A DESONERAÇÃO DA FOLHA É INCONVENIENTE

A desoneração da folha de pagamentos, apontada por empresários como uma questão primordial para a geração de empregos em nosso país, se tornou assunto repetido nos meios de comunicação, como um mantra. E não se viu ninguém na imprensa buscando números que comprovassem ou desmentissem essa afirmação. O que, a bem da verdade, apenas se trata da repetição do comportamento atual de boa parte de jornalistas profissionais, que parecem ter se esquecido da necessidade de apuração daquilo que chega até as redações, antes da divulgação ser feita para o público. Por exemplo: onde se viu publicado que um estudo do Ipea (*) comprovou que entre 2012 e 2022 esses setores desonerados ao invés de criarem novas vagas as reduziram em 13%? Foram nada menos do que 960 mil postos de trabalho fechados. Raros órgãos de imprensa fizeram isso, mesmo o estudo estando disponível para acesso em qualquer pesquisa simples e rápida, tendo o instituto credibilidade o suficiente para ser citado.

A desoneração começou ainda no ano de 2011, no primeiro governo de Dilma Rousseff, através da Lei 12.546, com seu caráter temporário sendo depois alterado por nada menos do que treze outros atos legais, ao longo do tempo. O seu objetivo inicial era atender especificamente os setores de tecnologia da informação e da comunicação, que enfrentavam problemas sérios para com a concorrência externa e precisavam de capitalização para desenvolvimento. Aos poucos foram sendo incluídos outros setores da economia, sempre em função de lobbies estabelecidos junto aos deputados federais, chegando a 17 no total. Entraram na lista construção civil, confecções e vestuário, proteína animal, fabricantes de veículos e carrocerias, transporte rodoviário de cargas e até coisas bem estranhas, como empresas de call center, esse pessoal que fica ligando para todos nós em momentos mais do que inoportunos, oferecendo todo tipo de serviço.

Desonerar significa liberar da obrigação de um encargo. Neste caso específico, retirar das empresas a necessidade de que contribuam para a manutenção do sistema previdenciário. Mas, isso “quebra” uma das três pernas sobre as quais tal estrutura foi historicamente montada, pois a manutenção do sistema prevê que patrões, empregados e governo se responsabilizem por parcelas. Então, todo o ônus passa a recair sobre apenas dois dos três lados anteriores. Isso acontece porque este sistema diferenciado de contribuição permite que a empresa recolha não mais os 20% tradicionais sobre a folha de pagamentos, mas apenas alíquotas que variam entre 1% e 4,5% da sua receita bruta, o que não é de modo algum a mesma coisa. Cálculos realistas apontam que essa aparente simples alteração reduz em cerca de R$ 18 bilhões o recolhimento final. Assim, faltam recursos para atender justamente a classe trabalhadora, tanto na garantia das aposentadorias futuras como para o financiamento de serviços públicos dos quais ela necessita, uma vez que o governo tem que arcar com valores maiores nos orçamentos e fica com menos para obras de infraestrutura, saúde e educação. O que a desoneração da folha de pagamentos tem conseguido fazer é deslocar recursos públicos para apropriação privada.

A Lei 14.784/23 fixou um novo prazo para a validade dessa benesse desnecessária. Será 31 de dezembro de 2027. Essa medida, além de atender quem dela na verdade não precisa, é também uma forma da oposição “desidratar” o Governo Lula, retirando recursos que lhes são necessários para que as promessas de campanha e a recolocação do país num patamar mais justo de desenvolvimento possam se tornar realidade. Restou ao presidente vetar o projeto, o que gerou impasse e desgaste, outra coisa que agrada à oposição, que esfrega as mãos de contentamento. Ele então foi promulgado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. A saída do Executivo foi a edição de uma medida provisória que prevê a reoneração gradual da folha. Mais do que isso, seu texto limitou compensações tributárias decorrentes de decisões judiciais e retomou a tributação do setor de eventos.

Como os grandes meios de comunicação também estão na relação dos que são beneficiados, o que ocorre é o silêncio determinado ou a notícia propositalmente distorcida. Essa última faz com que uma boa parcela da população, que na verdade é prejudicada com isso, se una aos que lucram de fato, aplaudindo a decisão. O que não é inédito, sendo um recurso que a extrema-direita utiliza com naturalidade e competência em quase todos os temas que defende.

14.01.2024

(*) Ipea é a sigla de Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, uma fundação pública federal vinculada ao Ministério do Planejamento e Orçamento, que foi criada ainda em 1964. Trata-se de uma estrutura de apoio ao Estado, atendendo todos os governos, independente de suas inclinações ideológicas. E tem técnicos de alta competência e prestígio nos seus quadros.

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