O BUFÃO VESTE VERDE

Ou ele tem várias iguais ou inventou um meio de lavagem extra rápido. Não se vê quase nunca o cidadão com outra roupa que não seja aquela camiseta verde militar, mesmo em encontros burocráticos, entre chefes de Estado. Isso é tão inapropriado quanto ele estar no poder. O conflito lamentável que segue ocorrendo entre Rússia e Ucrânia parece ter feito as pessoas esquecerem que antes Volodymyr Zelensky não passava de um humorista de talento mediano, que fazia programas de TV no seu país. Concorreu e venceu em 2019 as eleições presidenciais, num pleito que foi antecedido por forte campanha para desacreditar a política convencional, movimento que buscou e conseguiu que Viktor Yanukóvich fosse derrubado em 2014. Qualquer semelhança com o que aconteceu no Brasil, com a retirada de Dilma Rousseff, o tampão Temer simultâneo com a Lava-Jato e apoio midiático, tudo levando depois à eleição do “Mito”, não é mera coincidência.

Vejam que esse grande e falsamente hilário líder ucraniano, que se prevê seja esquecido pelos atuais parceiros após o término da guerra, está em turnê pelo Ocidente, ao mesmo tempo em que os jovens de seu país, muitos dos quais tendo sido alistados à força, morrem nos campos de batalha. Para que se tenha uma percepção mais exata da sua falta de noção, ele e sua esposa Olena posaram para a capa da revista Vogue. No seu périplo, além de notoriedade, busca sempre mais e mais armamentos, que em geral recebe, com seus pedidos sendo atendidos pelos Estados Unidos e países da União Europeia. Nesta guerra lutada por procuração, recebe armas e munições e fornece carne humana. A Rússia, ao não concordar com o cerco militar que sofria, com bases da OTAN sendo cada vez instaladas mais perto do seu território, reagiu. E o que se vê é mais uma deplorável situação onde ninguém ganha nada. Exceto talvez o principal incentivador de tudo, que está comodamente localizado em outro continente, milhares de quilômetros distante.

Além da ameaça da OTAN, a provocação final aos russos vinha sendo também terceirizada, com mercenários do grupo paramilitar fascista AZOV tendo assassinado cerca de 14 mil ucranianos nas regiões de Donbass, onde estão Donetsk e Luhansk e uma população fronteiriça que sempre se identificou com suas origens russas, compartilhando idioma e muitos costumes. Estes crimes todos foram cometidos com a complacência do exército ucraniano e o silêncio cúmplice do Ocidente.

A mais recente aparição do humorista da camisa militar, que não faz mais ninguém rir, foi dia 20 de maio, durante a reunião do G7, grupo composto pelas sete maiores economias do mundo, ocorrida no Japão. Lula também estava presente, como convidado. E Zelensky chegou de surpresa para buscar dois objetivos bem claros: a repetição do papel de pedinte, com relação a armas; e obter do presidente brasileiro um apoio formal – o que teria especial relevância pelo papel geopolítico que o Brasil volta a ter e devido integrarmos os BRICS, onde estão também a China e a própria Rússia . No primeiro item seu propósito deve ter sido atendido, como sempre tem sido. Quanto ao apoio, a diplomacia brasileira já havia se posicionado pela neutralidade, mesmo tendo comunicado, por mera formalidade, que nunca nosso país apoiaria qualquer invasão territorial, seja ela qual for.

O ucraniano não apenas pediu audiência com o presidente Lula, como tentou determinar dia e horário em que ela deveria acontecer. O governo brasileiro ofereceu outros, mas Zelensky informou que esses não atendiam seus interesses, sem citar quais seriam eles. Em função disso, o encontro não ocorreu. Mesmo assim, o bufão que veste verde – já tivemos o Diabo vestindo Prada, mas isso foi na literatura e o no cinema – teve a cara de pau de dar uma entrevista posterior, na qual disse que Lula deveria estar decepcionado pelo fato de a reunião não ter sido possível. Agiu como na fábula da raposa e as uvas, que é atribuída ao grego Esopo e que muito tempo depois foi reescrita por Jean de La Fontaine.

O encontro que não houve poderia ter acontecido justo em Hiroshima, uma das cidades devastadas pela bomba atômica lançada pelos Estados Unidos perto do fim da Segunda Guerra Mundial. E o “Grande Irmão do Norte” bem que gostaria de um resultado diferente. Porque ainda sonha em nos envolver no mesmo atoleiro no qual conseguiu colocar a Europa, que mais tem sofrido com a falta, por exemplo, do gás russo. Enquanto isso, a Ucrânia está sendo totalmente devastada, com sua reconstrução futura significando que ficará de joelhos diante da enorme dívida que precisará contrair, junto aos mesmos países que agora a incentivam a lutar. Quanto ao Brasil, nada melhor do que manter neutralidade.

26.05.2023

A revista Vogue deu capa e bom espaço interno para o primeiro-casal ucraniano

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O bônus de hoje oferece primeiro o hit folk que foi produzido por um soldado ucraniano chamado Taras Borovok. Ele teve apenas quatro aulas para aprender trompete, mas compôs esta canção exaltando o drone turco Bayraktar, armamento que se tornou fundamental para a Ucrânia no início do conflito. Depois temos outra, de propaganda do Exército Vermelho, divulgada por apoiadores da Rússia.

O FASCISMO NA UCRÂNIA

Toda e qualquer guerra, por mais que se busque encontrar para ela uma justificativa, não deixa de ser uma irracionalidade. Se torna nova prova cabal e quase definitiva da incapacidade humana de sermos ao mesmo tempo racionais e empáticos, capazes de entender quaisquer questões também por ponto de vista oposto ao nosso. E esses conflitos, que são sempre decididos pela força maior ou pela eficiência no uso dos recursos militares disponíveis, atualmente têm um ingrediente novo e tão ou mais importante, que é o domínio das informações e o controle das narrativas. Já citei aqui mesmo no blog, em outro texto meu – Sobre Rússia e Ucrânia, em 28.02.2022, cujo link deixo abaixo –, a frase que é atribuída ao dramaturgo grego Ésquilo: “numa guerra, a primeira vítima é sempre a verdade”. Mesmo sem a comprovação sobre ser de fato de sua autoria, ela é precisa. E está ocorrendo mais uma vez agora, talvez como uma intensidade jamais vista antes, no conflito entre Rússia e Ucrânia.

Minha avó materna usava algumas expressões de origem na agricultura (ou ao menos no campo), por assim dizer, que caberiam todas para qualificar o presidente russo Vladimir Putin: não é trigo limpo, não vale o feijão que come e não é flor que se cheire. Vários de seus adversários políticos, por exemplo, sofreram estranhos envenenamentos e perderam a vida ou ficaram com sérias limitações, nos últimos tempos. Mas o enorme esforço da mídia ocidental para dar a ele a culpa exclusiva em relação à guerra que está ocorrendo, soaria apenas patética, não fosse meramente resultado da falta de apuração dos fatos ou do atrelamento a interesses mais do que conhecidos e um tanto escusos. Algumas vezes foi citado o expansionismo alarmante da OTAN, que fora criada no tempo da Guerra Fria e que em tese agora já nem seria necessária, como uma forma de ameaça constante contra a qual a Rússia já havia inúmeras vezes protestado. Em outras, essas com um esforço elucidativo ainda bem menor, comentaram sobre o Batalhão Azov. Mas, em ambos os casos e com destaque para o segundo, com pudores exagerados e uma espécie de medo das repercussões de análises mais profundas.

Volto ao tema da guerra agora justamente para propor uma reflexão sobre a existência de uma organização que oscila entre a invisibilidade e o terrorismo. O Batalhão Azov foi fundado a partir da atuação paramilitar de ultranacionalistas ucranianos, remanescentes dos colaboracionistas que apoiaram o exército invasor de Hitler, na Segunda Guerra Mundial. Por lá também existe um braço político, com partido que lhes dá sustentação: o Svoboda. Fortemente armados e defendendo abertamente ideias neonazistas, eles se estabeleceram no leste e no sul da Ucrânia, especialmente nas áreas onde sempre houve um desejo separatista também forte. Falo de Donetsk e Luhansk, que formam a região de Donbass. A imensa maioria de sua população é de origem russa, sendo inclusive idioma e muitos costumes também compartilhados com moradores do outro lado da fronteira. Famílias inteiras sempre estiveram divididas apenas pela linha imaginária que distingue um e outro território. Natural, portanto, o desejo da região ser integrada à Rússia ou, pelo menos, obter a sua independência. 

Assim, havendo uma dificuldade de ação direta do exército ucraniano, o governo central optou por fazer vistas grossas para as ações do Azov. E essas atividades incluíam crimes como ameaças, saques, cobrança por “segurança” – ao melhor estilo dos milicianos cariocas –, estupros e muitos assassinatos, que vinham acontecendo pelo menos desde 2013. Só que o resultado foi aumentar a vontade dos habitantes locais de se afastarem de Kiev, tendo maior aproximação com Moscou, a quem passaram a pedir um auxílio necessário para sua sobrevivência, que não vinha da própria capital. Importante salientar que o Azov não é composto apenas por ucranianos. Fanáticos da extrema direita de várias partes do planeta passaram a usar aquele território como uma verdadeira escola para a formação de mercenários, com aulas de guerrilha e de tortura. Muitos brasileiros inclusive estiveram e estão por lá. Esse “intercâmbio” era visto, por exemplo, com a presença de bandeiras ucranianas nas manifestações bolsonaristas, nos últimos anos. Tem que ser ressaltado que as ações extremistas iam muito além da manutenção do grupo armado, incluindo até influência na fanatização de crianças e jovens. Fotos que ilustram esse texto mostram treinamento de grupos infantis feitos bem antes da guerra, com o ensinamento de manuseio de armas de fogo.

Sob forte ataque russo e com muitas baixas, o grupo foi aos poucos se deslocando mais para o sul, com uma concentração maior na cidade portuária de Mariupol. Devido à enorme importância estratégica que tem o local, mas também por essa presença, os bombardeios russos foram sendo intensificados. Em alguns momentos Moscou ofereceu que fossem estabelecidos corredores humanitários, mas o sucesso foi pequeno. Isso porque os ultranacionalistas não permitiam a retirada da maioria dos civis, que lhes servem de escudos humanos e de propaganda contra os “comunistas desumanos”, que não deixam de atacar mesmo havendo muitos idosos, mulheres e crianças no local. Hoje estão cerca de dois mil desses mercenários, com um número não determinado de soldados ucranianos da 36ª Infantaria Naval e centenas de inocentes, ocupando os túneis que existem no complexo siderúrgico e metalúrgico da cidade. Isso deixa o exército russo numa “sinuca de bico”: se ataca, mata quem não deveria morrer; se apenas mantém o cerco, essas mesmas pessoas morrerão de fome, porque a comida escassa não será distribuída para ninguém além dos homens armados.

Interessante é que existem centenas de relatos sobre a ação criminosa dos extremistas do Azov, em especial de 2014 para cá. Até 2021, estimativas apontavam que quase 11 mil pessoas foram mortas por eles e 1,4 milhão terminaram deslocadas das suas residências. São textos e também uma grande cobertura fotográfica disponível. Entretanto, boa parte da imprensa não busca essas informações para rechear seus relatos, preferindo usar apenas aquilo que agências de notícias ocidentais repassam. As mesmas, por exemplo, que mostraram um tanque ucraniano passando de propósito sobre um automóvel ocupado por civis, garantindo que ele era russo. Depois, como ficou evidente o “equívoco”, uma vez que aquele modelo sequer integra o armamento russo, precisou voltar atrás, confirmando que o crime não havia sido perpetrado pelos invasores. William Bonner foi um dos que leram constrangidos uma nota esclarecendo o fato.

Para concluir, que fique claro: não se deve acreditar que existam nem mocinhos nem bandidos declarados. Ambos os lados têm suas culpas e responsabilidades, sendo necessário terminar com essa explicação simplista que ocupa noticiários e redes sociais. O que se precisa é que isso tudo termine logo. Para que menos vidas sejam perdidas e menos desculpas possam ser dadas, para tantos acontecimentos na economia e na política, com gente aproveitando o conflito como cortina de fumaça para situações que são causadas por motivos bem diversos.

27.04.2022

Você realmente deseja que o Brasil se transforme em território de milícias e mercenários armados pela extrema-direita?

Mulheres e crianças ciganas são amarradas em postes por neonazistas em Lviv, na Ucrânia.
Seus rostos foram pintados com o corante zelyonka, difícil de ser removido e que provoca queimaduras na pele e nos olhos.

O bônus de hoje é uma versão da música ucraniana Kukushka (Cuco), feita por Daria Volosevich. O vídeo foi produzido na região de Donbass, cidades de Luhansk e Donetsk, quando ainda o que ocorria era uma guerra civil. Está legendado em português.

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