E TRUMP PEDIU PENICO
A expressão “pedir penico”, pelo que pude apreender, é algo tipicamente brasileiro. Assim, preciso explicar para que o que escrevo seja entendido além fronteiras. Ela significa render-se, desistir, pedir arrego, capitular. Pode também apontar para medo perante uma situação difícil de ser enfrentada. Provavelmente surgiu relacionada à ideia de que alguém, ao sentir-se inseguro ou muito ameaçado, necessitaria de um penico para resolver o problema, uma vez que os intestinos são muito sensíveis a determinadas situações. Esse é um objeto muito antigo, um vaso noturno comum nas casas das pessoas, para usos intempestivos, fora de hora. Aliás, eles ficavam sob as camas, geralmente. O que é outro lugar que pode ser simbolicamente associado aos momentos de medo, ao menos na infância.
Donald Trump é um meninão mimado, que deve ter medo como qualquer pessoa, mas sempre tentou esconder isso usando bravatas. Ao menos depois de adulto e protegido por sua enorme fortuna ele em geral age deste modo, sendo um rato que ruge. Hoje os penicos estão em total desuso. Entretanto, se ele tiver um, talvez seja de ouro. O que não muda nada em termos do que acolhe em seu interior. Assim como o que ele exterioriza também tem textura e odor semelhantes ao que é produzido por qualquer vivente.
Eleito presidente dos Estado Unidos, antes mesmo de assumir anunciava que tomaria muitas decisões polêmicas. Depois da posse então tratou de confirmar isso tudo e de ir além do que era esperado. Entre ameaças de invasão do Panamá e da Groenlândia, de compra da faixa de Gaza – algo que nem parece necessário, uma vez que Benjamin Netanyahu promete fazer isso sem pagar –, de anexação do Canadá e outros que tais, Trump apresentou aquela que até agora é a cereja do seu bolo. Mesmo que a receita não agrade nem mesmo a boa parte de seus parceiros do Partido Republicano: o tarifaço.
Alegando que seu país perde muito com as relações comerciais que são mantidas com a quase totalidade dos demais, determinou como partida uma alíquota básica de 10% para todos, sobre tudo o que deles fosse importado. A alegação é que contra os EUA tal alíquota já era aplicada. Ou seja, seria simples reciprocidade. Depois ampliou este percentual, segundo critérios que ninguém da Casa Branca soube explicar. Algo como levar em conta o déficit comercial em relação aos outros. E se voltou especialmente contra a China. Só que começaram as retaliações.
Ele não considerou, por exemplo, que muitos destes déficits comerciais existem por razões que vão muito além de tarifas. Podem ser devido a facilidades e relações de custo-benefício. Como comprar alimentos que sejam produzidos com custo menor em determinadas regiões do mundo. Ou mesmo porque empresas do seu país se instalam em outros para aproveitar uma mão-de-obra mais barata e depois trazem aquilo que fabricam. Assim, em alguns casos esta decisão de agora chega a beirar o ridículo. Como taxar as ilhas Heard e McDonald, no Oceano Índico. Delas, os EUA compram apenas o único produto que eles produzem para vender ao exterior, que é a lã de ovelhas. Os locais têm pouquíssima presença humana, sendo habitados em muito maior número por focas, pinguins e aves.
Mas, eu falava em retaliação. A Europa reduziu drasticamente a compra de produtos estadunidenses. O Canadá deflagrou uma campanha aberta para que a sua população não compre nada produzido pelos vizinhos do sul. E a China, essa devolveu as taxações que recebia. Passou de 125% de lado a lado, o que simplesmente inviabiliza o comércio entre os dois. Daí, sentindo que perdera a mão na sua proposta, o bravateiro tratou de oferecer a suspensão das medidas para alguns dos atingidos e por prazo determinado, para que se estabelecessem negociações. E disse que estava disposto a conversar com os chineses, se eles pedissem. Houve silêncio absoluto do outro lado: ficou falando sozinho. Com a economia interna sofrendo impactos que não havia considerado, terminou solicitando ele mesmo reuniões. O que foi aceito, mas com um comunicado oficial sobre quem de fato desistira da unilateralidade. Começaram a dialogar no último final de semana e já surgiram os primeiros frutos disso.
Trump esqueceu a capacidade histórica dos chineses se reinventarem e a sua incomparável resiliência. Haveria sim dificuldades em ambos os lados, mas a China as enfrentaria com muito mais facilidade. Aquela nação toda foi construída através da força de adaptação, do crescimento em plena adversidade, da energia coletiva. É assim desde a sua base filosófica e das práticas do budismo, taoísmo e confucionismo. Isso foi fundamental para a cultura e a sociedade chinesas ao longo de séculos. O que teve depois o aporte da vivência do socialismo. Ou seja, se trata do oposto do individualismo pregado e valorizado no Ocidente. E não será derrotada pela força, muito menos pela fanfarrice. Aí é que entra o penico.
15.05.2025
P.S.: A China, que os mal informados e os mal intencionados gritam a plenos pulmões ser “comunista”, é o resultado da implementação de um sistema econômico próprio, que se aglutina o socialismo (planejamento estatal) com a economia de mercado. Foi assim que se tornou fortíssima e pujante. Aliás, esta fusão a está tornando a maior potência do planeta. E chegará a esse objetivo, quer queiram ou não os EUA.

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