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O PÃO QUE O DIABO AMASSOU

Não me consta que o Diabo tenha qualquer profissão, muito menos a de padeiro, talvez aquela que mais representa simbolicamente o cuidado que se precisa ter com a nutrição do nosso corpo físico. Aliás, vejam que mesmo o Pai Nosso – a mais básica das orações cristãs – de certa forma valoriza esse aspecto material da subsistência, ao pedir pelo “pão nosso de cada dia”. Em função disso, sempre fiquei muito curioso quando alguém atribuía ao “vermelhinho” estar, em algum momento, amassando esse alimento em seu preparo. A ele não deveria preocupar de modo algum que alimentássemos nem o corpo nem o espírito, que são duas providências igualmente fundamentais para a vida.

Sei que esta expressão, “comer o pão que o Diabo amassou”, nasceu em Portugal, assim como boa parte dos meus antepassados. E que significa passar por dificuldades extremas, por provações. Talvez porque o “tinhoso”, se de fato fosse fazer este alimento, utilizasse propositalmente ingredientes inadequados e indigestos. Afinal, demônio que se preza gosta mesmo de ver todo mundo se dando mal. É mais sádico do que o próprio Marquês que deu nome a este prazer de ver os outros sofrendo.

Menos preocupante, pelo menos em termos de companhia, é um outro ditado popular que possui significado semelhante: cortar um dobrado. Quanto à origem, essa tem mais de uma explicação. Uma bem plausível parte do entendimento que a palavra “dobrado” é uma degenerescência de “dobrão”, que seria uma moeda de ouro com dois escudos. Ela pesava 6,766 gramas e tinha 22 quilates de ouro. Era luso-brasileira e circulou durante o reinado de Dom João V, sendo a maior de valor intrínseco que já circulou em todo o mundo. Cortar uma ao meio, pelo tamanho e dureza do material, seria mesmo uma tarefa ingrata.

A produção de pães surgiu praticamente junto com a agricultura, pelo menos uns 12 mil anos atrás. E nos primórdios devem ter sido feitos com cevada, uma vez que esse foi o primeiro cereal plantado pelo homem. No início eles eram muito secos e duros, uma vez que resultavam apenas da adição de um pouco de água nos grãos moídos, que ficavam expostos até que secassem naturalmente. Eles passaram a ser cozidos quando inventaram a cerâmica, 3.000 a.C. E coube aos egípcios, em 1.800 a.C. dar um jeito de os fazer mais macios. Isso foi feito pela observação de que a massa umedecida liberava gases e ficava porosa. Então, ao ser misturada uma parte desta com outra fresca, toda ela fermentava. Com o controle deste processo o alimento ficou levedado, uma técnica que até hoje é utilizada.

Na Mesopotâmia passaram a utilizar fornos mais apropriados, além de fazer uso de diversos tipos de grãos misturados. Já os gregos, esses atribuíam aos deuses – como faziam com tudo – a sua origem, o que deu ao pão um caráter sagrado. Isso ocorre obviamente também com os cristãos, na medida em que se assegura ter Jesus multiplicado esse alimento quando insuficiente para atender o número de pessoas que dele necessitavam. O que ensina sobretudo a generosidade da partilha. Para os judeus, no entanto, o fermento é relacionado com corrupção e com impureza. Por isso, eles só oferecem a Deus pães ázimos – matzá, em hebraico. Esse é o pão que consomem na Páscoa, por exemplo, época na qual são proibidos quaisquer alimentos fermentados.

Hoje existem dezenas de tipos diferentes de pães, atendendo os mais variados gostos e necessidades nutricionais. As farinhas são diversas, como trigo, centeio, cevada e milho. Eles podem receber diversos grãos para aumentar a crocância e a digestibilidade. São todos fonte primordial de energia e disposição, apesar de ser necessário parcimônia no consumo. O ideal é que sempre se opte por receitas saudáveis e nutritivas, com o uso de farinhas integrais – estas passam por menos processos na sua industrialização, preservando casca e gérmen do cereal, além de não serem submetidas a branqueamentos químicos. Isso posto, quem de nós resiste a um pão quentinho, com manteiga ou geleia e um bom café?

07.08.2024

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Pão e Poesia – Moraes Moreira