O AVIÃO QUE CAIU POR CAUSA DE UMA VÍRGULA
No dia 3 de setembro de 1989 – 35 anos atrás, portanto – um Boeing 737-200, de prefixo PP-VMK, pertencente à antiga Varig, decolou de Guarulhos, em São Paulo. Seu destino era Belém, capital do Pará. Seis escalas estavam programadas para o percurso, sendo que na de Brasília a tripulação foi trocada. Após sair de Marabá para percorrer o último dos trechos, o avião se perdeu no caminho e terminou caindo na floresta amazônica. Era o Voo 254, sendo que vidas terminaram sendo perdidas em virtude de um erro inicial inacreditável que se somou depois a outros, como sempre ocorre em acidentes aéreos, segundo afirmam especialistas.
Poucos meses antes daquele fato trágico a empresa havia começado a disponibilizar os planos de voo por computador. Neles constavam todas as informações pertinentes, como as frequências de rádio das torres dos aeroportos, dados sobre os controladores de voo, pontos de referência para a navegação e a rota. Até então eram utilizados apenas três dígitos para inserir a orientação do rumo que a aeronave deveria seguir. Devido à computadorização, uma nova casa decimal foi acrescida, passando a existir quatro dígitos. Deste modo se gerou a confusão que depois se mostrou fatal, com a desatenção do piloto: na hora de programar os instrumentos, a rota a ser seguida era a 027,0° e ele, ao não digitar a vírgula, foi “entendido” como tendo determinado 270°. Então, o avião que deveria seguir para o Norte tomou a direção Oeste. E, grosso modo, se pode afirmar que este sinal gráfico de pontuação deu início ao desastre.
A duração normal da viagem seria de cerca de uma hora. Entretanto, o avião voou por mais de três sem que a cidade de destino fosse sequer avistada. Isso levou ao término do combustível e à necessidade de um pouso forçado, em zona de mata ao norte de São José do Xingu, no Mato Grosso. Inacreditável é que a desorientação cartográfica deveria ter ficado evidente logo após ter se passado o tempo estimado do voo, sem que sequer as luzes de Belém fossem avistadas. Mas, o piloto não declarou estar perdido – talvez temendo por sua carreira – e as equipes de terra foram negligentes e também nada fizeram, apesar do atraso significativo. Se uma destas duas pontas ao menos tivesse conversado com a outra haveria tempo suficiente para ser evitado o pior.
O copiloto chegou a buscar sinais de radiofrequência de emissoras, mas só encontrava estática, só ouvia chiados. A escuridão da noite, agravada por uma névoa seca, também não ajudava em nada qualquer visualização. Além disso, não existia na Amazônia o sistema de radares que hoje em dia é mais completo e eficiente. Assim, quando o combustível acabou foi feita uma tentativa de pouso com o menor dano possível, algo que se pode creditar à perícia do piloto, ao acaso ou mesmo à alguma intervenção divina. Isso porque, apesar de toda a situação apontar para a impossibilidade de existirem sobreviventes, entre os 54 passageiros e tripulantes, 25 tiveram apenas ferimentos leves, 17 ferimentos mais graves e 12 morreram no momento ou em decorrência do ocorrido. A espera por resgate, no entanto, durou dois dias. Isso porque as buscas foram direcionadas para local errado, uma vez que parecia absurdo o avião ter se deslocado para um ponto tão distante da rota prevista.
Por muito tempo se acreditou que o fato de estar a Seleção Brasileira jogando naquele dia, contra o Chile, pelas eliminatórias para a Copa do Mundo de 1990, teria sido também um fator a contribuir com o acidente aéreo. Alguém poderia estar ouvindo o jogo e descuidando de suas obrigações. Essa partida, inclusive, ficou marcada por uma série de acontecimentos inusitados (*). A hipótese, no entanto, jamais foi comprovada. Com a investigação feita pelo SIPAER, órgão que agora tem a sigla CENIPA, o relatório final – foi apresentado apenas em 23 de abril de 1991 – apontou erros dos pilotos, como a leitura incorreta de proa pelo comandante, além de falhas dos controladores. As penas de prisão, no entanto, foram todas convertidas em multas e punições alternativas, pelos bons antecedentes.
09.09.2024
(*) Rosenery Mello do Nascimento Barcelos da Silva, que se apresentava como modelo, atirou um sinalizador no gramado do Maracanã e ele caiu próximo do goleiro Rojas. O chileno, aproveitando-se do fato, fingiu ter sido atingido. E fez uso de um bisturi, que não se sabe como chegou às suas mãos, para se ferir e causar a suspensão da partida, que o Brasil vencia por 1×0. Com isso a Conmebol teria que entregar os pontos ao Chile, que se classificaria e deixaria nossa seleção pela primeira vez fora de uma copa. Chegou a ocorrer um incidente diplomático em Santiago, com a embaixada brasileira sendo apedrejada por torcedores. Mas, a farsa acabou sendo desmascarada, Rojas banido do futebol e o Chile terminou excluído das eliminatórias seguintes, para a Copa do Mundo de 1994, como punição.

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Faça uma doaçãoDoar mensalmenteDoar anualmenteO bônus de hoje começa com o áudio da música Avião, de Djavan, que por coincidência foi lançada naquele mesmo ano de 1989. Logo depois temos Avião de Papel, com a cantora e compositora natural de Lisboa, Carolina Deslandes, acompanhada no clipe por Rui Veloso, em violão e voz.