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MUITA HIPOCRISIA, POUCA HUMANIDADE

Não se pode aceitar e muito menos desejar a morte violenta de quem quer que seja. O ideal é que todos nós morrêssemos de velho e sem que se tivesse qualquer queda na qualidade de vida, até então. O que seria chegar ao fim mantendo boas condições físicas e lucidez, sem que se tivesse que passar também por doenças. Mas essa não é uma realidade plausível: acidentes climáticos ou por causas humanas, assim como as inúmeras enfermidades, seguirão fazendo suas vítimas. Entretanto, existe uma enorme diferença de como isso é encarado, se fatores como os econômicos e sociais estão envolvidos. Quando os seres humanos são “classificados” a partir de distinções não naturais. Quando as suas vidas adquirem valores diferentes, conforme posição e poder.

Na segunda-feira, 19 de junho, um pequeno submarino turístico foi dado como desaparecido nas águas do Oceano Atlântico, quando fazia viagem até os destroços do Titanic. Cinco pessoas estavam a bordo, entre elas o bilionário britânico Hamish Harding. As demais era o diretor-executivo da empresa proprietária do submarino, a Ocean Gate Expeditions, Stockton Rush; o ex-comandante da Marinha Francesa, Paul-Henri Nargeolet; o empresário paquistanês Shahzada Dawood e seu filho Suleman Dawood. Começou uma gigantesca operação para localização e resgate, que foi desencadeada inicialmente por quatro países, Estados Unidos, Canadá, França e Noruega, mobilizando uma flotilha composta por embarcações e aviões dotados de tecnologias modernas e especializadas.

No aparato tinham robôs controlados remotamente, equipamentos de detecção e de escuta por sonar, entre outros. Os EUA chegaram a enviar seu Sistema Flyaway de Salvamento em Oceano Profundo (FADOSS, segundo sigla em inglês). A urgência se devia ao fato de que, presos no fundo do mar, os ocupantes do Titan teriam oxigênio apenas até a manhã da quinta-feira, 22 de junho. Mas todo o esforço não deu em nada, ao ser comprovado que o submarino implodira devido à pressão do fundo do oceano, provavelmente ainda no dia que sumira, matando todos a bordo. O custo exato deste infelizmente inútil esforço para alcançar o resgate não foi divulgado. Mas estimativas da Associação Nacional de Busca e Resgate, que é norte-americana, asseguram que a marca havia superado com facilidade os US$ 6,5 milhões. Algo como R$ 31 milhões, pela cotação atual.

Quatro dias antes do ocorrido com o Titan, uma traineira de pesca que partira da Líbia em direção à Europa, levando cerca de 750 ocupantes, afundou em Pylos, na Grécia. Na sua maioria eram mulheres e crianças que buscavam refúgio, fugindo de conflitos em seus países de origem. Vinham principalmente do Paquistão, da Síria e do Egito. Segundo relatos, a Guarda-Costeira grega avistou o barco dos refugiados, ainda quando este começava a apresentar problemas. Nenhum auxílio foi prestado e ocorreu o naufrágio. A Organização das Nações Unidas, em manifestação oficial, informa que pelo menos 500 pessoas perderam a vida. Mas esse número não é definitivo, uma vez que se estima em 140 as que foram salvas por outras embarcações, com a soma não batendo.

O número de vítimas fatais é de no mínimo cem vezes maior, comparado com as vidas perdidas no submarino turístico. Entretanto, a cobertura midiática não deu a mesma importância. Nenhum país do mundo tem dado a merecida importância, quando se trata do drama dos refugiados. O mais comum é as fronteiras serem fechadas, os resgatados serem devolvidos. É a hipocrisia vencendo a humanidade. Os dois pesos e duas medidas sendo adotados como critério, a partir do momento em que a vida humana é valorada conforme os bens materiais, o poder simbólico, a relevância social.

Não se precisa aceitar de modo algum ou entender como merecido que Hamish, Paul-Henri, Stockton, Shahzada e Suleman tenham perdido suas vidas. Mesmo que isso tenha se dado após voluntariamente terem pago uma fortuna – US$ 250 mil por passageiro – para a participação em uma aventura perigosa, de enorme risco. Entretanto, aqueles anônimos, que não estavam na traineira para passear, mas buscando justo a sua sobrevivência, deveriam ter recebido mais atenção e ajuda. Não são os primeiros a morrer nessas circunstâncias. E não serão os últimos, caso não se passe a enxergar as dores desses invisíveis com os mesmos olhos, usando as mesmas lentes com as quais se ampliou o drama dos bem nascidos que também morreram no mar. Incrível é que os dois grupos foram vitimados por suas condições financeiras: uns morreram apenas por serem pobres, outros devido ao fato de terem muito dinheiro.

25.06.2023

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