UM DOS SONS DA ADOLESCÊNCIA

Se eu contar para vocês que, na minha adolescência, eu ouvia músicas de Vincent Damon Furnier, um cantor e compositor natural de Detroit, provavelmente ninguém saberá quem é ele. Mas, se eu disser que o som que chocava e tinha letras obscuras – isso até a surpreendente e suave I Never Cry, que deixou seus fãs perplexos –, era produzido por Alice Cooper, pronto: quase todo mundo vai lembrar de quem eu falo. Ao longo de sua carreira ele lançou 26 álbuns gravados em estúdios, com os quais atingiu a marca incrível de mais de 50 milhões de cópias vendidas.

Sua explosão no cenário musical de todo o mundo ocorreu nos anos 1970. Os concertos de rock que promovia foram considerados pela crítica e pelo público como inovadores. As letras eram de uma tessitura forte, quase obscenas para parâmetros médios da época, com o seu visual gótico e agressivo completando o cenário. Na verdade, quem gostava dele era porque admirava a rebeldia, a necessidade de contestar tendo ou não algum motivo real. Não estava entre meus prediletos, com certeza. Longe disso, até. Mas eu acompanhava parte do que ele fazia.

Ele era tão excêntrico que tinha uma serpente – era uma jiboia, que é grande e não peçonhenta – de estimação. E costumava se apresentar com ela no palco. Uma certa ocasião estava, com sua banda, realizando um show na cidade de Knoxville, no Tennessee, e a cobra desapareceu. O réptil tinha sido deixado no banheiro do quarto de Alice, durante a noite, mas não amanheceu por lá. Tiveram que ir embora, sem levar ela junto. Duas semanas depois a gerência do hotel a encontrou. A hipótese é que o encanamento do local tenha lhe servido de esconderijo durante esse período. E, para sorte de todos, não houve nenhum encontro surpresa com hóspedes posteriores que por ventura tenham utilizado os mesmos aposentos. O susto seria grande, apesar do bicho não ser venenoso.

Na sua primeira turnê pela Inglaterra, Alice Cooper enfrentou alguns problemas. O primeiro deles é que previamente o músico já não era considerado bem vindo por membros conservadores do Parlamento Britânico, que chegaram a propor que fossem banidos. Depois, um caminhão que fazia a publicidade do seu show foi apreendido, em plena hora do rush na capital inglesa, causando grande alvoroço. O veículo tinha dois outdoors, um em cada lado, com fotografias do cantor nas quais aparecia “vestindo” apenas a sua jiboia.

Em termos musicais, talvez seus dois maiores sucessos tenham sido School’s Out (Fora da Escola), do álbum de mesmo nome, lançado em 1972; e No More Mr. Nice Guy (Não Mais Senhor Cara Legal), do álbum Billion Dollar Babies, de 1973. Mas há controvérsias, ou não se estaria falando de Alice Cooper. Seu single mais vendido, no entanto, foi o da inesperada I Never Cry (Eu Nunca Choro), que citei acima. Com ela conquistou um dos seus dois discos de ouro nos EUA. O outro foi com seu hit de retorno aos palcos, em 1989, depois de um tratamento contra o uso de drogas: Poison (Tóxico), nome mais do que oportuno para aquele momento.

Recentemente, forçado a parar seu trabalho, em função da pandemia, fez o que nem todos quiseram ou puderam fazer: manteve o salário de todos os músicos que o acompanhavam, usando para isso suas próprias economias. Velho como nunca e feio como sempre, ele está de volta aos palcos, agora em 2022. Segundo disse, está em condições de voltar a fazer a média de cem shows por ano, que realizou ao longo da carreira, antes da pandemia.

22.07.2022

Vincent Damon Furnier, o Alice Cooper

O bônus musical de hoje é I Never Cry (Eu Nunca Choro, de Alice Cooper.

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LEMBRANDO DO MEU PAI

Eu sou o mais moço dos quatro filhos que meus pais tiveram. Aquele “temporão”, que vem quando ninguém mais imagina que a família ainda vá aumentar. Por causa disso, a diferença de idade em relação aos demais era bem razoável e eu, ainda adolescente, era o único que não havia saído de casa, quando meu pai faleceu. Passados tantos anos desse fato, ainda lembro seguido dele, de tudo o que aprendi com sua presença e do muito que poderia ter aproveitado, fosse eu um tanto mais inteligente. Mas, na reta final daquele convívio, eu não tinha o necessário discernimento que só o passar do tempo oferece. E seria injusto comigo mesmo imaginar que deveria ter mais maturidade, quando a vida me oferecia na época aquilo que a faixa etária atrai ao natural.

O adolescente precisa ser rebelde. Isso é da sua natureza. Nessa fase a gente acredita que sabe tudo, que não precisa de ninguém e que somos todos nós eternos. Somos super homens mesmo sem capa e sem voar, vivendo num mundo que sequer tem kriptonita. O que faz com que, não raras vezes, coisas essenciais nos escapem entre os dedos. Areia que escorre, como nas ampulhetas. A data comemorativa deste final de semana me levou a ficar pensando nisso, a recordar uma vez mais do meu pai, que não viu sequer eu entrar na faculdade; não presenciou as minhas vitórias e derrotas normais da vida adulta; não conheceu o casal de netos que eu acabei dando a ele. Mas essa autocrítica de agora, baseada numa revisão normal que se faz – ou pode fazer – da vida, de tempos em tempos, perde um bocado de eficácia porque tem uma premissa irreal, que é examinar o passado com olhos e conhecimento de hoje em dia. O que, por óbvio, não pode funcionar.

Evidente que eu poderia ter sido um filho melhor. Ter entendido o seu momento, as suas circunstâncias de vida e mesmo a sua trajetória, que teve muito de superação e brilhantismo. Ele estudara tanto quanto foi possível, trabalhou muito, nos deu uma vida tão confortável quanto pode alcançar. Era honesto, fazia muitos amigos, tinha um riso alto e franco, completamente exposto e reconhecido. E sabia ser generoso como poucas pessoas conheci na vida. Liderou algumas instituições, com equilíbrio e segurança. E se colocava no lugar dos outros, com absoluta naturalidade. Nos seus últimos anos, vitimado por doença, por falsas amizades e ingratidões, perdeu muito do seu tamanho. Foi quando eu falhei, por não ter compreendido o desmoronamento involuntário da sua figura. Entretanto, ela foi sendo reconstruída por pedaços de memórias, sendo hoje uma estátua daquelas que ninguém iria incendiar.

Eu perdi meu pai, meu filho e meu único irmão – o Sérgio foi uma espécie de segundo pai para mim – ao longo dos anos. Me tornei especialista nesse tipo de dor, que também recebeu “reforço” com avós, tios e até primos. Mas no caso dos três, foi como cortes profundos na linha de descendência. Como galhos de uma árvore cortados sem cuidado algum, tipo o que tem sido feito em tantas ruas de Porto Alegre. Relações interrompidas sem que atingissem todo o potencial de troca que seria possível e desejável. Vontade imensa de que se pudesse os quatro sentarmos numa mesma mesa, dividindo alimento e relatos, expondo vontades e verdades, revendo caminhos, propondo um futuro. Claro que meu filho, que foi ainda quando criança muito pequena, teria que ter crescido nesse tempo. Mas seria algo que não tem preço. E que espero que um dia de fato possa vir a acontecer.

Como meu pai era de uma geração que tinha maior dificuldade de expressar sentimentos e admitir fraquezas, se tornava quase impossível ouvir dele um “eu te amo”. O que felizmente não aconteceu comigo, depois, com relação à Bibiana e ao Bolívar. Mas, devo admitir que essa “barreira” que sua educação criara me atingia do mesmo modo. E eu também não confessava a ele o meu amor. O que gostaria de ter feito. O que estou fazendo agora, com esse texto. Seu Walter, muito obrigado por tudo. Eu te amo como sempre amei e estou te compreendendo como nunca compreendi antes.

08.08.2021

Bônus 1: Música Naquela Mesa, de Sérgio Bittencourt, com Marina Aquino voz e violão. Essa canção foi uma homenagem do autor para seu pai, o músico Jacob do Bandolim, que faleceu em 1969 vitimado por um infarto fulminante. Há inúmeras versões, tendo sido gravada por Nelson Gonçalves, Elizeth Cardoso, Zeca Pagodinho e vários outros cantores.

Bônus 2: Música Guri, de César Passarinho, com o autor. Seu nome real era César Osmar Rodrigues Escoto, intérprete que simbolizava como nenhum outro a Califórnia da Canção Nativa, festival nativista da cidade de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul. Faleceu em 1998.

Recordações: Coloco aqui o link de acesso ao texto que escrevi sobre o Dia dos Pais, no ano passado. Naquela oportunidade foquei na minha experiência como pai da Bibiana. Desta feita, fui o filho do seu Saldanha.