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A BATALHA PELA INELEGIBILIDADE

Se fosse considerado apenas o número de crimes cometidos durante o exercício da presidência, Jair Bolsonaro deveria ficar muito feliz se demorar para ser preso, usando recursos protelatórios. Teria mais algum tempo para curtir sua liberdade. Mas isso aqui é Brasil, o mesmo país que permitiu que os militares responsáveis pelas barbáries do período da ditadura militar saíssem impunes – ao contrário do que fizeram países vizinhos. Então, sabemos que nada mesmo pode ser considerado favas contadas. Assim, o negócio é ao menos afastar o ex-presidente da possibilidade de outra vez disputar preferência popular, nas urnas – sem desistir, lógico, de ainda se ver ele atrás das grades. Esse é um “jogo de xadrez” que já está sendo disputado, por enquanto nos bastidores da justiça e do meio político.

Uma situação posta no tabuleiro, por exemplo, era o afastamento que o ministro Ricardo Lewandowski, que tem 33 anos de magistratura, iria sofrer compulsoriamente em 11 de maio. Naquela data ele completa 75 anos e essa é a idade limite para a permanência no cargo. E por que isso teria algum tipo de relevância para a situação de Bolsonaro? Porque o processo que neste momento mais ameaça o ex-presidente – são nada menos do que 16 ações no total – avançou no TSE, com o seu relator Benedito Gonçalves tendo encerrado a fase de instrução e aberto prazo para as alegações finais. Tal fato indica que o julgamento vai ocorrer muito em breve, nas próximas semanas. Acontece que Lewandowski era um dos apontados como voto certo para a condenação do réu recém vindo dos EUA. Mas ele informou que se afastará um mês antes, agora em 11 de abril, o que na prática significa que não irá mais atuar nesse e em quaisquer outros processos.

E quem é o substituto de ministro que antecipou a sua aposentadoria, no TSE? Trata-se do piauiense Kássio Nunes Marques, que foi indicado por Bolsonaro, sendo totalmente alinhado com sua ideologia. Ou seja, um voto deverá ser invertido. Mesmo assim, ainda segundo análises feitas por observadores mais experientes, a votação final será de 5×2 contra o ex-presidente. Então, qual será o outro voto dado a ele? Mais do que previsível, se trata de uma certeza: Raul Araújo. Ainda mais bolsonarista do que Kássio, foi ele que determinou, durante o período eleitoral, que quaisquer vídeos onde constasse uma fala sequer associando o “mito” ao termo genocida deveria ser tirado do ar. Também foi quem resolveu instituir uma multa para artistas, fossem nacionais ou estrangeiros, que se apresentavam no Lollapalooza do ano passado e citassem seu descontentamento com o então presidente. Essa segunda decisão virou até meme, pois ele se atrapalhou todo e notificou a empresa errada. O tiro saiu pela culatra, tendo crescido o número de manifestações durante o festival.

Considerando o que foi posto acima, a condenação se torna mais do que provável. Então, o que fariam os bolsonaristas para tentar impedir isso? O risco maior recairia sobre pedido de vistas. Um dos dois citados acima iria solicitar mais tempo para “avaliar a situação e decidir seu voto”, mas com a intenção real de sentar sobre o processo e deixar ele lá, parado por tempo indeterminado. O julgamento seria travado até que uma nova configuração do TSE lhes fosse favorável. Entretanto, um contraveneno já foi aplicado, ainda no final de fevereiro. A providência é uma medida visando agilizar as ações na corte, com a limitação de 30 dias para que um processo qualquer seja devolvido, após pedido de vistas. Com isso, os bolsonaristas irão conseguir no máximo esticar o tempo de votação.

Para quem não sabe, esse primeiro da leva enorme de processos é o que trata daquela reunião estapafúrdia de Jair Bolsonaro com embaixadores estrangeiros, na qual ele buscava apoio internacional para dar um novo golpe e permanecer no poder. Agora, o que se pode prever é que todo esse apego vai resultar em algo oposto: ele não deverá mais ser o incensado, tendo a extrema-direita que escolher outro nome para receber o seu apoio financeiro e de estrutura montada com fake news, cristianismo falso, milícias e parte das Forças Armadas e da segurança pública.

06.04.2023

Caricatura feita pelo alemão Frank Hoppmann

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A caricatura que ilustra esta crônica foi criada pelo alemão Frank Hoppmann e foi publicada originalmente no jornal Paradox, de Israel, com o título de Bolsonaro. Com ela o autor obteve premiação no World Press Cartoom (WPC), no ano passado, ficando em segundo lugar. A imagem original o mostra de corpo inteiro, com a faixa presidencial. O destaque fica pelos olhos injetados e o ranger de dentes. A entrega do prêmio aconteceu em Caldas da Rainha, Portugal.

O bônus de hoje oferece primeiro o áudio de Impunidade, música da Tribo de Jah. Depois temos um vídeo com um recado da presidenta do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, para Jair Bolsonaro.

Tribo de Jah – Impunidade

DIVALDO NÃO REPRESENTA A MAIORIA

Apenas as pessoas que não conheciam bem Divaldo Pereira Franco é que foram surpreendidas pelas suas declarações, proferidas no último dia 9 de fevereiro. Integravam palestra que ele ministrou na Mansão do Caminho, em Salvador, tendo se tornado públicas a partir de vídeo que circula nas redes sociais desde a quinta-feira passada, dia 16. O médium diz literalmente que “estamos vendo leis absurdas, prisões estúpidas, sem julgamento. Como é que pegam pessoas na rua, colocam num ônibus e levam para a cadeia?”. Fazia naquele momento referência aos que foram detidos em flagrante, por uma série de crimes cometidos em Brasília, no dia 8 de janeiro. Ainda segundo ele, não se pode acusar essas pessoas de serem terroristas, pois “ninguém estava com revólver, nem faca, nem canivete, nem gilete, nem cortador de unhas”. E não ficou nisso, com ele se superando nas observações que continuou fazendo: “mil e tantas pessoas, crianças de colo, idosos de 80 anos e ninguém se sensibilizou”. Para concluir, disse que “a imprensa nem toca no assunto, porque desagrada patrocinadores”.

Foi um verdadeiro show de desinformação e um desserviço à verdade. Não há absurdo nas leis, com elas apenas sendo agora cumpridas. Não são estúpidas as prisões, que se fizeram mais do que necessárias. O julgamento – e ele faz que não sabe disso – virá apenas depois de todo o rito, que passa pela investigação policial com indiciamento ou não, pela aceitação ou não da denúncia por parte do Ministério Público, para então ser instaurado o processo judicial, no qual será garantida a ampla defesa. Estão presos preventivamente os que representavam maior risco para a ordem pública, muitos dos quais inclusive com antecedentes criminais, enquanto centenas de pessoas terminaram liberadas já nos primeiros dias, com ou sem o uso de tornozeleiras eletrônicas.

Será que devido à idade avançada Divaldo não vê mais televisão, nem acompanha notícias por qualquer outro meio confiável? A violência do grupo golpista foi extrema e o dano aos bens públicos de elevada monta. Não teve esse senhor, lá na Bahia, acesso a quaisquer um entre centenas de vídeos com as cenas, muitos dos quais feitos pelos próprios envolvidos? Onde estão nessas imagens as crianças de colo que ele cita? Idosos que participaram pareciam estar em boas condições tanto físicas quanto de discernimento, não sendo inclusive o grupo mais numeroso apesar de também atuante. Entre esses os octogenários, se existiam, com certeza não somavam o número de dedos de uma mão. Quanto à imprensa, essa foi incansável na cobertura, que se mostrou mais do que adequada e necessária. Mais ainda: para fazer terrorismo ninguém precisa se transformar em um homem-bomba.

O auge da obra de Divaldo junto ao Movimento Espírita foi aquela estrutura que ajudou a construir a partir de 1952, no bairro de Pau da Lima, na capital baiana – eu estive lá uma ocasião, conhecendo tudo de perto. E não fez isso sozinho, tendo sido de fundamental importância a participação de Nilson de Souza Pereira. Mas, o que o notabilizou foram as palestras que passou a fazer em todo o país. Entretanto, quem teve a oportunidade de ver mais de uma – eu vi pessoalmente cinco delas –, e não tinha a sua percepção afetada pela idolatria, já notava duas coisas. Uma, que ele seguia um roteiro cuidadoso, repetindo sempre citações e passagens postas de modo criterioso em momentos pensados, numa retórica calculada e bastante aprimorada, com o passar do tempo. O segundo detalhe é que ele não fazia esforço algum para se expressar em uma linguagem mais popular. Adorava, por exemplo, usar o arcaico pronome pessoal “vós”. Sendo mais direto, ele sempre foi pernóstico. Divaldo jamais teve e jamais conseguiria ter a humildade e a simplicidade de um Chico Xavier, por exemplo.

O que não se pode negar é a sua importância na difusão da doutrina. A notoriedade que ele adquiriu – e da qual sempre gostou bastante – deu uma contribuição importante nesse sentido. Ele arregimentava grande número de pessoas, por onde passava. E isso popularizava ao menos as noções básicas do espiritismo. Nos últimos tempos, entretanto, falava muito mais para os já “iniciados”, não tendo mais aquele poder de trazer público externo. Hoje se mostra um homem que está tendo dificuldades no envelhecimento. Ele não arreda um centímetro das suas posições, que sempre foram conservadoras e que agora parecem estar se aprofundando. Sob o cabelo cuidadosamente pintado, pensamentos que não seriam de modo algum corroborados por Kardec ganham cada vez mais espaço.

O ápice deste modo de pensar, que se revela há tempos como atrasado, talvez tenha sido atingido quando ele recebeu das mãos de Bolsonaro, antes das eleições do ano passado, a Insígnia da Ordem do Rio Branco. Com ela veio o encantamento e ele não se acanhou mais em momento algum no sentido de confirmar seu apoio a um homem que é verdadeira antítese de tudo o que prega a Doutrina Espírita. Kardec, o codificador, sempre defendeu a ciência e repetia que, no dia que essa desmentisse algo defendido nos ensinamentos, eles deveriam ser revistos. O nosso felizmente agora ex-presidente fez de tudo para destruir a educação e a pesquisa em nosso país, sucateando ambas em todos os níveis. Passou todo o período da pandemia incentivando os brasileiros para que não se vacinassem, apesar de agora saber-se que ele se vacinou. E foi o maior responsável pelo absurdo de termos perto de 700 mil desencarnes, com mais da metade desse número sendo evitável. Não pode se declarar cristão quem tenha um torturador como ídolo. Não é cristão quem admite ser racista, homofóbico, misógino, quem manifesta desrespeito com as mulheres, os índios e deficientes, quem imita uma pessoa que está morrendo asfixiada e acha graça disso.

Alan Kardec era um educador amoroso e racional. Ao receber os dados que vinham de médiuns de todo o mundo, com os quais sistematizou a doutrina em seus livros basilares, ele preferia refutar mil verdades do que aceitar o risco de introduzir nos textos uma única mentira. Divaldo virou um disseminador de fake news, como essas que citei na abertura desta crônica, esteja fazendo isso de modo involuntário ou consciente. Parece ter esquecido que um verdadeiro espírita defende o amor e a caridade, não o ódio e o apego ao poder. Defende a paz, não que a população se arme. Jesus Cristo foi o maior exemplo de acolhimento, Bolsonaro causou desagregação. Como agora se vê também dentro do Movimento Espírita, que teve parte dos seus membros cooptados para apoiar algumas práticas diametralmente opostas aos princípios doutrinários.

Sobre as manifestações de Divaldo, ele não fala em nome do Movimento Espírita como um todo. Não recebeu procuração para tanto. Hoje em dia, nem mesmo a Federação Espírita Brasileira consegue fazer isso. Porque o espiritismo no fundo é uma filosofia que defende o livre pensar, que respeita singularidades, que entende a complexidade da existência. Sua organização institucional, para ser integrante do tecido social, se faz necessária. Mas em alguns momentos tem se revelado asfixiante, uma forma de conservar tanto o passado que chega a negar os aspectos da doutrina enquanto proposta progressista, de vanguarda, de responsabilidade com o presente e de visão e compromisso com o futuro. O Movimento Espírita não está num mundo separado, vivendo uma realidade paralela. Ele está inserido no espaço e no tempo presentes, precisando entender e fazer de fato parte disso.

Felizmente nós temos grupos como o EàE (Espíritas à Esquerda), já organizado em 17 estados brasileiros e com encontros promovidos em âmbito nacional. E ainda, entre outros, existem a Associação Brasileira Espírita de Direitos Humanos e Cultura de Paz, o Coletivo de Estudos Espiritismo e Justiça Social, o Centro de Pesquisa e Documentação Espírita, o Espíritas Progressistas, o Coletivo Girassóis – Espíritas pelo Bem Comum, além da Associação Brasileira de Pedagogia Espírita. Essa última mantém a Universidade Livre Pampédia, que oferece o curso de Pós-Graduação em Pedagogia Espírita. Ou seja, o movimento já possui estrutura sólida e legítima, reunindo quem não abre mão de ser mantido o braço da preocupação e das atribuições sociais, como algo além da também necessária caridade material. Vários desses grupos divulgaram manifestos contra o voto em Bolsonaro, no ano passado. Pesquisas feitas por institutos sérios demonstraram que no último pleito, ao contrário do anterior, a votação dos espíritas majoritariamente (67%) não foi dada para ele. Ou seja, na pior das hipóteses se pode afirmar que Divaldo não representa a maioria. E, depois desse último fato, mais contestações surgiram, também fora do âmbito religioso e na imprensa em geral.

Não se pode mais permitir a manipulação da realidade. Nem a proposital confusão do que sejam a Doutrina Espírita e o Movimento Espírita, que são coisas totalmente diferentes. A primeira segue irretocável; o segundo merece passar por uma revisão e uma depuração urgentes. Para concluir e voltando a falar de Divaldo, todo o nosso agradecimento a ele pelo seu passado. Mas é triste vermos a senilidade de um homem que tinha tudo para ser um líder respeitado, mas que agora se acomodou em postura muito menor, de um simples pastor. No mau sentido desta palavra.

24.02.2023

O Movimento Espírita sempre foi conservador, ao contrário da Doutrina Espírita. Essa é progressista por excelência (Importante: a ilustração acima nos mostra Alan Kardec e não Divaldo Pereira Franco)

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Logo depois disso você tem acesso ao bônus de hoje, que é um clipe da música Daqui Só Se Leva o Amor, com Jota Quest.

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