O BATEAU E A IMPUNIDADE

Noite de 31 de dezembro de 1988. A embarcação de turismo Bateau Mouche IV seguia em direção à Baía da Guanabara, no Rio de Janeiro, levando a bordo 142 passageiros que pretendiam ver a queima de fogos programada para a virada do ano. Quando faltam dez minutos para o início do evento pirotécnico, devido à superlotação e ao mau estado de conservação, afundou causando a morte de 55 dos seus ocupantes. O fato ocorreu entre a Ilha de Cotunduba e o Morro da Urca. Sendo mais preciso, ocorreu em frente à ponta sul da boca da enseada da Praia Vermelha.

A embarcação tinha sido construída em Fortaleza, no Ceará, 18 anos antes. Mas, originalmente, era um barco de pesca batizado de Kamaloka. Depois foi submetida a uma série de modificações, uma delas para que fosse acrescido um terraço suplementar. Também contribuiu o fato de duas caixas d’água terem sido postas no teto da embarcação e o piso do convés superior, que era de madeira, ter sido substituído por um de concreto. Outro dos motivos que propiciaram as condições para que adernasse, ao ser atingido por uma onda mais forte, foi os passageiros se deslocarem todos para o lado boreste, buscando posição melhor para ver a queima de fogos. Mas ainda houve outro agravante: com o excesso de peso as escotilhas ficaram abaixo do nível do mar, o que alagou os compartimentos inferiores. E as bombas de esgotamento não funcionavam perfeitamente.

O número de vítimas só não foi muito maior devido ao fato de a traineira Evelyn Maurício ter cruzado com o Bateau Mouche IV no momento no qual ocorria a tragédia. Vinha de Niterói com cinco pescadores e as suas famílias. Eles pararam e jogaram bóias, cabos e cordas, recolhendo mais de 30 pessoas. Outros tantos conseguiram sobreviver graças a alguns poucos coletes, por saberem nadar e devido ao socorro que foi chegando depois do alerta dado. O caso teve enorme repercussão em todo o país, com ampla cobertura também do inquérito que foi instaurado e de suas conclusões. A primeira questão é que o licenciamento permitia que fossem transportadas apenas 62 pessoas, não tendo sido essa a única irregularidade constatada pelas autoridades competentes, incluindo a Capitania dos Portos.

A atriz contratada pela Rede Globo, Yara Amaral, que estava com 52 anos, foi uma das vítimas fatais. Ela tinha uma trajetória profissional vitoriosa, tendo estudado na Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo. Esteve em espetáculos que marcaram época no Teatro de Arena e no Teatro Oficina. Fez trinta peças e ganhou três Prêmios Moliére como melhor atriz, trabalhando ao lado de nomes como Sérgio Mamberti e Gianfrancesco Guarnieri. No cinema esteve em O Rei da Noite, de Hector Babenco, além de A Dama do Lotação, Mulher Objeto e Leila Diniz, entre outros. Telenovelas fez uma na TV Tupi e pelo menos outras oito na Globo, como Dancin’ Days, Guerra dos Sexos e O Amor é Nosso.

A empresa Bateau Mouche Rio Turismo e seus sócios majoritários foram responsabilizados. Dois deles eram os espanhóis Faustino Puertas Vidal e Avelino Rivera, havendo ainda o português Álvaro Costa. Julgados, foram todos condenados por uma série de homicídios culposos, além de sonegação fiscal e formação de quadrilha. Mas a pena, pasmem vocês, foi de quatro anos de prisão em regime semiaberto. Eles apenas tinham a obrigação de dormir na prisão. Isso foi em maio de 1993, mas no mês de fevereiro do ano seguinte os três fugiram para a Espanha, ficando impunes. Nunca mais foram presos. Também nada aconteceu com os militares da Marinha que haviam emitido licenças sem vistoria. Todas as provas contra eles foram desconsideradas e acabaram inocentados do crime de corrupção.

30.12.2022

Yara Amaral, na novela Dancin’ Days

O bônus musical de hoje é duplo, com dois áudios. Primeiro temos Goma-Laca, com Vou Vender Meu Barco. Depois é a vez de Serena Assunção, com Iemanjá.

Vou Vender Meu Barco, com Goma-Laca

Iemanjá, com Serena Assunção

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