), dos irmãos Ethan e Joel Coen. Este filme conta a história de Mattie Ross (Hailee Steinfeld), uma menina de apenas 14 anos que é muito mais forte e determinada do que quaisquer dos personagens masculinos da trama. Depois de perder precocemente o pai que tanto amava, ela contrata o agente federal Rooster Cogburn (Jeff Bridges), que é alcoólatra, para ir com ela na busca do assassino. Mas um ranger texano de nome LaBoeuf (Matt Damon) também está à caça do criminoso Tom Chaney (Josh Brolin), por outras razões. Terminam os três se envolvendo juntos na aventura, em um território bastante hostil. A narrativa também tem romance, com um sentimento velado de dois homens por uma mulher, assim como cumplicidade e respeito em dose certa. Vale a pena o tempo investido diante da tela.
Para finalizar – e acalmar os fãs incondicionais e talvez revoltosos nesse momento comigo –, vou acrescentar sugestões de qualidade, sem me ater a sinopses. Rio Vermelho (1948), de Howard Hawks; Rastros de Ódio (1956), de John Ford; O Homem que Matou o Facínora (1962), também de John Ford; Por Um Punhado de Dólares (1964), de Sergio Leone; Três Homens em Conflito (1966), também de Sérgio Leone; e Meu Ódio Será Tua Herança (1969), de Sam Peckinpah. Para quem deseja produções mais recentes, mesmo que distantes da época de ouro do faroeste, sem abrir mão da qualidade, quatro boas dicas: O Segredo de Brokeback Mountain (2005), de Ang Lee; Django Livre (2012) e Os Oito Odiados (2015), ambos de Quentin Tarantino; e A Balada de Buster Scruggs (2018), dos irmãos Ethan e Joel Coen.
13.09.2022

O bônus de hoje é duplo. Primeiro o áudio da música tema de Por Um Punhado de Dólares, composta por Ennio Morricone. Depois a cena de um embate entre pistoleiros, quando da chegada de Harmônica, no filme Era Uma Vez no Oeste. Ambos foram dirigidos por Sergio Leone.
Esse blog recomenda que seus leitores conheçam o site da Rede Estação Democracia. Acesso através do link abaixo.
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