OS MISERÁVEIS

Se for necessário que você tenha que escolher apenas um dos tantos clássicos da literatura universal – bom que essa exigência ilógica não tem razão de acontecer –, opte por ler Os Miseráveis. Reserve algum tempo do seu dia, por pouco que seja, e vá degustando com calma suas 1511 páginas. Victor-Marie Hugo não economizou nas palavras, no seu intento de descrever o período, seus personagens e as circunstâncias. Com seu talento, a obra se torna uma primorosa denúncia a respeito da injustiça. A narrativa parte da emocionante história de Jean Valjean, um homem que acaba condenado a dezenove anos de prisão apenas por ter furtado um pão para que sua irmã viúva desse de comer aos filhos dela. A publicação do livro se deu 160 anos atrás, em 1862.

Os dilemas morais que ele coloca são atemporais. E esse é o ponto mais alto na carreira do escritor. Ele oferece um olhar sobre as instituições e os valores da sociedade, partindo de três momentos históricos que lhes servem de fundo: a Revolução Francesa, que se estendeu entre 1789 e 1815, a Batalha de Waterloo (1815) e os Motins de Paris (1832). Esses dois últimos eventos são os limitadores do tempo no qual se passa toda a história. O primeiro é aquele que fornece a estrutura psicológica, uma vez que impactou o tecido social, as relações e as possibilidades de cada pessoa.

A questão é que o protagonista, mesmo após sair da prisão na qual foi submetido a trabalhos forçados, continuou a carregar a marca do seu passado. Foi como se a injustiça tivesse sido marcada em sua própria pele, com ferro em brasa. Isso molda seu espírito revolucionário. Num cenário que evidencia o desamparo dos mais pobres, temos o desfile de mendigos, prostitutas, prisioneiros e estudantes, mas também militares, clérigos e membros da alta sociedade. Tudo e todos são personagens que referenciam a profunda desigualdade social.

Victor-Marie nasceu no leste da França, em 1802. Seu pai era general das tropas de Napoleão Bonaparte, um republicano. Sua mãe era uma defensora da monarquia e católica. Ou seja, dentro mesmo de sua casa ele convivia com o conflito de ideias que dividia o país. Por pressão paterna, formou-se em Direito. Porém, seguiu depois suas aspirações literárias, para nossa sorte. Foi escritor, dramaturgo, romancista, poeta e ensaísta. Tudo isso sem deixar de seguir uma carreira também política. Chegou a ocupar uma cadeira no Senado, em 1845. Mas, na vida pública seguiu com a dualidade que tivera em sua origem: iniciou monarquista e depois se tornou liberal e republicano. O que não evitou que, devido ao fato de ter criticado o regime de Napoleão III, fosse exilado por mais de 18 anos.

Mesmo tendo publicado antes muitos poemas, peças teatrais e ensaios críticos, foi com o romance Notre-Dame de Paris (1831) que o escritor conseguiu alcançar destaque. Depois, com Os Miseráveis, ele foi além. Isso porque o livro é considerado um marco no movimento literário do Romantismo. Foi ele que o consagrou definitivamente, chamando ainda a atenção para todo o seu legado intelectual. O texto, por ser envolvente e poderoso, deu origem, com o passar dos anos, a inúmeras adaptações para o cinema, ocupando lugar de destaque também em outras mídias. O seu autor morreu na capital francesa, em 1885, aos 83 anos. Teve a honraria final de ser sepultado no Panthéon, onde estão personalidades como Jean-Jacques Rousseau, Jean Monnet, Alexandre Dumas, Voltaire, Maria Curie e René Descartes.

28.11.2022

O bônus de hoje é I Dreamed a Dream (Eu Sonhei um Sonho), música de Claude-Michel Schönberg, composta para versão cinematográfica de Os Miseráveis lançada em 2013. Quem canta é a atriz Anne Hathaway, que faz o papel da prostituta Fantine. A letra, traduzida, está logo abaixo.

“Houve um tempo em que os homens eram bons/ Suas vozes eram doces e suas palavras encorajadoras/ Houve um tempo em que o amor era cego/ E o mundo era uma canção/ E essa canção era excitante/ Houve um tempo… e então tudo deu errado/ Eu sonhei um sonho num tempo que se foi/ Quando as esperanças eram grandes e a vida valia ser vivida/ Eu sonhei que o amor nunca morreria/ Eu sonhei que Deus poderia perdoar/ Então eu era jovem e destemido/ Quando os sonhos eram sonhados, realizados e desperdiçados/ Não havia preços a serem pagos,/ Nem canção não cantada, nem vinho não provado./ Mas os tigres vêm à noite,/ Com sua voz suave como o trovão,/ Como se despedaçassem suas esperanças/ Como se transformassem seus sonhos em vergonha/ Ele dormiu por um verão comigo/ Ele preencheu meus dias com amor sem fim/ Ele levou minha juventude em sua correia/ Mas ele se foi quando o outono chegou/ E ainda sonhava com ele vindo a mim/ E nós viveríamos os anos juntos,/ Mas há sonhos que não podem ser/ E há tempestades que não podemos prever./ Eu tive um sonho de como minha vida seria/ Tão diferente deste inferno que estou vivendo/ Tão diferente agora daquilo que parecia/ Agora a vida matou o sonho que eu sonhei.”

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UM FANTASMA APAIXONADO

O ano era 1990 quando chegou aos cinemas um filme que trazia em si pelo menos quatro gêneros distintos, muito bem misturados. Terminou sendo um dos melhores lançamentos e alcançou considerável bilheteria. O seu diretor, Jerry Zucker, viu a obra ser indicada para concorrer ao Oscar de Melhor Filme, em 1991 – perdeu para Dança com Lobos, de Kevin Costner –, além de disputar em outras quatro categorias e vencer duas. Conseguiu isso ao equilibrar na dose certa romantismo, suspense, uma espantosa história sobrenatural e a leveza de uma comédia. Estou falando de Ghost – Do Outro Lado da Vida.

Na minha atual fase de reler, ouvir mais vezes e rever tudo, dediquei um pouco do meu tempo a esse filme, recentemente. E gostei do mesmo modo que na época do seu lançamento. A história tem uma aparente simplicidade, mas talvez prenda os espectadores por isso mesmo, além da multiplicidade de olhares que oferece, como descrevi no parágrafo anterior. É a história de um homem assassinado na presença da mulher que ama, mas que se recusa a abandoná-la após a morte. Ainda mais depois que descobre as razões de ter sido morto e que ela também está correndo perigo. O problema é que, sendo um “fantasma”, não consegue interagir com o mundo material para impedir que ocorra esse provável novo crime. Então, ele recorre aos “serviços” de uma médium que na verdade era uma charlatã, que explorava a boa fé dos outros sem saber que de fato tinha essa habilidade de se relacionar com desencarnados.

Patrick Swayze faz o papel de Sam Wheat, o espírito que segue muito apaixonado e tenta proteger Molly Jensen, vivida por uma Demi Moore jovem e linda como nunca. Mas quem rouba a cena é uma Whoop Goldberg, dando a medida certa de interpretação para a trambiqueira Oda Mae Brown, que lhe rendeu tanto o Globo de Ouro quanto o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. Claro que, em tempos nos quais já estava valendo o patrulhamento do politicamente correto, essas premiações não impediram que fossem feitas críticas pelo fato de ser uma mulher negra associada a um estereótipo, um “vodu negro”, como chegaram a escrever. O New York Times, entretanto, preferiu afirmar que ela fizera a personagem com “espanto e irritação”, encontrando um papel que combinava com ela, sendo um grande presente.

Para a indústria do cinema, o que importou mesmo foi que a produção custou relativamente barato, para os padrões de Hollywood: 21 milhões de dólares. Considerando que arrecadou mais de 505 milhões, sendo 17 deles aqui no Brasil, não foi mesmo nada mal. Na verdade, foi o filme de maior bilheteria naquele ano. Para o público, são 127 minutos de bom entretenimento. A pessoa se preocupa, diverte e emociona, há leveza e ao mesmo tempo tensão com os momentos de perigo, existe romance e esperança. Não assista esperando grandes elucubrações filosóficas, um filme que mereça virar “cult”. Mas pode acessar sem medo no streaming, que vai valer a pena.

07.04.2022

Patrick Swayze e Demi Moore

Como bônus temos hoje a música tema de Ghost, Unchained Melody, com The Righteous Brothers. O vídeo tem cenas do filme.

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