Vamos supor que neste exato momento indivíduos de uma civilização muito adiantada estejam, lá do seu planeta distante, com um telescópio muito poderoso olhando para a Terra. Eles estarão vendo, por exemplo, os dinossauros caminhando calmamente sobre planícies ou atacando uns aos outros, dependendo dos espécimes. E se, ao mesmo tempo, nós tivéssemos tecnologia avançada o suficiente para olharmos para aquele mesmo planeta, não iríamos surpreender os tais ETs nos espionando. O que se veria seria o passado da civilização deles. Conforme a distância entre os dois pontos, um e outro lado se deparariam com fragmentos da história mais recente ou mais antiga do observado. Quantos maior a quantidade mais anos-luz entre os dois planetas (*), mais tempo no passado estaria nas lentes.
O impressionante nisso tudo é que não seriam apenas imagens, não se trataria de um filme. O que fosse visto estaria acontecendo. Então, se a distância fosse pequena e o aparelho muito sensível, veriam nossos entes queridos que nos deixaram, ainda com vida. Ou seja, aqui estas pessoas teriam desencarnado, mas lá não. Porque o passado aqui seria presente lá e vice-versa. Não se trata de nenhuma obra de ficção: essa é uma realidade mais do que absoluta. Todos nós temos, em tese, as condições necessárias para ver o passado – pena que não se possa ver o futuro – e podemos fazer isso todos os dias, só que não nos damos conta disso. O que não se consegue é interagir com ele, tentando alterar as coisas.
Por exemplo: quando olhamos para o Sol – é bom não fazer isso sem um bom protetor, para evitar danos à retina – não o estamos vendo “agora”. A sua luz nos chega com oito minutos de atraso. Ou seja, o Sol que eu vejo já não é o mesmo que está lá: eu o vejo como ele era oito minutos atrás. Estrelas então, nem se fala. Muitas das que nos brindam com o seu brilho, em noites claras, sequer existem mais. Já morreram há muito, mas tal informação não chegou até aqui. Levará alguns anos para que se saiba que ela apagou. Então, ela ainda existe, mesmo tendo morrido.
Esse é apenas mais um nó que se dá na nossa (pouca) compreensão da realidade. Talvez dos menores. Tudo se complica muito mais quando se acrescenta outras informações, como a existência de universos múltiplos e paralelos, dobras do tempo-espaço e as descobertas da física quântica e teoria das cordas. Todo o conhecimento humano parece ser um quase nada. Quanto mais se descobre, ficamos mais distantes do entendimento pleno. O que, muito provavelmente, seja inatingível.
A expressão filosófica “só sei que nada sei” (“ipse se nihil scire id unum sciat“, em latim), frase derivada na narrativa de Platão a respeito de Sócrates – grego que viveu entre 470 a.C. e 399 a.C. –, apesar de não mencionada em nenhum texto antigo, a rigor se trata de um modo de exaltar a humildade intelectual do seu possível autor. Mas, se torna cada vez mais atual, conforme se acumula uma maior experiência e domínio científico. Sócrates questionava muito as autoridades de sua época e afirmava que tudo o que era compreendido como sabedoria não passava de meras opiniões.
Ele defendia a busca permanente do conhecimento real através de um método que partia do questionar para o refletir, conhecido pelo nome de “maiêutica”. Aliás, essa é uma das técnicas centrais de toda a tradição socrática. O termo vem da palavra grega maieutiké, que significa, em uma tradução livre, “arte de partejar”. O filósofo comparava-se de certo modo com uma parteira, pois a “verdade”, a compreensão possível, seria algo que já está dentro de nós, algo que precisa apenas ser “parido”. E, como o tempo passado ainda é uma realidade, ele segue neste instante no ginásio do Liceu dizendo isso aos seus discípulos Ésquines, Símias, Críton, Xenofonte, Fedro e Cebes, além do já citado Platão.
17.04.2025
(*) A propósito: para ver os dinossauros a civilização inteligente tem que estar distante uns 60 milhões de anos-luz da nossa. Esse seria também o tempo que se gastaria, viajando na velocidade da luz, para chegar até lá. Ou para eles virem até aqui. E isso é um quase nada, considerando-se o tamanho do Universo conhecido.

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