CUIDADO COM OS CACOS

Aqui no Sul do Brasil, mas acredito que no país como um todo, caco é alguma coisa quebrada, um pedaço de algo, um fragmento que se torna sem serventia. Também se tornou uma forma de adjetivar pessoas que teriam pouco ou nenhum valor, um traste, alguém de pouco tino ou juízo duvidoso. Aliás, muitas vezes isso se torna um substantivo, passando a identificar um indivíduo específico, alguém que fez (ou não) por merecer tal apelido. Vira um cognome, um epíteto, uma alcunha – esse último termo sendo mais apropriado para bandidos, o que muitos deles são de fato – que adquire peso de nome próprio.

Como coloquei acima entre parêntesis, há quem caia nessa vala sem merecer, pelo fruto da maldade alheia. Mas, também existem aqueles que parecem cavar para si essa situação, aceitando e mesmo gostando dela – afinal, se tem gente que se vangloria da própria estupidez, porque não existiria também quem ache interessante ser um imprestável? Eu mesmo conheci, ao longo da vida, pessoas que podem perfeitamente ser enquadradas nestas duas possibilidades. Tive pena e emprestei a minha solidariedade aos primeiros; os demais ganharam toda a minha indiferença e eventualmente algum desprezo.

O que me surpreendeu, nos últimos anos, foi a proliferação dos cacos. Como se aquele palerma que eu conheci fosse apenas um precursor, aliás muito insignificante se comparado com a imensa maioria destes de agora. Porque os cacos recentes não ficaram restritos a um pequeno mundo qualquer, no qual tenham surgido e se criado. Agora existe um alcance imensurável com o uso das redes sociais, além de exemplos de “caquices” bem-sucedidas, que são imitadas. Depois que o caco-mor chegou à presidência da República, em 2018, milhões de cacos brotaram dos esgotos, se proliferaram. Os absurdos se tornaram corriqueiros, foram normalizados. Não há mais quem não conheça dezenas de cacos.

Reconhecer um caco é fácil. Todos são rasos, menos do que primários; são simplórios; não aceitam contraditório – talvez por uma percepção inconsciente de que são incapazes de se armar com argumentos –; e geralmente agressivos. Amam de paixão quaisquer inverdades que sirvam para reafirmar as bobagens que dizem ou para render algum benefício político ou financeiro. E aqueles poucos que são articulados, podem acreditar, se tornam ainda mais perigosos para todos, pelo fato de externarem absurdos com a convicção de quem narra verdades absolutas. O que talvez leve em breve o substantivo Marçal se tornar um adjetivo também: “você está bem marçal”, “incrível como você é marçal”.

Entre os cacos específicos, aqueles com grife, já tivemos ministro do Meio Ambiente trabalhando pela devastação de nossas florestas e pelo garimpo ilegal; presidente da Fundação Palmares negando todos os danos causados pela escravidão; ministra da Mulher tentando forçar uma menina de dez anos que foi estuprada a manter a gravidez que colocava em risco sua vida; e um secretário da Cultura que plagiou discurso do ministro da Propaganda Nazista, Joseph Goebbels. Enquanto isso, são cacos genéricos os negros racistas, os homossexuais homofóbicos, os pobres de direita – politicamente falando, essa a excrecência maior –, as mulheres que apoiam abusadores, educadores que defendem as escolas cívico-militares e o homeschooling, artistas que aplaudem quem cortou todo o financiamento antes destinado ao seu próprio setor, e outros que tais.

Talvez no futuro eles, os cacos, se tornem algo como os bichinhos de estimação, com todas as pessoas tendo um para chamar de seu. Agora, se isso vier a acontecer, muitos deles precisarão de coleiras e focinheiras para circular em público. E será bastante recomendável que todos sejam vacinados, mesmo que ser contra vacinas seja uma das suas marcas pessoais relevantes.

20.09.2024

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O bônus de hoje é uma homenagem a quem gostava, assim como eu, de ver os Muppets. Neste programa havia um caco muito simpático, que vai na contramão dos citados no texto: Caco, o Sapo habitou por muito tempo nosso imaginário e nossas TVs. Temos a seguir um clipe dele cantando A Conexão do Arco-Íris, versão em português. Depois há outro clipe, com a turma cantando Bohemian Rhapsody, do Queen, em inglês.