Toda pessoa minimamente informada sabe que as redes sociais não são apenas um meio de ligação e contato interpessoal. E também que a internet não vende informação, mas sim os acessos de quem as buscam. O suposto consumidor na verdade é o produto. Nossos dados, perfil e a previsibilidade de hábitos de consumo não têm preço para as big techs. E aqueles misteriosos algoritmos, que não respeitam nossa privacidade e sabem mais a nosso respeito do que nós mesmos, são a mão invisível e insondável que nos agarra, aponta e determina nossa pseudo liberdade. Somos livres para comprar o que eles sugerem. Somos livres para acreditar piamente naquilo que eles nos asseguram ser verdade – nada como ter uma opinião que eu juro ser minha. Somos livres para seguirmos numa escravidão sem amarras físicas. E para a reprodução de uma sociedade nada igualitária.

As grandes empresas do setor fazem isso em nome da receita fabulosa que asseguram para si. Entretanto, uma pesquisa realizada em conjunto por duas universidades dos EUA revela ainda que o Facebook, por exemplo, direciona até mesmo anúncios pelos quais recebe, seguindo decisões tomadas de forma discriminatória, o que é um fator agravante. E fazem isso mesmo sem o pedido dos seus anunciantes. Ou seja, determinadas ações estariam sendo executadas por conta própria. Um dos casos descobertos pelos pesquisadores foi de anúncios que eram ocultados de públicos como as mulheres e os negros, mesmo com o pedido feito por quem estava por eles pagando no sentido de que tal publicidade fosse para uma “ampla audiência”.

Quem se debruçou nessa análise minuciosa foi um grupo de seis professores das universidades Northeastern e Sul da Califórnia, que foram apoiados pelo grupo ativista Upturn. Eles gastaram US$ 8,5 mil do próprio bolso, para fazer anúncios na plataforma e identificar como ocorria a distribuição posterior. Sem determinar o público que desejavam atingir, constataram que aluguéis de casas, por exemplo, eram direcionados em quase 80% para clientes potenciais brancos. Logo depois mudaram as peças que haviam criado para a publicidade e o resultado foi que com uma foto de família negra ele foi muito mais restritivo, enquanto o mesmo anúncio com foto de brancos foi distribuído para 85% da clientela.

Quando ofertaram vagas de emprego também foi constatada inegável predisposição para estereótipos. Buscando pessoas para a função de caixa de supermercado, quase 90% dos direcionamentos foram para mulheres; para motoristas de táxi, 75% foram para homens negros. Depois de divulgado o trabalho, o Facebook anunciou que serviços imobiliários, ofertas de crédito e vagas de empregos não poderiam mais passar por filtros de raça, sexo, idade e endereço. O que, cá entre nós, devemos duvidar que esteja sendo cumprido, tanto lá quanto aqui. Só que nem mesmo essa concessão ocorreu de forma voluntária, mas sim a partir de acordo que precisou ser firmado na Justiça. Isso porque a União Americana de Liberdades Civis, cuja sigla em inglês é ACLU, decidiu processá-los. Segundo aquela ONG, apenas pessoas de menos de 45 anos recebiam anúncios quando buscavam trabalho, com limitadores ainda ligados às áreas onde moravam. Também depois desse fato, a empresa informou que estaria “por vontade própria” excluindo nada menos do que cinco mil das categorias de anúncios que aceitava, “para proteger as pessoas da publicidade discriminatória”, dentro da rede.

O problema é que ninguém conhece detalhes do mecanismo existente por trás da entrega de anúncios daquela empresa. Apenas que ela trata de criar “personas” para o enquadramento. Evidente que o anunciante informa pontos específicos que deseja. Mas, a esses são associados outros tópicos que o Facebook define por conta própria. E estes partem de preconceitos que a sociedade precisa combater, não evidenciar como eles fazem. Os perfis, com isso, se tornam ainda mais discriminatórios do que podem estar sendo, pelos contratantes. Conforme já indiquei acima, parcialmente, pessoas que residem em áreas mais pobres e que tenham a pele negra só recebem informações sobre vagas menos importantes na avaliação social, como zeladoria e serviços domésticos. E jamais são elas lembradas para ocupações que exijam nível superior e que paguem os melhores salários.

Tornar público pesquisas como essa talvez seja fator que importe um tanto mais, quando se ouve o presidente da Câmara dos Deputados, aqui no Brasil, prometendo que este ano será finalmente avaliada com a devida seriedade uma forma de controle e responsabilização das empresas por aquilo que colocam nas redes sociais. Sem ele permaneceremos correndo sérios riscos, não apenas individuais como também coletivos. Haja vista o que influenciaram, por exemplo, nas escolhas feitas em eleições recentes, em nosso país e fora dele.

04.01.2024

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O bônus de hoje é Identidade, de Jorge Aragão, na voz de Elza Soares. O clipe foi gravado em 2016, quando se comemorava o Centenário do Samba. Naquela ocasião o Sambabook chegava à sua quinta edição, na qual o reverenciado foi justamente esse autor, que completava então 40 anos de carreira. Nos anos anteriores, foram lembradas as obras de João Nogueira, Martinho da Vila, Zeca Pagodinho e Dona Ivone Lara.

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