HISTÓRIAS DE DOIS HOMENS PRESOS

Ele estava com 72 anos quando começou a cumprir a pena de prisão a que fora condenado. Se entregou sem alarde, sem resistência e jamais aceitou a proposta de se considerar culpado em troca de redução da sua pena ou de algumas regalias. Ficou 580 dias recluso. Ao longo desse tempo perdeu familiares, como um irmão e um neto de sete anos de idade. Aguentou tudo e cresceu ainda mais como figura humana e líder político. Saiu inocentado, quando ficou provado que o agora ex-juiz que o condenara cometera toda espécie de arbítrio e irregularidades ao longo do processo. Tinha ocorrido um conluio vergonhoso com procuradores e uma frase, dita por um deles, escancarou que a real motivação de tudo era impedir que ele concorresse em uma eleição na qual era favorito. “Não temos prova, mas temos convicção”, virou a comprovação de todo o absurdo.

O outro foi para a prisão com 70 anos de idade. Apesar de sempre ter dito e se orgulhado de um suposto “histórico de atleta”, de uma saúde de ferro que não requeria sequer vacinas, cada vez que sentia risco de ser detido, corria para o hospital mais próximo. Os seus intestinos paravam de funcionar. Literalmente, demonstrava ter o rabo preso. A alegação é que isso não se tratava de medo, mas do fato de alguns anos antes ter sido esfaqueado no abdômen – o único caso visto em toda a história de alguém perfurado brutalmente sem perder uma única gota de sangue. Aliás, ninguém questionou o fato de que naquela internação foi operado não por um gastrocirurgião e sim por um cirurgião oncológico, como se o procedimento fosse para outro fim e já estivesse previamente marcado. De qualquer forma, é paradoxal um cagão com o intestino preso.

Antes de ser preso, o primeiro homem teve uma condução coercitiva da qual a imprensa foi avisada com antecedência, num show cujo roteiro foi escrito por aquele mesmo ex-juiz. E inúmeras fases do processo tiveram momentos teatrais, espetaculares, midiáticos. O segundo, sempre foi tratado com uma dignidade que a história vai mostrar que ele não merecia. A ampla defesa esteve permanentemente assegurada, de tal forma que demorou muito mais do que o desejado por seus opositores para ele ser enfim alcançado pela justiça. O que acabou acontecendo – e olha que ainda existem outros processos em andamento –, por tentativa de golpe de estado e outros crimes correlatos. Até este sábado ele estava em prisão domiciliar, usando tornozeleira eletrônica, mesmo tendo sido condenado a mais de 27 anos de prisão. O STF estava esperando que todas as possibilidades de recurso fossem esgotadas, para que se iniciasse o cumprimento da pena em regime fechado. E agora, quando se fez necessário ele ser recolhido para ser evitada uma fuga, fizeram isso com discrição e todo um respeitoso cuidado. 

Durante a madrugada, o Sistema de Monitoração da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal recebeu um alerta indicando violação da tornozeleira. Somando a isso, um dos filhos do preso havia convocado simpatizantes para uma vigília na frente da mansão onde o pai se mantinha, cercado de regalias, a partir deste final de semana. O pedido era para orações, em defesa do criminoso. Não se sabe se o mundo espiritual estaria representado por parte dos mais de 400 mil desencarnados que foram vitimados pela irresponsabilidade do seu “papi”, que se recusou a comprar em tempo hábil as vacinas que os salvariam. Sobre o ato convocado, há suspeitas de que o aglomerado possibilitasse seu deslocamento até uma embaixada que fica muito próxima. Confirmado número razoável de pessoas, seria quase impossível uma ação policial.

Esses dois fatos vistos conjuntamente, assim como exemplos recentes de dois dos outros condenados do mesmo grupo político, que fugiram do país – uma está na Itália, um nos EUA –, foi decidido que ele seria de imediato transferido para uma cela na Superintendência da Polícia Federal. Aliados passaram a jurar ser tudo uma armação, que ele não havia violado a tornozeleira. Acabaram desmentidos não apenas pela perícia feita no dispositivo, como também pelo próprio autor da façanha. Ele admitiu ter usado um ferro de soldar, na tentativa de se ver livre do artefato que lhe ornamenta uma das canelas que evitasse isso.

Agora, o que se espera para os próximos dias é um embate entre um grupo que tentará novamente emplacar um inaceitável projeto de anistia. Ou, na pior das hipóteses, discutir a dosimetria das penas aplicadas aos envolvidos na tentativa de golpe. Isso além do recurso de usar a mídia de modo exaustivo – e muito mais as redes sociais – para apresentar outra vez esse segundo homem como uma pobre vítima. Como alguém muito doente, que precisa ser protegido e não pagar por nenhum dos seus inúmeros crimes. Esses não querem ou não conseguem ver que doente mesmo ficou foi o país, a partir de sua ascensão ao poder. E, do outro lado, estará todo o sistema de justiça e a maioria do povo brasileiro. Se o primeiro homem acabou engrandecido, esse segundo só faz diminuir o seu tamanho naturalmente minúsculo.

23.11.2025

O bônus de hoje faz uso do humor para encarar a vergonha que tem sido a história recente do Brasil. Começa com um gif que mostra, em verdadeiro “furo de reportagem”, um preso tentando se desvencilhar da tornozeleira eletrônica. Depois temos uma esquete feita pelo grupo Porta dos Fundos, logo após a condenação do ex-presidente por tentativa de golpe de estado.

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