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O INEXPLICÁVEL ÓDIO A ÁRVORES

Uma árvore de mais de 200 anos, localizada no Parque Nacional de Northumberland, no norte da Inglaterra, foi simplesmente abatida, na noite de 28 de agosto, por um jovem de 16 anos. Ela não apenas era bastante antiga, como também famosa. Isso porque foi cenário de vários filmes de sucesso, aparecendo por exemplo em cena de Robin Hood: Príncipe dos Ladrões, filmado em 1991, com Kevin Costner. Além disso, estava localizada junto da histórica Muralha de Adriano, listada como Patrimônio Mundial da Unesco, ela que foi construída cerca de 1.900 anos atrás, com o objetivo de proteger a fronteira noroeste do Império Romano. Milhares de turistas visitam o local todos os anos, com uma fotografia tirada junto à árvore sendo verdadeiro clássico. Conhecida como Sycamore Gap, ela era icônica e considerada como a mais importante de todo o Reino Unido. Isso até o adolescente cometer esse deliberado e inexplicável ato de vandalismo. Tivesse isso ocorrido no Brasil, no ano passado, o jovem teria grande chance de obter estágio no Ministério do Meio Ambiente, talvez como assessor do então ministro e hoje deputado federal, Ricardo Sales, ao invés de ser preso.

Mas, se você considera este ato insano, tenho pelo menos mais um para te contar. Por absurdo que possa parecer, uma sequoia gigante, que também tivera um nome atribuído para si, foi cortada exatamente porque pouca gente acreditava que ela existisse. Mark Twain tinha, segundo as estimativas, pelo menos 1.350 anos de idade, tendo chegado à altura de impressionantes mais de cem metros, com uma circunferência de 27 metros e mais de oito metros de diâmetro. Fincara suas raízes num local onde bem depois do início de sua vida foi delimitado o Parque Nacional Kings Canyon, na Serra Nevada, Califórnia, oeste dos EUA. O batismo, como já devem estar desconfiando quem conhece um pouco da literatura norte-americana, foi para ser feita uma homenagem ao humorista e escritor assim chamado.

Em época na qual as comunicações não tinham a instantaneidade de hoje, sua existência era quase como uma lenda. Como muitas pessoas duvidavam dos relatos, a derrubada se deu em 1891, apenas para que seções do seu tronco pudessem ser depois exibidas em museus de história natural, existentes em Nova York e Londres. Ou seja, porque não acreditavam que ela fosse real, a solução encontrada foi matá-la para provar que estava viva. É preciso dizer que naquele momento a exploração de madeira era intensa, mas ela sozinha continha mais matéria prima do que um hectare inteiro de pinheiros de bom porte. Como não havia maquinário tão eficiente quanto os da atualidade, seu corte demorou 13 dias inteiros e intensos para ser concluído.

Agora, este desrespeito com as árvores, um dos maiores símbolos da generosidade da natureza, por aqui consegue ser ainda maior. Basta ver o que tem sido feito com a Amazônia, a maior floresta tropical de todo o mundo. E isso acontece com outros biomas também, como a Mata Atlântica. O desmatamento é implacável, de tal forma que se informa e comemora não o seu término, mas a queda na sua intensidade. Quando o noticiário fala do fato, na televisão, anuncia que houve “redução” de tanto por cento. Ou seja, que estamos matando mais lentamente e não zerando o crime ambiental.

Em Porto Alegre, o prefeito Sebastião Melo (MDB) concedeu o Parque da Harmonia esse ano, para a iniciativa privada. A empresa Gam3 Parks, que ficará com ele pelos próximos 35 anos, recebeu uma “autorização informal” – isso não foi documentado, não houve termos de condições devidamente assinado – para derrubar nada menos do que 435 árvores. Pouco adiantou a reação popular contra o fato, pois quando ela veio as árvores já estavam abatidas.

Em termos de Estado, o ex-governador José Ivo Sartori (MDB) tentou fortemente entregar também o Jardim Botânico. Foi em 2017, quando ele extinguiu a Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, entre outras fundações, demitindo os servidores. Também se empenhou muito para que fosse firmado um “acordo” com uma grande empresa da construção civil, que pretendia derrubar parte da cobertura vegetal, nos quatro cantos do parque, para erguer quatro prédios. Ou seja, o “miolo” do parque seria preservado e transformado num jardim privado daquelas pessoas, na certa bastante privilegiadas financeiramente, que adquirissem unidades nas construções. Felizmente a Justiça acolheu pedido do Ministério Público Estadual e manteve a área intocada, como um museu vivo e de patrimônio público inalienável e indivisível.

O grande crime das nossas amigas árvores parece ser o do fornecimento de oxigênio, sombra, frutos e tantos outros produtos. Talvez também o de embelezar as nossas vidas, além de garanti-las.

11.10.2023

P.S.: Hoje teremos mais uma vez aqui no blog a sessão anexa, logo após as chamadas para doações e antes do bônus. São duas pequenas propostas de reflexão.

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O tronco da sequoia abatida
A árvore era gigantesca

ALGUMAS COISAS PARA SE PENSAR (06)

  1. A professora Ana Paula Giocondo, que leciona história no Colégio Cívico Militar Marquês de Caravelas, na cidade paranaense de Arapongas, fez um trabalho com seus alunos exaltando o nazismo. Expos a figura de Hitler na escola e fez com que os pequenos representassem o papel de soldados alemães. Depois, os levou para entrevistar a filha de um nazista que reside por lá. Isso está nas redes sociais e recebeu curtida do Núcleo Regional de Educação de Apucarana. É isso que nós queremos para nossos filhos? É essa a “escola sem partido” defendida pela direita?
  2. Para quem não sabe, os metrôs de Nova York, Barcelona, Paris, Londres, Berlim, Madrid, Amsterdam, Munique, Bruxelas e Istambul são TODOS estatais. Por sua vez, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), afirma que o melhor modelo é o privado e quer vender o existente na capital paulista. Prometo que ainda irei escrever, aqui no blogue, sobre a expressão “Joãozinho do passo certo”.

O bônus de hoje é o áudio de Saga da Amazônia, de Vital Farias. Esta música está no álbum Cantoria, que foi agravado ao vivo em 1984. Dele participam também Geraldo Azevedo, Elomar e Xangai, todos com uma forte cultura regional brasileira.

PORTO ALEGRE NÃO MERECE ESSA DUPLA

Prometo a vocês que irei me conter e não chamarei o ex-vereador Alexandre Bobadra e o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, de boçais, mesmo ambos merecendo isso. Na verdade, nem preciso fazer tal coisa, uma vez que o Brasil todo se encarregou de formar essa opinião que, infelizmente, respingou também na população da cidade. Culpa se tem em parte, na medida em que ambos receberam votos que depois permitiram que atuassem da maneira como estiveram e estão atuando.

O primeiro é formado em Direito pela Unisinos, atuando como policial penal antes de ingressar na carreira política. Foi eleito vereador pelo PL em 2020, quando recebeu 4.703 votos, o que corresponde a um percentual de 0,33% dos 1.409.351 habitantes da Capital. Desde sua posse ele protocolou nada menos do que 363 propostas, o que aparenta um trabalho bastante profícuo. Mas apenas aparenta, uma vez que nenhuma delas se tratava de alguma questão social, de melhoria da cidade e dos seus moradores. Foram, por exemplo, 220 sugestões de criação de datas comemorativas, uma das quais o transformou em alguém conhecido em todo o país, dias atrás, ao ser aceita e transformada em Lei: o Dia Municipal do Patriota, como seria chamado o 8 de janeiro.

Vejam que se todas fossem adotadas, 60,27% de todos os dias do ano seriam lembrados em efemérides por ele propostas. E o ridículo iria além de dedicar a “patriotas” a data que sempre será lembrada pela invasão e a depredação das sedes dos Três Poderes, em Brasília, como parte integrante de uma tentativa de golpe contra a democracia. Ele sugeriu também coisas como os dias municipais do Milk Shake, da Luz, do Carinho, do Conservadorismo, da Bondade e do Halawi Libanês. Foi necessário pesquisar o que seria esse último, quando descobri que se trata de um doce da culinária árabe. Já o milk shake é uma bebida espessa, doce e gelada, que quando surgiu nos EUA, em 1885, levava também whisky na sua fórmula, não sendo nada inocente. Assim como o Bobadra.

Também era grande a preocupação do ex-vereador com homenagens e manifestações de apoio ou repúdio. No primeiro bloco, garantiu distinção com a Comenda Porto do Sol para Eduardo Bolsonaro, seu colega de sigla e de ideais, e ainda com o título de Cidadão de Porto Alegre para o ex-ministro do governo anterior, Onyx Lorenzoni. Na segunda relação, se solidarizou com as autoridades e familiares das vítimas do “implacável terremoto que atingiu a região central da Turquia e o norte da Síria”. Bairros da sua cidade, onde moradores sofrem com falta de saneamento, habitação, melhor transporte coletivo e atendimento digno nas áreas de saúde e educação, não foram incluídos nas suas aflições. Essas ele reservou para si mesmo, quando foi cassado no dia 15 deste mês de agosto, por decisão do Tribunal Eleitoral do Rio Grande do Sul, devido ao comprovado abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação, durante a sua campanha.

A proposta de criação do Dia Municipal do Patriota, em Porto Alegre, foi examinada por comissões da Casa e levada para sanção do prefeito Sebastião Melo (MDB), sem a necessidade de passar pelo plenário. Isso foi ainda no mês de junho. Esse, por sua vez, se fez leitão para mamar deitado. Optou pelo silêncio quando poderia ter vetado, torcendo pela aprovação da lei com a qual obviamente concordava, mas sem que colocar o seu nome no documento da sanção, para evitar ser alvo de críticas: a chamada “aprovação tácita”. Não deu certo. Mesmo que a promulgação tenha sido feita pelo presidente da Câmara, Hamilton Sossmeier, do PTB – outro que também concordava com ela –, Melo não foi poupado de duras críticas por ninguém. Tudo virou um verdadeiro escândalo nacional, com divulgação em noticiários de todas as grandes redes de televisão. E se transformou também em chacota.

As consequências, entretanto, poderão ser muito maiores do que o debochado ex-vereador imaginava. Já chegou à CPMI que trata dos atos golpistas de 8 de janeiro documento detalhando as conexões do agora ex-parlamentar com os acampamentos que foram mantidos em frente a estruturas militares. Também estão agora buscando comprovação de que ele participara da organização e mesmo do financiamento do que ocorreu naquele dia fatídico. E a Procuradoria-Geral da República está sugerindo providências ao Supremo Tribunal Federal, no sentido de declarar inconstitucional tal lei, bem como de investigar as circunstâncias que a motivaram. Ou seja, é bem provável que Bobadra venha a conhecer de perto a mão pesada de seu xará, Alexandre de Moraes.

Sebastião Melo, que já trabalha e articula apoios para sua reeleição, nada de braçada no ninho da extrema-direita, mas tenta ainda manter votos do outro lado do balcão, onde ele esteve no início de sua trajetória. Por causa deste segundo grupo, mantém cautela e busca parecer neutro. Mas, hoje em dia, está muito mais para Praça da Encol do que Humaitá, Vila Nova ou Restinga. E se não tem aqui o apoio do agronegócio, sobra o querer bem de outros empresários que têm sido muito agradecidos por ele. Bobadra ainda estivesse na Câmara e poderia fazer um agradinho ao chefe do Executivo, propondo um Dia da Especulação Imobiliária. O que seria sancionado mais rápido e diretamente.

1º.09.2023

Notas explicativas: (1) O blog esteve com problemas técnicos um tanto inexplicáveis, que não permitiam a publicação de textos, desde 24 de agosto. Agora, na retomada – ainda em caráter precário –, essa primeira postagem foi mantida com a data na qual deveria ter sido originalmente colocada à disposição dos leitores. (2) Durante este período de “silêncio” a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, por livre e espontânea pressão, revogou a lei do Dia do Patriota. O texto que propunha a revogação, da vereadora Karen Santos (PSOL), passou por três comissões da Casa em apenas três horas, quando a média de projetos semelhantes fica em 45 dias. A votação, com 31 votos favoráveis e uma abstenção, foi feita em exatos um minuto e 54 segundos. E o prefeito Sebastião Melo sancionou a revogação em menos de 24 horas. Tal celeridade deveria valer para todos os projetos de real interesse da comunidade porto-alegrense, mas infelizmente isso não acontece.

O cartunista Iotti sugeriu que Porto Alegre tivesse também um Monumento ao Patriota

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O bônus de hoje é com o grupo Calcinha Preta: a música Você Não Vale Nada, Mas Eu Gosto de Você. Essa é uma banda de forró eletrônico, de Aracaju, a capital sergipana. Acesso ao áudio, logo abaixo.

Você Não Vale Nada Mas Eu Gosto de Você – Calcinha Preta