A BOLHA ASSASSINA

O primeiro filme de ficção científica que me lembro de ter assistido foi A Bolha Assassina, ainda durante minha infância. No original o título era apenas The Blob (A Bolha), mas por aqui é raro os muito criativos que são responsáveis pelas versões não acrescentarem algo mais ou até mudarem tudo. Isso para eles é um desafio e quase uma missão. Um dos exemplos mais emblemáticos se deu com The Deer Hunter (O Caçador de Veados) – Oscar de Melhor Filme e de Melhor Diretor em 1979 –, que no Brasil virou simplesmente O Franco Atirador. Mas, o filme que estou referindo hoje era sobre um ser gelatinoso que provavelmente tinha vindo do planeta Marte. Naquela época se imaginava que tudo de ruim que pudesse acontecer com a humanidade deveria vir de lá. Algo assim como os EUA hoje em dia, com a diferença que não se trata de ficção.

Fui dar uma ajudinha para a minha memória e descobri que o tal filme foi lançado em 12 de setembro de 1958, tendo dois diretores: Irvin Yeaworth e Russell Doughten. No papel principal estava Steve McQueen e Aneta Corsaut era a mocinha, pois sempre tinha que existir uma em perigo para ser salva pelo protagonista em algum momento. Depois disso, em 1972, lançaram uma sequência sua: Beware! The Blob (Cuidado! A Bolha). Essa foi dirigida por Larry Hagman, sendo seu primeiro longa. Não se tratava de um remake e sim de uma continuidade ao que havia sido contado no anterior. Desta vez a criatura viscosa ataca um subúrbio de Los Angeles, o que não deixava de ser bom porque assim talvez as suas vítimas fossem na maioria latinos. Nos papéis principais, Robert Walker Jr. e Cindy Girling.

Exatos 30 anos depois da estreia, a substância ressurge no cinema com o mesmo título simplificado de The Blob (A Bolha). A principal diferença é que a narrativa mudou-se para outro ponto da Califórnia. Vejam que esses perigos espaciais nunca pousam em países da América do Sul, talvez para que tenham um adversário à altura. Mas, o ser disforme continua crescendo conforme devora todas as vidas que encontra pela frente. Dirigido por Chuck Russell, tem Kevin Dillon e Shawnee Smith nos papéis principais. Esse adaptado às “exigências” das propostas hollywoodianas recentes, onde nada é produzido sem perseguições, explosões, gritos e o máximo de desespero.

Uma das características do cinema estadunidense é que o inimigo sempre é externo. É bem mais difícil que o perigo seja interno, da sua própria nação, ou um drama psicológico, apontando as contradições humanas que todos nós temos e vivenciamos. Isso, quando abordado, tende a possibilitar obras de melhor qualidade, uma vez que isso seja feito com propriedade, com rigor não apenas técnico. Agora, basta se pensar em tudo aquilo que nos foi imposto desde as nossas infâncias e se percebe, com um mínimo de atenção, que existe método e interesse na situação essa bem mais banal. Nos westerns os bravos conquistadores brancos tinham pela frente os bárbaros peles-vermelhas. E dê-lhe matar todos os índios que fosse possível. Esses só sobreviviam se fossem “domesticados”, como o Tonto, fiel amigo e escudeiro do Zorro dos gibis – que aliás era um herói falso, que foi copiado do Zorro primeiro e verdadeiro, identidade secreta do nobre espanhol Don Diego de La Veja, um combatente das injustiças sociais, espécie de “Robin Hood mexicano”.

Tivemos também inúmeros filmes de guerra nos quais os antagonistas eram invariavelmente alemães ou japoneses. Os de espionagem, nos quais os mocinhos enfrentavam russos e coreanos do norte. Os de ações militares contra povos árabes, sempre fanáticos religiosos e assassinos frios. Se é para combater drogas, os traficantes são latinos. Tem que mostrar miséria? Basta ambientar na África, desconhecendo todos e quaisquer avanços que aquele continente tem alcançado, depois de séculos de dominação colonizadora.

Enfim, sabemos que o cinema também é um instrumento de dominação. Suas mensagens, subliminares ou não, são utilizadas com propósitos que o tornam muito mais do que um produto da indústria cultural. Assim, desde cedo a gente se associa aos heróicos combatentes do mal, sem que se perceba que não raras vezes são eles mesmos os nossos reais adversários ou inimigos. Até mesmo a pobre da bolha faminta se prestou a isso, mesmo sem rosto algum.

19.07.2025

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O bônus de hoje é um vídeo relativamente raro, com a abertura do filme The Blob (A Bolha), de 1958. Depois temos o áudio da música Medo, que está no álbum origem, do Obinrin Trio, que é paulistano e formado por Elis Menezes, Lana Lopes e Raíssa Lopes. Obinrin, na língua iorubá, significa mulher.

Obinrin Trio – Medo