MATOU O GARI E FOI MALHAR

O empresário Renê da Silva Nogueira Júnior, de 46 anos, matou com um tiro o gari Laudemir de Souza Fernandes, dois anos mais moço do que ele, na manhã desta segunda-feira, 11 de agosto. O fato ocorreu em rua do bairro Vista Alegre, na região oeste de Belo Horizonte. Após o crime, ele voltou a embarcar no seu carro elétrico BYD, de onde descera para efetuar o disparo, e seguiu para uma academia de luxo no bairro Estoril, para malhar. Ainda estava nela horas depois, quando foi preso.

Um motivo banal teria sido o estopim para o assassinato. Renê, segundo várias testemunhas, exigiu da condutora do caminhão do lixo que abrisse caminho para ele passar. A mulher mostrou que existia espaço suficiente para ele, que não teria gostado e dito que se arranhasse o carro atiraria nela. Os garis intervieram, pedindo que ele se acalmasse. Mas, o efeito foi contrário e o homem desceu disparando contra os trabalhadores. A arma utilizada era da sua esposa, a delegada de polícia Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, que está lotada na Casa da Mulher Mineira, unidade policial inaugurada em março de 2022 para acolher vítimas de violência doméstica, familiar e sexual.

Renê tem um perfil em rede social, com quase 30 mil seguidores. Nele se apresenta em inglês, como christian, husband, father & patriot (cristão, marido, pai e patriota). No que se refere à profissão, se intitula CEO da empresa Fictor Alimentos, que em nota tratou rapidamente de negar isso, dizendo que ele era apenas um prestador de serviços e muito recente, cerca de duas semanas. Laudemir era casado e tinha uma filha. Para a terceirizada Localix Serviços Ambientais, atuava há sete anos como gari. Segundo seus patrões e colegas, era um homem pacato, comprometido, alegre e amigo de todos. Nunca faltava ao serviço, o que obviamente não conseguiu manter nesta terça-feira, 12 agosto.

A Polícia Militar, depois de deter o assassino, o encaminhou para prestar depoimento na Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), onde advogados o acompanharam. A vítima fora antes conduzida para o Hospital Santa Rita, em Contagem, mas não resistiu ao ferimento. Estava com uma perfuração de entrada no tórax, entre costelas. E a delegada Ana Paula, que não estava no veículo quando do incidente, se tornou alvo de investigação da Corregedoria, estando confirmados procedimento disciplinar e abertura de inquérito para apurar sua conduta.

Este caso, no entanto, não pode ser considerado com um fato isolado. Basta se analisar ambas as figuras, do criminoso e da vítima. É o homem branco e de classe mais favorecida social e economicamente sendo o algoz de um pardo e talvez periférico. O que entende estar acima da lei e aquele outro que a qualquer momento pode estar ao alcance dela. O costume de se dar valores diferentes à vida, o que se vê e se repete à exaustão em nosso país e não apenas nele. Em 2003 o filósofo camaronês Achille Mbembe, professor na Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, publicou um ensaio que se tornou célebre. Nele, se dedicava à tarefa de examinar como governos administram a morte. E ao resultado deu o nome de necropolítica. Esse tem tudo para ser mais um exemplo prático disso, com o desenrolar dos acontecimentos.

Um filme brasileiro de 1969, dirigido por Júlio Bressane, foca na absurda banalização da morte. Em Matou a Família e Foi ao Cinema – com Renata Sorrah e Carlos Eduardo Dolabella no seu elenco – um rapaz da classe média mata pai e mãe a navalhadas e vai assistir um filme no qual homem mata a esposa supostamente por amor. Também são mostradas duas mulheres que mantêm relacionamento e uma delas mata a própria mãe, que as critica. E um marido mata a esposa porque essa reclama das dificuldades financeiras que enfrentam. Particularmente, o que me apavora é a também banalização de termos como cristão e homem de bem, assim como a exaltação de um patriotismo falso. Os antídotos têm que ser conhecimento, fé raciocinada e justiça. Ou pouco nos restará de humanos.

12.08.2025

Renê da Silva Nogueira Júnior

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