QUILOMBOLAS EM ÁREA NOBRE
Em uma das áreas mais nobres de Porto Alegre, ao lado do Country Club e muito próximo dos shoppings Iguatemi e Bourbon, praticamente na confluência dos bairros Bela Vista e Três Figueiras, existe uma área na qual residem quilombolas há mais de um século. Eles já estavam lá em uma época na qual nada existia nas proximidades: tudo era apenas um descampado sem outras habitações nem comércio por perto. Mas, o tempo passou e a valorização territorial foi imensa. Uma pesquisa breve teve como referência valor superior a R$ 26 mil o metro quadrado, isso para imóveis comprados ainda na planta. Então, como era de se esperar, grandes construtoras passaram a prestar atenção ao local, elaborando projetos imobiliários que lhes renderiam milhões. Mas, isso não sendo surpresa alguma, a própria Prefeitura Municipal está trabalhando com o intuito de “limpar” a área.
Todas as tentativas de negociar com os moradores das construções bem simples que existem, com o acesso se dando através de uma entrada quase nem sequer percebida, um beco na Av. Nilo Peçanha – fica umas três quadras distante do Colégio Anchieta e da Unisinos –, não deram em nada. Enquanto abordados em conjunto, não saia acordo. Então, a administração municipal mudou de tática e começou a promovê-los de unidade em unidade, de forma separada. A estratégia evidente é a de minar a resistência coletiva. Algumas foram adquiridas e demolidas com toda a pressa possível. E a situação foi parar na Justiça.
Na semana passada saiu a decisão que proíbe a continuidade da derrubada das casas. Foi entendido como algo razoável a posse coletiva do Quilombo Vila Kédi e que de fato haveria prejuízos irrecuperáveis se isso tivesse prosseguimento, a partir de acordos isolados. A área está em processo de reconhecimento formal como território, pelo Incra, com acompanhamento do Ministério Público. E este dera parecer favorável ao direito de existir e permanecer o grupo no mesmo local, uma vez que há o vínculo cultural inequívoco e antigo. O documento elaborado afirma que as ações que vêm sendo conduzidas configuram “turbação da posse coletiva, causando degradação das condições de vida e comprometendo a integridade da comunidade.” A prefeitura promete recorrer.
Tão logo eu soube da notícia, recordei o excelente filme Aquarius (2016), do diretor Kleber Mendonça Filho, que foi estrelado por Sônia Braga. Ela faz o papel de Clara, uma jornalista aposentada que vive em um pequeno edifício que tem esse nome e fica na beira de uma praia, no Recife. Os demais moradores vão vendendo suas unidades para uma construtora interessada, mas ela se recusa a fazer isso. Termina sendo a única moradora remanescente. No seu entender, o apartamento não se trata apenas do local que ocupa há tantos anos: ele está impregnado das memórias de uma vida inteira, sendo muito mais do que uma estrutura física.
Como forma de pressão, a empresa começa a fazer serviços que não são necessários, promove festas nos outros apartamentos, busca vencer a resistência até mesmo “plantando” colônias de cupins no local. O filme, que valorizou bom número de atores e atrizes locais, foi muito aplaudido pelo público e bem recebido pela crítica nacional e internacional. Mesmo não tendo conseguido integrar a seleção do Oscar, participou de vários festivais e ganhou premiação em alguns deles. Como o de Sydney, na Austrália; Mar del Plata, na Argentina; o Transatlantyk, na Polônia; além dos realizados no Panamá e em Cuba. Foi ainda finalista em Cannes, na França, e integrou a mostra competitiva do Festival de Nova Iorque.
05.11.2025


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Faça uma doaçãoDoar mensalmenteDoar anualmenteO bônus de hoje começa com o trailer do filme Aquarius. Depois, fica a escolha de uma das músicas que compõem a sua trilha sonora, que é eclética e marcante. Ela mescla sucessos do rock internacional, como “Another One Bites the Dust”, do Queen, e “Hoje“, de Taiguara (aquela que decidi disponibilizar), com canções regionais e de artistas populares. Outras incluídas são “Sentimental Demais”, de Altemar Dutra; “O Quintal do Vizinho”, de Roberto Carlos; “Toda Menina Baiana”, de Gilberto Gil; e “Meu Som é Pau”, de Aviões do Forró. Isso tudo além de composições de Heitor Villa-Lobos e Maria Bethânia.