A PRESSÃO DO AMBIENTE

Uma professora universitária propôs em sala de aula um experimento para os alunos que já se encontravam nela, no início de um dos seus encontros. Mostrou a eles uma pasta de cor verde e pediu que, se algum outro aluno chegasse atrasado – e isso sempre acontecia –, ao perguntar para os demais qual a cor dela, todos respondessem vermelho. Não deu outra: poucos minutos depois chegou um, pediu permissão e sentou no seu lugar.

Ela então começou a falar que filósofos, dando o francês Auguste Comte (1798-1857) com um exemplo, defendiam que há coisas que são como elas são e não devem ser discutidas. Exemplificou mostrando a pasta que estava sobre a mesa. Com ela nas mãos, perguntou a cinco dos alunos que estavam em sala de aula desde o começo, qual a sua cor. E todos foram unânimes, um após o outro, a responder vermelha. Então ela fez a mesma pergunta ao que chegou atrasado. E ele, mesmo que um tanto constrangido, confirmou que a cor era vermelha.

Estava confirmada a fragilidade do ser humano quando submetido à pressão do ambiente onde se encontra. E com isso também se explica como, entendendo de psicologia tanto quanto de comunicação, fica fácil quaisquer doutrinações serem feitas. Afirmam que esse recurso é usado, por exemplo, pelas igrejas pentecostais, que colocam no meio do público pessoas que são previamente instruídas a dar falsas contribuições financeiras, quando chamadas para tanto. Isso repercute de imediato em muitas das demais, que seguem com prazer a mesma “generosidade”. As próprias sessões de “desobsessão”, o afastamento de supostos demônios que ocorrem nos cultos, seguiriam o mesmo princípio. O que também ocorreria quando de labaxúrias, palavras sem nexo pronunciadas pelos que então sentem o “poder de Deus”.

Ainda se deve considerar que a enorme evolução da tecnologia nos últimos tempos potencializou o envio de mensagens, com consequente ampliação do campo de ação. Não se está mais dentro de uma sala de aula ou no interior de um templo religioso. Se Skinner colocou seus ratos em um laboratório, hoje o laboratório vai ao encontro de todos os ratos. E esses camundongos humanos se tornam criaturas dóceis, no sentido de que respondem aos estímulos que recebem, exatamente conforme o desejo de quem os remete. Aliás, dóceis nem sempre, porque não raras vezes a ordem é oposta, estimulando agressividade, violência.

Quero lembrar do filme A Onda, uma produção alemã de 2008, dirigida por Dennis Gansel. Ele foi uma adaptação de boa qualidade do livro de mesmo nome, que havia sido escrito pelo profícuo norte-americano Todd Strasser – mais de 130 livros publicados. Seu enredo mostra um professor de ensino médio que conduz uma experiência social com seus alunos. Trata-se de um projeto extracurricular, promovido com o intuito de ver como estes reagiriam sob uma autocracia. A duração seria de uma semana, mas as coisas saem do controle quando são estabelecidas regras de conduta não negociáveis, o uso de uniformes, a criação de um logotipo e uma saudação. Tudo culmina com eles considerando inimigos aqueles colegas que não fazem parte desse grupo restrito. A “causa” vira o grande propósito na vida de todos, com a ideologia fascista conquistando seus corações e mentes.

Qualquer semelhança com o Brasil de passado recente – e também de presente ainda preocupante –, não é uma mera coincidência. Em nosso país, essa postura extremista se alastrou com a manipulação das pessoas, que sem perceberem passaram a seguir de forma cega os “bons exemplos”. Aqui, como no filme, a retórica assumiu maior importância e significado do que a realidade. E foi capaz de formar uma posição coesa, mesmo que em torno de coisa nenhuma.

19.01.2023

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O PALESTRANTE E SEU MOTORISTA

Um palestrante, verdadeira sumidade em termos de conhecimento na sua área de atuação, era convidado para falar frequentemente em universidades, congressos e outros eventos. Costumava deslocar-se geralmente utilizando os préstimos de um mesmo motorista, profissional atencioso e discreto como convém. Certa feita, no caminho de mais um destes compromissos, o motorista comentou que já ouvira tantas vezes a conferência que seria capaz de repetir seu conteúdo, palavra por palavra. O palestrante achou que isso era impossível e o motorista perguntou se ele seria capaz de apostar. E o desafio foi aceito.

O palestrante imaginou que essa seria uma forma diferente de começar sua apresentação. Que tão logo o motorista se atrapalhasse ele viria da plateia, para anunciar que fora uma brincadeira ou um teste para verificar o nível de atenção e interesse do público. Assim, trocaram de roupa e de lugar. No ambiente, foi o motorista para a tribuna enquanto o palestrante ocupou o último lugar na fileira de cadeiras, pronto para intervir assim que fosse necessário. Mas o motorista de fato repetiu a palestra usual com absoluta precisão, sendo capaz de reproduzir as expressões e os recursos todos do verdadeiro palestrante. O outro, incrédulo, ficou quieto no seu lugar, até o final.

Então começaram as perguntas de praxe, aquelas que geralmente são feitas. Essas também vinham sendo semelhantes ao que o público sempre questionava, e o motorista continuou saindo-se muito bem. Até que uma pessoa levanta algo novo e muito mais complexo. O palestrante sentiu que chegara a hora do desastre, com ele nem mais sequer podendo dizer que a troca fora apenas um teste, uma forma peculiar de apresentar o conteúdo. E entrou em pânico. O motorista, no entanto, sem demonstrar qualquer insegurança, fala ao seu mais recente interlocutor: – Meu jovem, essa questão levantada é tão fácil que vou pedir para o meu motorista, que está no final da sala, para que responda em meu lugar.

É incrível como associamos saber com aparência, com capital social, com títulos acadêmicos. Como se o seu lugar fosse privilegiado, no banco de trás e jamais na posição de um simples motorista. Mesmo com a sabedoria popular tendo a força da capacidade de observação e da vivência, da experiência, da tradição e da cultura. Não raramente ela segue sendo vista com desdém por alguns doutores, pelos que se apresentam de gravata. Aquele que aprendeu ao ouvir, por conhecer situações, teria mesmo necessariamente menos valor do que o outro, que teve acesso aos livros, que teve o privilégio de ocupar bancos escolares?

A desqualificação do saber popular, construída muitas vezes pela sociedade, não reconhece e não valida outros saberes, que podem conviver sim em harmonia com ele. A própria academia vez por outra reconhece isso, oportunidades nas quais concede títulos de Doutor Honoris Causa – em latim, Por Causa da Honra. Algumas personalidades que se destaquem por contribuição singular dada à educação, à cultura ou simplesmente à humanidade, sendo exemplo a ser seguido, podem vir a receber esses. Não é critério que a pessoa agraciada tenha titulação universitária. Mas, como se trata da maior distinção que uma universidade pode conferir a alguém, sempre é necessária a aprovação em sessão do seu conselho maior.

Na medida em que escrevia, lembrei dos griôs e das griotes, expressões usadas na África Ocidental para identificar homens e mulheres com a vocação de transmitir histórias, conhecimento e mitos dos seus povos. Também lhes cabia repassar as canções, sendo uma tradição oral muito forte. O que não era exclusividade deles, uma vez que se conhece semelhantes em vários outros pontos do planeta. No nordeste brasileiro isso sempre foi culturalmente importante, também. Os saberes que vão sendo acumulados por gerações, sendo reavivados na memória, pelo contar e recontar que aproxima. Foi assim que a história de todos nós começou a ser contada. É assim que começamos nossa jornada de aprendizado, que dura toda a vida. Tenhamos ou não conseguido uma graduação superior.

10.07.2022

O bônus de hoje é Simplicidade, de João Daniel Ulhoa, com a banda Pato Fú, a compositora Érika Machado e a cantora Fernanda Takai. 

DICAS DE LEITURA

OS SETE SABERES NECESSÁRIOS À EDUCAÇÃO DO FUTURO

Edgar Morin – 104 páginas – R$ 22,73

Os “sete saberes” indispensáveis enunciados pelo francês Edgar Morin constituem eixos e caminhos que se abrem a todos os que pensam e fazem educação e que estão preocupados com o futuro das crianças e adolescentes. O autor está com 101 anos de idade e continua um profissional ativo, realizando palestras e conferências. Esse livro é normalmente encontrado nas livrarias por mais de R$ 80,00. Assim sendo, adquirir essa edição através deste blog é uma oportunidade ímpar.

PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: saberes necessários à prática educativa

Paulo Freire – 144 páginas – R$ 24,89

Esse foi o último livro publicado em vida por Paulo Freire, em 1996. Essa obra reafirma seu profundo compromisso ético na defesa da existência digna. Nela, o educador aprofunda sua teoria-ética de uma existência voltada para a liberdade, a verdade e a autenticidade dos sujeitos, contra a lógica do capital. A partir do amor revolucionário e do rigor crítico, reflete sobre o que o ato de ensinar exige de educadores e educandos. Este valor aqui anunciado está com 45% de desconto.

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