DUAS VEZES CRAZY DIAMOND

Os Estados Unidos viviam, em 1960, o auge da vergonhosa segregação racial que sempre acompanhou sua história. Pelo menos se imagina que sim. Apesar de nos dias atuais ainda serem rotineiras situações como a da morte de George Floyd, homem negro assassinado por policiais brancos na frente de câmeras, estas ao menos têm mostrado força para deflagrar reações como o movimento “Vidas Negras Importam”. Cerca de seis décadas atrás, as grandes mobilizações ainda sensibilizavam menos e eram resultado da atuação de líderes, como Martin Luther King. Mas, não se pense que pessoas anônimas – ou quase – não tenham também dado uma enorme contribuição à causa.

Foi naquele ano que Dion Diamond, cansado das humilhações diárias que sofria e pelo fato de ter seus direitos o tempo todo desrespeitados, fez algo impensado. Entrou em uma lanchonete que atendia apenas brancos em Arlington, cidade da Virgínia, escolheu um lugar e sentou. Em minutos, cerca de 20 homens o cercaram insultando. Mesmo com a ameaça de ser agredido, disse que só iria se retirar com a presença da polícia. Claro que ela foi chamada, tomando a providência de prender o rapaz. Algumas outras vezes ele e amigos já haviam feito isso, nesses lugares “exclusivos”. Mas sempre fugiam pela porta dos fundos, quando chegava a viatura. Desta feita ele optou por ser preso. Sua família só soube deste e dos casos anteriores, quando jornalistas começaram a ligar buscando informações sobre ele.

Foram várias as detenções, depois desta primeira, sempre pelo mesmo motivo. Uma resistência pacífica, que mostrava presença e incentivava outros para a repetição dos atos. Isso lhe rendeu o apelido de Crazy Diamond (Diamante Louco), com a utilização de seu sobrenome. Algum tempo depois foi recolhido à prisão de Baton Rouge, em Louisiana. Lá os guardas, todos brancos, trataram de sugerir aos internos que dessem um jeito no “hóspede” indesejado. Não contavam com o fato de a fama de Dion ter chegado antes ao estabelecimento. “Vocês sim, não ousem de modo algum mexer com ele”, foi a resposta recebida.

Pink Floyd – nenhuma relação com o George citado – foi uma das mais importantes e talentosas bandas de todos os tempos. E uma das suas músicas mais conhecidas é Shine On You Crazy Diamond. Ela de fato marcou história no grupo também por homenagear um dos fundadores e principal compositor, Syd Barrett. Ele saiu em 1968 devido a problemas mentais que foram agravados pelo álcool e pelas drogas. Mas deixou um legado extraordinário, que inclusive marcou a trajetória dos demais, que continuaram fazendo enorme sucesso. No seu lugar entrou outro que também se tornou lendário: David Gilmour.

A banda foi fundada em 1965 e gravou seu primeiro álbum apenas em 1967, sob a liderança de Barrett: Piper At The Gates Of Dawn. Mas não demorou muito para que desmoronasse a saúde dele, que deixou de ser participativo e alto-astral, ficando melancólico, distante e triste. Chegou a não comparecer a shows ou, como fez uma ocasião, foi e ficou tocando a mesma nota obsessivamente. Na realidade ele também convivia com a Síndrome de Asperger, o que tornava tudo ainda mais difícil. Excelente letrista, o grupo decidiu gravar o próximo álbum ainda com ele, mas sem que fosse envolvido em apresentações ao vivo. Oficialmente apenas em 1972 ele assinou um documento se desligando e abrindo mão de participação financeira.

Tudo isso está sendo posto para contextualizar os sentimentos de culpa e de saudade com que todos ficaram, em relação a Barrett. O que fica evidente no álbum Wish You Were Here, composto e gravado em homenagem ao amigo. Nele é que está a música em questão, que citei anteriormente. Aliás, o título dela tem uma citação indireta, com as três letras iniciais de palavras formando SYD, o seu primeiro nome. Agora sim o “diamante louco” estava devidamente eternizado. Escrita por David Gilmour, justamente seu sucessor, era uma peça instrumental que de certa forma “chamava” o fantasma do músico ao ambiente. Depois de pronta ela acabou sendo dividida em duas metades distintas, com um total de nove partes. É longa, mas maravilhosa e atemporal.

1º.06.2023

A foto mostra Dion “Crazy” Diamond ouvindo, de olhos fechados, os protestos contra sua presença feitos por George Lincoln Rockwell, o fundador do Partido Nazista Americano, na lanchonete de Arlington, na Virgínia. Ela faz parte do arquivo do jornal Washington Post.

Para contribuições voluntárias via PIX, na sua conta bancária informe a seguinte chave: virtualidades.blog@gmail.com (Qualquer valor será sempre bem-vindo)

Se você gostou desta crônica, garanta a continuidade do blog com uma doação. Isso ajudará a cobrir custos com sua manutenção. Logo aqui acima você encontra uma Chave PIX e abaixo deste texto existe um formulário para fazer doações. São duas alternativas distintas para que você possa optar por uma delas e decidir com quanto quer ou pode participar, não precisando ser com os valores sugeridos. Qualquer contribuição é bem-vinda. No caso do formulário, a confirmação se dá depois das escolhas, no botão “Faça uma Doação”.

Uma vez
Mensal
Anualmente

FORMULÁRIO PARA DOAÇÕES

Selecione sua opção, com a periodicidade (acima) e algum dos quatro botões de valores (abaixo). Depois, confirme no botão inferior, que assumirá a cor verde.

Faça uma doação mensal

Faça uma doação anual

Escolha um valor

R$10,00
R$20,00
R$30,00
R$15,00
R$20,00
R$25,00
R$150,00
R$200,00
R$250,00

Ou insira uma quantia personalizada

R$

Agradecemos sua contribuição.

Agradecemos sua contribuição.

Agradecemos sua contribuição.

Faça uma doaçãoDoar mensalmenteDoar anualmente

O bônus musical de hoje é justamente Shine on You Crazy Diamond, em gravação de 2019. Nela estão David Gilmour (guitarra e vocal), Nick Mason (bateria, percussão e vocal), Rick Wright (órgão e sintetizador), Guy Pratt (baixo), Gary Wallis (percussão e bateria), Tim Renwick (guitarra base), Jon Carin (sintetizador) e Dick Parry (saxofone). Fazem o “backing vocals” Sam Brown, Durga McBroom e Claudia Fontaine.

O BUFÃO VESTE VERDE

Ou ele tem várias iguais ou inventou um meio de lavagem extra rápido. Não se vê quase nunca o cidadão com outra roupa que não seja aquela camiseta verde militar, mesmo em encontros burocráticos, entre chefes de Estado. Isso é tão inapropriado quanto ele estar no poder. O conflito lamentável que segue ocorrendo entre Rússia e Ucrânia parece ter feito as pessoas esquecerem que antes Volodymyr Zelensky não passava de um humorista de talento mediano, que fazia programas de TV no seu país. Concorreu e venceu em 2019 as eleições presidenciais, num pleito que foi antecedido por forte campanha para desacreditar a política convencional, movimento que buscou e conseguiu que Viktor Yanukóvich fosse derrubado em 2014. Qualquer semelhança com o que aconteceu no Brasil, com a retirada de Dilma Rousseff, o tampão Temer simultâneo com a Lava-Jato e apoio midiático, tudo levando depois à eleição do “Mito”, não é mera coincidência.

Vejam que esse grande e falsamente hilário líder ucraniano, que se prevê seja esquecido pelos atuais parceiros após o término da guerra, está em turnê pelo Ocidente, ao mesmo tempo em que os jovens de seu país, muitos dos quais tendo sido alistados à força, morrem nos campos de batalha. Para que se tenha uma percepção mais exata da sua falta de noção, ele e sua esposa Olena posaram para a capa da revista Vogue. No seu périplo, além de notoriedade, busca sempre mais e mais armamentos, que em geral recebe, com seus pedidos sendo atendidos pelos Estados Unidos e países da União Europeia. Nesta guerra lutada por procuração, recebe armas e munições e fornece carne humana. A Rússia, ao não concordar com o cerco militar que sofria, com bases da OTAN sendo cada vez instaladas mais perto do seu território, reagiu. E o que se vê é mais uma deplorável situação onde ninguém ganha nada. Exceto talvez o principal incentivador de tudo, que está comodamente localizado em outro continente, milhares de quilômetros distante.

Além da ameaça da OTAN, a provocação final aos russos vinha sendo também terceirizada, com mercenários do grupo paramilitar fascista AZOV tendo assassinado cerca de 14 mil ucranianos nas regiões de Donbass, onde estão Donetsk e Luhansk e uma população fronteiriça que sempre se identificou com suas origens russas, compartilhando idioma e muitos costumes. Estes crimes todos foram cometidos com a complacência do exército ucraniano e o silêncio cúmplice do Ocidente.

A mais recente aparição do humorista da camisa militar, que não faz mais ninguém rir, foi dia 20 de maio, durante a reunião do G7, grupo composto pelas sete maiores economias do mundo, ocorrida no Japão. Lula também estava presente, como convidado. E Zelensky chegou de surpresa para buscar dois objetivos bem claros: a repetição do papel de pedinte, com relação a armas; e obter do presidente brasileiro um apoio formal – o que teria especial relevância pelo papel geopolítico que o Brasil volta a ter e devido integrarmos os BRICS, onde estão também a China e a própria Rússia . No primeiro item seu propósito deve ter sido atendido, como sempre tem sido. Quanto ao apoio, a diplomacia brasileira já havia se posicionado pela neutralidade, mesmo tendo comunicado, por mera formalidade, que nunca nosso país apoiaria qualquer invasão territorial, seja ela qual for.

O ucraniano não apenas pediu audiência com o presidente Lula, como tentou determinar dia e horário em que ela deveria acontecer. O governo brasileiro ofereceu outros, mas Zelensky informou que esses não atendiam seus interesses, sem citar quais seriam eles. Em função disso, o encontro não ocorreu. Mesmo assim, o bufão que veste verde – já tivemos o Diabo vestindo Prada, mas isso foi na literatura e o no cinema – teve a cara de pau de dar uma entrevista posterior, na qual disse que Lula deveria estar decepcionado pelo fato de a reunião não ter sido possível. Agiu como na fábula da raposa e as uvas, que é atribuída ao grego Esopo e que muito tempo depois foi reescrita por Jean de La Fontaine.

O encontro que não houve poderia ter acontecido justo em Hiroshima, uma das cidades devastadas pela bomba atômica lançada pelos Estados Unidos perto do fim da Segunda Guerra Mundial. E o “Grande Irmão do Norte” bem que gostaria de um resultado diferente. Porque ainda sonha em nos envolver no mesmo atoleiro no qual conseguiu colocar a Europa, que mais tem sofrido com a falta, por exemplo, do gás russo. Enquanto isso, a Ucrânia está sendo totalmente devastada, com sua reconstrução futura significando que ficará de joelhos diante da enorme dívida que precisará contrair, junto aos mesmos países que agora a incentivam a lutar. Quanto ao Brasil, nada melhor do que manter neutralidade.

26.05.2023

A revista Vogue deu capa e bom espaço interno para o primeiro-casal ucraniano

Chave PIX para contribuições voluntárias: virtualidades.blog@gmail.com (Qualquer valor será sempre bem-vindo)

Se você gostou desta crônica, garanta a continuidade do blog com uma doação. Isso ajudará a cobrir custos com sua manutenção. Logo aqui acima você encontra uma Chave PIX e abaixo deste texto existe um formulário para fazer doações. São duas alternativas distintas para que você possa optar por uma delas e decidir com quanto quer ou pode participar, não precisando ser com os valores sugeridos. Qualquer contribuição é bem-vinda. No caso do formulário, a confirmação se dá depois das escolhas, no botão “Faça uma Doação”.

Uma vez
Mensal
Anualmente

FORMULÁRIO PARA DOAÇÕES

Selecione sua opção, com a periodicidade (acima) e algum dos quatro botões de valores (abaixo). Depois, confirme no botão inferior, que assumirá a cor verde.

Faça uma doação mensal

Faça uma doação anual

Escolha um valor

R$10,00
R$20,00
R$30,00
R$15,00
R$20,00
R$25,00
R$150,00
R$200,00
R$250,00

Ou insira uma quantia personalizada

R$

Agradecemos sua contribuição.

Agradecemos sua contribuição.

Agradecemos sua contribuição.

Faça uma doaçãoDoar mensalmenteDoar anualmente

O bônus de hoje oferece primeiro o hit folk que foi produzido por um soldado ucraniano chamado Taras Borovok. Ele teve apenas quatro aulas para aprender trompete, mas compôs esta canção exaltando o drone turco Bayraktar, armamento que se tornou fundamental para a Ucrânia no início do conflito. Depois temos outra, de propaganda do Exército Vermelho, divulgada por apoiadores da Rússia.