Nada é tão urgente na vida, exceto talvez alguma necessidade premente de se ir até o banheiro. Tudo bem, admito que essa talvez não seja a melhor maneira de se iniciar um texto sobre algo tão sério. Entretanto, seriedade e bom humor não são coisas opostas. E temos que fazer uma severa oposição é quanto à forma como estamos quase todos nós, tanto como sociedade quanto como indivíduos, conduzindo as nossas vidas na atualidade. Não sei exatamente como isso começou, mas agora parece que tudo é para ontem. E não é de hoje. E não é nada bom.

Há algum tempo tenho a nítida sensação de que os dias têm menos do que 24 horas, pois nossos afazeres não cabem mais neles. Entretanto, contraditoriamente, as semanas parecem ter mais de sete dias. Como são mais e mais coisas a serem feitas, tudo tem pressa, presteza, há que ter prontidão, celeridade, urgência. Os finais de semana parecem estar sempre mais e mais distantes. Chegamos neles cansados, uma vez que não existe folga ou sossego anterior, mesmo que mínimo. Até suspeito que essa confusão mental possa ser resultado de algum fenômeno físico. Será que nossa Terra está girando mais rapidamente, que o Universo acelerou a sua expansão?

Não aguento mais tanta aceleração. Quando me pedem algo, o prazo já está no final. Como se as coisas viessem de trás para a frente. Outro detalhe é que agora como nunca nos cobram que sejamos todos nós multifuncionais. A gente tem que dar conta de coisas com as quais antes nem se preocupava. E várias delas ao mesmo tempo. Dizem que para os homens isso é ainda mais difícil do que para as mulheres. Não sei se é verdade, mas admito que quando coloco as coisas em fila indiana e as abordo uma por vez, me dou melhor.

Tenho vontade de comer quando estou com fome e não porque o relógio está mandando. De dormir quando estou com sono. De ter tempo para sonhar de olhos abertos. De caminhar na beira da praia até o sol se pôr. De ler e ouvir música muito mais do que estou conseguindo. Coisas assim tipo uma aposentadoria que nunca vou conseguir alcançar. Quero dar corda para a saudade, aquela de olhar fotos antigas. Mas, sem melancolia e com a chance de sorrir outra vez o mesmo sorriso que a imagem mostra. Preciso acreditar que nada é pra já, exceto a própria vida.

Aposto que esse desejo não é só meu. Impossível supor que isso apenas na minha cabeça exista. Sei também que muitas pessoas hoje em dia sequer conseguem cogitar essas possibilidades todas. Porque precisam se manter em movimento para se manter – no sentido de sustentar. O trabalho e o cotidiano estão colados, viraram uma coisa só. E romper com tal situação exige esforço tal que lhes faltam forças. Agora, o que posso dizer é que se o ideal não tem como ser alcançado, tal verdade não pode impedir que o possível seja buscado. Que uma brecha seja aberta.

Eu exijo meu direito de chegar atrasado. De dizer não. De discordar das obviedades. De escolher caminhos que outros consideram errados. De amar quem eu quiser, incluindo a mim mesmo. De ser rebelde com ou sem causa. De não me vestir conforme a ocasião. De gritar gol na janela mesmo sabendo que os vizinhos torcem para outro time. De ser politicamente incorreto uma vez por outra. E, principalmente, de dar uma banana para o tempo. Pelo menos para este tempo onipresente que a “sociedade contemporânea” quer me impor, pois talvez ele próprio não tenha nenhuma culpa quanto a isso.

25.04.2024

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