FUTEBOL À ESQUERDA (2)
Conforme prometido em postagem anterior, vamos ver agora um pouco da história de clubes europeus que, através de suas torcidas, com ou sem o apoio das direções, se notabilizaram pela defesa dos ideais de esquerda, de busca de igualdade, respeito às minorias e justiça social.
OLYMPIQUE DE MARSEILLE (FRA)
A cidade de Marselha é portuária e fica no sul da França. Desde sua fundação pelos gregos, em 600 a.C., sempre foi um importante centro comercial e de imigração. O Olympique, que tem cores azul celeste e branca, conta com a torcida mais esquerdista de toda a Europa. Sua principal organizada é a Commando Ultras 84 (CU’84), que se auto define como um grupo “anticapitalista, antirracista e antifascista”. Essas marcas são seu orgulho, com ela jamais se omitindo inclusive em entrar em confrontos físicos com torcedores de equipes identificadas como de extrema-direita, tais como o Paris Saint-Germain (FRA), o Real Madrid (ESP) e a Lazio (ITA).
LIVORNO CALCIO (ITA)
Livorno também é portuária e fica na costa da Toscana. Além de pratos com mariscos, oferece aos visitantes belas fortalezas renascentistas. Foi o berço da fundação do Partido Comunista Italiano, em 1920. E tem uma paixão avassaladora pelo futebol. O Livorno, mesmo sendo apenas um clube de porte médio, que vive como um ioiô entre as duas principais divisões do país, possui uma torcida fanática. É muito comum serem as arquibancadas lugar onde a “Bandiera Rossa” é cantada, uma canção de resistência ao governo fascista de Benito Mussolini. Também a “Bella Ciao” é para eles um hino que os une.
ST. PAULI (ALE)
Este clube cuja tem sua sede no distrito da Luz Vermelha, em Hamburgo, local de intensa vida noturna e mesmo de prostituição naquela cidade da Alemanha. Suas raízes são anarquistas, sendo muito comum faixas nas arquibancadas do Millerntor-Stadion com mensagens anticapitalistas ou mesmo com a suástica nazista destruída. Outra presença constante é a de bandeiras com o arco-íris do movimento LGBTQIA+. Durante oito anos seu presidente foi o homossexual Corny Littman. E, desde os anos 1980, o St. Pauli recusa-se sequer a vender ingressos para pessoas que tenham alguma conexão com o nazifascismo, muito menos aceitá-las como sócias. É normal que a equipe entre em campo ao som de Hells Bells (Sinos do Inferno), do AC/DC.
BORUSSIA DORTMUND (ALE)
Usando camisas vistosas sempre em preto e amarelo, o Borussia tem sua história associada aos sindicatos de trabalhadores da cidade de Dortmund, que fica em região de economia antes muito dependente da extração de carvão – o Criciúma, na região carbonífera de Santa Catarina, tem as mesmas cores. As ideias de esquerda tinham, desta forma, força na comunidade. Um presidente seu, durante a existência do Terceiro Reich, foi deposto por se recusar a ingressar no Partido Nazista. Depois disso, alguns funcionários foram fuzilados por estarem usando as instalações do clube para produzir material de propaganda contra Hitler. Desde o ano de 2011, a direção organiza excursões de torcedores para visitação a antigos campos de concentração, com o objetivo de que todos conheçam os horrores do nazismo. Também promove campanhas por justiça social e por igualdade racial.
RAYO VALLECANO (ESP)
O menor entre os três clubes de Madrid, ocupa a posição mais à esquerda dentro do futebol espanhol. Cresceu junto ao movimento operário e às forças que lutavam contra a ditadura do general Francisco Franco. Dois são os lemas que os Bukaneros, seu principal grupo entre os torcedores organizados, adotam com absoluto rigor: “ame o Rayo, odeie o racismo” e “pequeno no esporte, grande nos valores”. Em 2017 a torcida reagiu contra a contratação do ucraniano Roman Zozulya, por ser racista, com a direção tendo que rescindir o seu contrato. Algo semelhante ao que fizeram recentemente os santistas, que não aceitaram a recontratação de Robinho.
CELTIC (ESC)
Em todo e qualquer jogo do escocês Celtic é bastante comum se ouvir cânticos contra a família real britânica, assim como ver bandeiras da Palestina. Seus torcedores têm forte ligação com os movimentos sociais, são eleitores do Partido Trabalhista e combatem a ideia da existência do Reino Unido, sendo separatistas. No passado, se manifestaram em apoio ao IRA, grupo paramilitar católico como eles também são, que lutava para que a vizinha Irlanda do Norte se anexasse à Irlanda. Seu maior adversário é o Rangers, que é de origem protestante. Contra ele travam um dos clássicos mais explosivos, porque a rivalidade ultrapassa o esporte e acumula ideologia e religião.
OMONIA (CYP)
O futebol praticado no Chipre está longe de ocupar um lugar de destaque entre os grandes da Europa. Mas a torcida do Omonia é conhecida pelo seu radicalismo ideológico. O clube nasceu na década de 1940, justo em resposta ao comportamento de extrema-direita do adversário Apoel Nicósia, quando da Guerra Civil da Grécia. Oito décadas depois, boa parte dos fiéis seguidores que acompanham o time são socialistas e comunistas convictos. No seu estádio, bandeiras da antiga União Soviética e cartazes com o rosto de Che Guevara estão sempre presentes. E frases do movimento Antifa aparecem em faixas exibidas.
BESIKTAS (TUR)
Este clube turco tem importância na complexa engrenagem política do seu país. Em passado recente, sua torcida se tornou uma das forças mais atuantes na resistência contra Recep Tayyip Erdogan, líder da extrema-direita e presidente da Turquia. E não faz isso às escuras: costuma distribuir manifestos entre os frequentadores do estádio, no qual exalta seus valores. É contrário à discriminação religiosa, racial, sexual e de gênero, além de lutar por justiça social, tudo aquilo que o atual governo turco desdenha.
LIVERPOOL (ING)
Mais sutil no seu posicionamento, o Liverpool defende a ideologia de esquerda com certa discrição. Mas tem história ligada ao movimento operário da cidade, sendo sua própria gestão baseada em ideias de coletivo e não de individualidades. Não por acaso, escolhe sempre que possível profissionais alinhados com essa posição. Seus dois mais vitoriosos treinadores da história, o britânico Bill Shankly, entre 1959 e 1974, e o atual Jürgen Klopp, alemão que está no cargo desde 2015, são assumidamente socialistas.
Vários outros clubes ainda poderiam ser citados. Como o AEK Atenas (Grécia); Athletic Bilbao (Espanha); Lokomotiv Sofia (Bulgária); Standard de Liège (Bélgica); Malmö Fotbollförening (Suécia); Bohemians 1905 (República Tcheca) e Red Star FC (França). Mas, na essência, está cumprida a promessa de mostrar que o futebol está longe de ser alienante, como muita gente acredita.
09.07.2023

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Faça uma doaçãoDoar mensalmenteDoar anualmenteO bônus de hoje começa com vídeo de torcedores do Livorno (ITA) ao final de partida do seu time em Padova, no ano de 2019, cantando Bella Ciao. Depois temos uma versão apenas instrumental de Hells Bells (Sinos do Inferno), do AC/DC, canção frequentemente ouvida em jogos do St. Pauli (ALE).