SILVIO LUIZ ERA MUITO MELHOR

Se vocês prestarem bem atenção, revendo algum jogo recente, aquele narrador esportivo que há muito nos apresentavam como o melhor de todos, na televisão, era até um pouco gago. Ou pelo menos tinha – e deve ainda ter, mesmo que agora afastado – algum problema com sua dicção. Isso sem contar que quase entrava em luta verbal com quem estivesse escalado para ser comentarista, ao seu lado, uma vez que parecia pretender exercer ambas as funções ao mesmo tempo. Nada disso acontecia com Silvio Luiz. Esse era preciso, muito divertido, não falava além da conta e democraticamente dividia espaços.

Mesmo sendo muito respeitado no meio, Sylvio Luiz Perez Machado de Souza – essa era a grafia correta e completa do seu nome – com certeza não alcançou nem perto a fama e a fortuna amealhadas por esse outro ao qual fiz referência indireta. Mas, era muito melhor. Eu adorava seus bordões, como aquele que repetia eventualmente, diante de um lance inusitado ou de algo bizarro que via acontecer em campo. Arrisco dizer que esse “pelas barrrrbas do profeta” era o mais diferente entre todos. E ele fazia assim mesmo, com um forte e proposital carregamento na letra “r”, que se arrastava levando consigo a centralidade do texto.

Agora, sem dúvida nenhuma, os bordões que se tornaram uma marca sua, uma verdadeira assinatura nas transmissões, foram aqueles que ele adotou para uso na hora em que um time marcava gol. Começava com “olho no lance” e seguia na sequência com “foi, foi, foi, foi ele” antes de acrescentar o nome do artilheiro. Ou seja, ele se consagrou narrador esportivo sem jamais ter gritado gol. Isso seria simples demais, comum demais para ele, apesar de toda a sua simplicidade como pessoa, como ser humano. Valorizando o trabalho dos colegas que estavam à beira do gramado, na reportagem, costumava perguntar, ao lhes passar a palavra: “o que é que só você viu?

Silvio Luiz foi embora na manhã da quinta-feira, 16 de maio, na mesma São Paulo que o acolhera 89 anos atrás. Velhinho e lúcido. Talvez ele ainda continue a narrar jogos onde atuem Pelé, Maradona, Just Fontaine, Sócrates, Gerd Muller, Johan Cruyff, Di Stefano e outros tantos craques. Vai se divertir muito por lá, ao mesmo tempo em que ele próprio seguirá externando toda a sua felicidade em transmitir as emoções deste que é o maior esporte de todo o mundo. “Acerte o seu aí, que eu arredondo o meu aqui“, dizia ele ao iniciar cada um dos tempos dos jogos. Pois agora terá todo o tempo do mundo.

Incrível é que na véspera e no dia em que Silvio Luiz foi “convocado” para outras paragens, mais dois integrantes do jornalismo esportivo foram chamados. Na noite da quarta, 15 de maio, perdemos o Apolinho, apelido carinhoso de Washington Rodrigues, uma figura carimbada no rádio carioca. No dia seguinte foi a vez de Antero Greco, jornalista da ESPN que teve também passagens destacadas em jornais. Ambos foram vitimados pelo câncer. Silvio foi em decorrência de complicações de um AVC que sofreu durante a transmissão do jogo Palmeiras x Santos, pela decisão do Campeonato Paulista, em abril. A idade, como se vê, não o afastara do seu trabalho e da sua paixão. Que, aliás, se confundiam.

20.05.2024

Sylvio Luiz Perez Machado de Souza

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O SUMIÇO INEXPLICÁVEL DO VOO 19

O fato ficou conhecido assim, com o nome no singular, como se fosse apenas um avião desaparecido. Não foi o que de fato aconteceu: cinco aeronaves Grumman TBF Avenger deixaram a Base Aeronaval de Fort Lauderdale, uma cidade costeira da Flórida, 48 quilômetros ao norte de Miami, na tarde de 5 de dezembro de 1945. Nenhuma retornou. Quatro delas tinham três ocupantes, sendo um piloto, um rádio operador e um artilheiro. Na quinta, eram apenas dois, o piloto e o artilheiro. A tripulação total, portanto, era de 14 homens. Aquele era o penúltimo treinamento antes da formatura dos cadetes – eram 13 deles mais seu líder –, sendo ele a simulação de um ataque com torpedos e o retorno à base.

O comandante da operação era o capitão instrutor Charles Carroll Taylor, um homem com larga experiência na função. A temperatura estava em 18 graus centígrados, céu azul, pouquíssimas nuvens esparsas e ventos moderados de nordeste. Ou seja, condições ideais para o voo. Todos os cinco aviões tinham combustível suficiente para mais de mil e seiscentos quilômetros, muito além do que a distância que iriam percorrer naquele treinamento. O nome Voo 19 significa apenas que outros 18 tinham sido feitos antes. Decolaram exatamente às 14h10min e não havia o menor motivo para se suspeitar de que algo poderia dar errado. Mas deu.

Por volta das 15h15min, após o exercício de bombardeio ter sido feito contra um casco desmantelado de navio, mantido no local para esse fim, os aviões teriam iniciado seu retorno primeiro se dirigindo para o Leste. Então o rádio operador da base em terra ficou esperando contato para confirmar o horário exato da chegada e dar-lhes as instruções de pouso. Mas, as gravações registradas da conversa com o líder da esquadrilha apontam para algo estranho. Taylor começou declarando emergência e informando que todos pareciam estar fora de rumo e não conseguiam ver terra. “Qual sua posição?”, perguntou a torre. A resposta do capitão foi de que não fazia ideia. Então lhes foi ordenado que tomassem o rumo Oeste. “Não sabemos de que lado fica o Oeste. Não temos certeza de nenhuma direção e até o mar parece estar diferente, esquisito”, explicou o capitão.

Na manifestação seguinte, Taylor disse que ambas as bússolas que tinha a bordo estavam inoperantes, tanto a magnética quanto a giroscópica. E foi instruído a tentar manter o sol a bombordo, voando para o Norte. Foi quando entrou na conversa pelo rádio o piloto da marinha, tenente Robert Cox, instrutor de voo sênior que estava voando nas proximidades e não fazia parte da operação. Este tentou em vão dar apoio operacional e as instruções para que a esquadrilha encontrasse caminho de volta. Mesmo com muita estática, os contatos continuaram, apesar de sempre confusos. Isso até às 19h04min, quando sobrou apenas silêncio.

A essa altura um hidroavião modelo PBM Mariner, com tripulação de 13 homens, já se deslocava para o local de onde partira o último contato coerente com os aviões perdidos. Quando este informou a torre que estava se aproximando da posição conhecida do voo 19, deixou de manter contato. E também nunca retornou para a base. As buscas que se seguiram envolveram 248 aviões e 18 navios da marinha. Outros tantos navios mercantes passaram a auxiliar, assim como embarcações de pesquisa. Foram cobertas mais de 200 mil milhas quadradas, o que equivale a 520 mil quilômetros quadrados. Nem um único destroço foi encontrado, dos agora seis aviões perdidos. Nenhum dos corpos dos 27 homens jamais chegou a quaisquer praias da região. E nunca chegou a ser formulada uma hipótese consistente o suficiente para que se tivesse a mais pálida ideia do que aconteceu.

28.04.2024

Aeronaves Grumman TBF Avenger

O bônus de hoje é Medo de Avião, de Belchior com o próprio.