A chamada “Gripe Espanhola”, que assolou o mundo entre o começo de 1918 e o final de 1920, matando cerca de 50 milhões de pessoas, não iniciou na Espanha. Recebeu esse nome porque a imprensa daquele país deu muito maior cobertura ao fato, enquanto em outros o assunto principal era o pós-guerra, uma vez que a Primeira Guerra Mundial havia recém acabado e o esforço para “reconstruir” o Ocidente era grande. Mas também foram interesses políticos e econômicos que levaram para aquele país da Europa a imerecida culpa de algo que começara nos EUA. Afinal, o ônus de ser responsabilizado por tamanho número de perdas humanas é imenso.

O conceituado historiador norte-americano Alfred W. Crosby, da Universidade de Harvard, contou a verdadeira história em livro publicado em 2003, relatando pesquisas que comprovam a presença do vírus no Kansas, em 1917. Seu colega Santiago Malta também aponta para a existência da doença em pelo menos 14 campos militares dos Estados Unidos, antes do final do conflito armado. Depois, mortes se sucederam nas tropas britânicas e alemãs. A Espanha, na realidade, foi atingida após isso tudo. Atualmente se acredita que se tratava de uma versão do agora conhecido H1N1, que já existia e vinha sofrendo mutações desde 1915. Com a pandemia da Covid19, também não faltaram oportunistas tentando, felizmente sem sucesso, chamar o contaminante de “Vírus Chinês”. O Brasil mesmo ficou à beira de um incidente diplomático sério, que traria repercussões para a economia do RS, por exemplo.

Sem ser relevante onde tenha surgido o coronavírus, a verdade é que ele tem alterado a rotina da imensa maioria das pessoas em todo o mundo. O distanciamento social reduzindo o convívio, bem como a ausência de alternativas de lazer e esportes para os que têm a sorte de poder ficar isolados, são dois dos fatores que ampliam sobremaneira a ansiedade. A falta do acesso à arte se mostra outra abstinência antes não enfrentada e que revela agora o quanto esse contato faz bem à alma humana. Não é por acaso que um grande número de lives musicais começaram a pipocar nas telas nos nossos computadores, celulares e televisores. Mesmo que essa experiência fique distante da que se vive em shows e espetáculos ao vivo, se mostrou relevante.

Nesse modismo necessário pela circunstância, uma garotinha de apenas seis anos, multi-instrumentista, explodiu como grande sucesso na internet. E essa sim veio da China. A pequena e meiga Zhou Zhaoyan mora na província de Jiangsu, que fica no lado leste daquele país asiático. Desde muito pequena ela cantava e seu pai, que é professor de violão, começou a ensiná-la aos três anos. Com quatro, já dominava piano e bateria, revelando enorme talento e precocidade. Com a pandemia, as aulas domésticas se intensificaram.

Hoje ela prefere, como seu pai, instrumentos de corda. E também gosta de ser chamada de Miu-Miu, vez por outra acrescentando Guitar Girl a esse nome. Sua família criou para ela um canal no Youtube e em poucos dias já tinha mais de 175 mil inscritos. Os vídeos produzidos fazem sucesso em todos os cantos do mundo e um deles em especial atingiu rapidamente mais de 5,2 milhões de visualizações: Fly Me To The Moon, este com o músico Bruno Zuchetti e outros três italianos. Na maioria deles, entretanto ela toca e canta sozinha.

Com seu jeitinho delicado e infantil, a pequena revela que gosta de ver o filme Frozen, que adora comer biscoitos gelados e que pretende ser médica no futuro. Esse um sonho fácil de ser alcançado, considerando a persistência já revelada no aprendizado de violão (acústico, clássico e elétrico), ukulele, baixo, bateria e piano, em mais de duas mil horas de prática. E não se esqueçam de que ela é chinesa, país que teve a coragem de bloquear províncias inteiras e cidades com milhões de habitantes, para deter algo que aqui está sendo tão difícil enfrentar.

07.08.2020

 No bônus, Miu-Miu interpreta Hotel Califórnia, do Eagles. O vídeo, que é muito bem editado, chegou a 2,5 milhões de visualizações em três meses.

8 Comentários

  1. Um belo texto e um bônus espetacular, me emocionei com a Miu Miu. Obrigado amigo, não conhecia esta menina. Sensacional. Grande abraço!

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