Um filme feito na Romênia e lançado em 2021 é uma boa pedida para que se discuta a questão da existência ou não do livre-arbítrio. Ele conta a história de Ecaterina Ivanovici, uma professora de religião que dá aulas para o ensino médio, sendo também esposa do reverendo da cidade. Na trama ela se envolve com um dos seus alunos, Luliu Rosu, jovem que tem um passado conturbado. Só que a história vai muito além de retratar um relacionamento entre pessoas de idades muito diferentes, entre alguém que está em posição de autoridade em relação ao outro, ou de relação extraconjugal como tantas outras que o cinema mostra. O componente religioso se sobrepõe de maneira decisiva sobre o conflito estabelecido e suas consequências, levando a reflexões que ultrapassam essas outras situações citadas.

Seu marido, de nome Daniel, tem uma postura não apenas conservadora como também é controlador ao ponto de não permitir que a esposa vá a um reencontro de sua turma de ensino médio. Ele chega a repreendê-la por coisas como não estar usando de modo correto um véu na igreja. E a mulher, que tem 40 anos, leva uma vida rotineira e monótona. O ponto máximo de ruptura que ela se permite é fumar escondido, depois de seus exercícios físicos matinais.

O conflito central do filme é desencadeado quando, ao falar sobre livre-arbítrio em uma das suas aulas, Ecaterina é surpreendida pela postura de um dos alunos – no caso, Luliu – que discorda do que ela ensina. Ele defende seu ponto de vista dizendo que não acredita ter Deus dado aos homens essa possibilidade. E ressalta que o Criador estabeleceu várias regras de conduta e que pessoas que possuem religião não estão de modo algum liberadas para tomar suas próprias decisões. Depois da aula ela procura o diretor da escola para saber mais sobre o estudante, que é novato. E fica sabendo que ele residia na Alemanha com sua mãe, mas teria vindo agora viver com sua avó, por não ter se adaptado no outro país.

Em casa, a professora questiona o reverendo durante o jantar, sobre ele acreditar que seguidores de uma religião têm liberdade. Com um longo discurso ele reafirma que sim, mas se trai de certa forma ao final dizendo que aqueles que não escolherem seguir o caminho de Deus não serão salvos. O que, convenhamos, relativiza essa liberdade. No desenrolar da trama começa a ocorrer uma aproximação entre Ecaterina e Luliu, até em função do seu filho Samuel compartilhar tarefas escolares com o novo colega.

A obra é uma coprodução romena/alemã, dirigida por Octav Chelaru, com direção de arte de Julia Negoescu e tendo Malina Manovici, Sergiu Smerea e Alexandru Papadopol nos papéis principais. Seu título original é Balaur (Dragão), com a versão em inglês se chamando A Higher Law (Uma Lei Superior). Ainda não está disponível em português e nem em plataformas de streaming, sendo possível encontrar apenas em cópias postadas no Youtube.

Fora do filme: livre-arbítrio é uma suposta capacidade que todos temos para escolher qualquer coisa e praticar qualquer ação, de acordo com nossa própria vontade, sem nenhum condicionamento prévio. Assim, se opõe ao determinismo. Em termos religiosos, se trata de uma teoria que defende ser nossa “salvação”, ou a salvação de nossa alma, apenas dependente do que praticamos ao longo da vida e não de uma predestinação de ordem divina. Em termos filosóficos, isso é debatido desde a Grécia antiga, pelo menos. E, em tempos modernos, também a psicologia se debruça sobre o tema.

13.01.2025

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