PARA ENTENDER O QUE OCORRE NA VENEZUELA

Precisamos começar pensando em duas coisas. A primeira é que a grande dádiva e maior de todas as maldições venezuelanas está no fato de o país possuir, em seu território, as maiores reservas de petróleo de todo o planeta. Para se ter ideia das suas dimensões, enquanto os Estados Unidos têm 36,5 bilhões de barris, o Iraque 142,5 e a Arábia Saudita 266,5, o nosso vizinho tem 300,9. Adivinhem então quem gostaria de ter assegurado acesso irrestrito à riqueza que isso gera. Além da enorme quantidade, a proximidade levaria o óleo para ser utilizado por quem mais o consome no mundo, com menor custo de transporte do que para trazer o produzido pelos sauditas, por exemplo. São estratosféricos os valores em jogo.

A segunda situação que deve levar a um questionamento é o fato de que a oposição política ao atual governo eleito na Venezuela – que já havia feito um acordo de entrega do controle da petrolífera nacional para a Chevron estadunidense, antes do pleito –, mesmo declarando que houve fraude nas eleições presidenciais de dias atrás, não apresentou provas e não entrou com nenhum recurso oficialmente. Ficou no discurso, no denuncismo e aguardando receber apoio internacional para a sua narrativa. Algo como se viu e vê no Brasil, quando a extrema-direita questiona a confiabilidade das nossas urnas eletrônicas.

Aqui um parêntesis necessário, para o relato de acontecimentos recentes envolvendo a petrolífera Chevron: ela teve uma queda violenta nos lucros ao final do segundo trimestre deste ano, com o esgotamento dos seus campos na Califórnia. E agora está buscando recuperar isso investido na Guiana que – adivinhem – é vizinha da Venezuela. Além disso, tão logo os EUA decidiram reconhecer como vitorioso nas urnas o candidato González Urrutia, reeditando exatamente aquilo que haviam feito em 2019 com o autoproclamado Juan Guaidó, as ações da Chevron tiveram um ganho significativo. E temos um outro detalhe a considerar, que você não irá ficar sabendo através dos noticiários das redes de TV brasileiras: Urrutia, que subitamente se tornou um democrata, na década de 1980 era um integrante da chamada Operação Condor, em El Salvador, sob o comando da CIA. Seu grupo esteve envolvido em tortura e assassinatos que foram praticados em favor da intervenção norte-americana. Como exemplo, esquadrões da morte eliminavam fisicamente religiosos católicos que ousavam buscar uma solução pacífica e negociada para a guerra civil, o que lhes rendeu o apelido de “Mata Curas” (Mata Padres).

Nicolás Maduro está longe de ser o líder ideal para o país. Tem arroubos que não combinam com quem precisa dirigir uma nação sob constante ameaça e forte tensão social. Nunca poderia ser enquadrado na categoria de estadista. Mas, é inegável se tratar de um líder nacionalista, que é contra o entreguismo e gostaria de ver a riqueza que o petróleo traz ser bem dividida. O que tem sido dificultado pela ação de uma elite que se formou e se mantém pela desigualdade, bem como pelas sanções que os EUA impõem. Durante muitas décadas a Venezuela viveu a cômoda situação de poder comprar tudo no exterior, usando os imensos recursos que o petróleo gerava. Deste modo, em zona de conforto, não se industrializou e ficou altamente dependente. O que agora a estrangula, porque mesmo tendo reservas necessárias para tanto, não consegue suprir suas necessidades devido ao embargo.

Imagine que você recebe seu salário e vai ao supermercado comprar aquilo que sua família necessita para sobreviver. Os produtos estão todos nas prateleiras e você tem como pagar por eles. Mas, o proprietário do estabelecimento diz que para você não pode ou não quer vender. Será justo você ser acusado como responsável pelo sofrimento causado aos seus familiares, pela carência artificial forjada por terceiros? Agora, o cinismo é tanto que as sanções impostas pelos Estados Unidos só foram parcialmente aliviadas no começo da guerra entre Rússia e Ucrânia. O que ocorreu porque eles precisaram aumentar as suas importações de petróleo, sendo conveniente “sorrir” para a Venezuela.

A política, especialmente a internacional, sempre esteve atrelada aos interesses econômicos. São esses últimos que, na verdade, determinam o cenário onde a primeira se desenrola. Então, só mesmo fatores como ingenuidade extrema ou vantagem com a situação – vá que você tenha negócios em vista – podem explicar a aceitação do relato de que houve roubo no pleito venezuelano. Quanto ao que acontece nas ruas por lá, se torna muito fácil fomentar os protestos e também supervalorizar o que de fato ocorre, com notícias cuidadosamente selecionadas.

05.08.2024

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O bônus de hoje é uma apresentação do músico, cantor e compositor venezuelano Rafael Brito, conhecido pelo nome artístico de Pollo Brito. Ele e o grupo Billo Caracas Boys nos oferecem um pout pourri ao qual deram o nome de Homenaje a Billo Frómeta, sendo de autoria de Luis Maria Frómeta Pereira. Billo (1915-1988) foi um maestro, arranjador e compositor nascido na República Dominicana, que viveu e faleceu em Caracas, onde sempre foi muito admirado.