MEDALHA DE BRONZE PARA O BRASIL

Nosso país ocupa o terceiro lugar em todo o mundo, em mais um ranking da vergonha. Considerado o ano de 2021, com o último relatório fechado pela organização não-governamental britânica Global Witness, perdemos apenas para o México e para a Colômbia em termos de assassinatos de ativistas, ambientalistas e indigenistas. Por aqui foram 26 os crimes contra a vida, considerando-se apenas os dados oficiais, uma vez que vários desaparecimentos terminam não sendo contabilizados. Isso representa uma morte a cada duas semanas. Entre os mexicanos foram 54, enquanto colombianos atingiram 33 perdas. A divulgação é recente e, nesse caso específico, nossa medalha não deveria ser de bronze, mas de sangue.

A América Latina concentra três quartas partes deste tipo de crime (75% deles), sendo que a maioria ocorreu na região amazônica, não apenas a brasileira, com quatro em cada cinco. Falando outra vez do Brasil, desde 2014 são nada menos do que 342 assassinatos, quase que em sua totalidade cometidos em localidades distantes, abandonadas pelo poder do Estado. No mesmo período, foram 1.733 na soma global, o que dá ao nosso país 19,73% de participação na barbárie.

Ao longo da história, muitos foram os casos emblemáticos. Como o de Chico Mendes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, no Acre, morto a tiros de espingarda na noite de 22 de dezembro de 1988, no quintal de sua casa. Quem puxou o gatilho foi Darcy Alves da Silva, que agiu a mando do seu pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva. Chico fundara a primeira reserva extrativista do Brasil, com 40 mil hectares dedicados, no município de São Luiz do Remanso, distante 80 quilômetros de Rio Branco. Ele fora o único brasileiro a participar, meses antes, de uma reunião de 500 ecologistas de todo o mundo, promovida pela ONU, em Washington, onde foi condecorado. Era tido como um verdadeiro herói na floresta, com seu nome batizando agora o ICM Bio. Em 2005 foi assassinada a missionária e ambientalista norte-americana Dorothy Stang, por intermediar conflitos agrários na região de Anapu, no Pará, outro caso de repercussão internacional.

No dia 25 de julho de 2019 indígenas da etnia Wajãpi, que habita o oeste do Amapá, denunciaram que seu cacique, Emyra Wajãpi, de 68 anos, fora morto a facadas por um grupo de garimpeiros, quando voltava para casa após visitar sua filha. E que esses invadiram e ocuparam parte do território dos indígenas. O inquérito que investigava o fato foi arquivado em dezembro daquele mesmo ano pelo Ministério Público Federal. O MPF fez isso alegando ser o correto, uma vez que a investigação da Polícia Federal havia constatado morte acidental, algo muito estranho para ferimentos com faca.

Ainda naquele mesmo ano, de escuridão sallestina – Ricardo de Aquino Salles era o ministro do Meio Ambiente, que desejava a distração do povo brasileiro para “passar a boiada” –, tivemos mais mortes que foram emblemáticas. Foi o caso do agente da Funai, Maxciel Pereira dos Santos. Ele atuava na base Ituí-Itacoaí, sobre uma balsa, próximo de Atalaia do Norte, no Amazonas. Foi assassinado por seu trabalho de combate ao garimpo e à exploração de madeira, à pesca e à caça, todas atividades ilegais, dentro de área onde existe a maior presença de índios isolados do mundo. Desde o ano anterior, a base da Funai já havia sido atacada outras quatro vezes.

Em 1º de novembro de 2019, Paulino Guajajara foi abatido a tiros na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão. Ele era responsável pela fiscalização e denúncia de invasões na mata, uma espécie de guardião da floresta. Com ele estava Laércio Guajajara, que sobreviveu apesar de baleado nas costas e nos braços, além de outros tiros que o apanharam de raspão. Em 2020 o indígena Ari Uru-Eu-Wau-Wau, que tinha 34 anos, foi encontrado morto ao lado de sua moto, no distrito no município de Jaru, em Rondônia. Ele denunciava extração ilegal de madeira dentro da aldeia de seu povo. No mesmo ano, Original Yanomami, de 24 anos, e Marcos Arokona, com a mesma idade, foram mortos por garimpeiros ilegais, em Alto Alegre, também Rondônia. E ainda tivemos, antes do ano acabar, o assassinato de Raimundo Nonato, uma liderança entre os trabalhadores rurais da região de Junco, no Maranhão.

O casal Reginaldo Alves Barros e Maria da Luz Benício de Sousa, trabalhadores rurais na Gleba Campina, conhecida também como Comunidade Vilela, no município de Junco, no Maranhão, foram outras vítimas. O crime se deu em 18 de junho de 2021. A mulher era ativa em movimentos sociais em defesa do direito à terra, sendo também suplente na direção do seu sindicato. Terrível nesse caso foi que a filha do casal, de apenas três anos de idade, permaneceu deitada sobre o corpo da mãe por várias horas, até a chegada do socorro tardio.

Para concluir, lembro o caso recente do indigenista Bruno Araújo e do jornalista inglês Dom Phillips, seu amigo. Foram perseguidos de barco, alcançados e mortos a tiros de espingarda, depois da denúncia de uma quadrilha de pescadores ilegais. O primeiro era servidor de carreira da Funai, onde chegou a ser coordenador regional, até 2016. O estrangeiro era correspondente no Brasil, onde por mais de 15 anos escreveu reportagens para jornais de todo o mundo, principalmente a respeito de temas sociais e ambientais. O crime se deu em 5 de junho de 2022.

Para todos os citados, bem como para outros tantos anônimos que seguem perdendo a vida em nosso país, pelas mesmas razões, a crônica de hoje está sendo dedicada. E, com ela, nossa esperança de que essa triste realidade possa ser vencida.

1º.10.2023

Se você gostou desta crônica, garanta a continuidade do blog com uma doação. Isso ajudará a cobrir custos com sua manutenção. Faça isso usando a Chave PIX virtualidades.blog@gmail.com (qualquer valor ajuda muito) ou o formulário existente abaixo. São duas alternativas distintas para que você possa optar por uma delas e decidir com quanto quer ou pode participar, não precisando ser com os valores sugeridos. Toda contribuição é bem-vinda. No caso do formulário, a confirmação se dá depois das escolhas, no botão “Faça uma Doação”.

Uma vez
Mensal
Anualmente

FORMULÁRIO PARA DOAÇÕES

Selecione sua opção, com a periodicidade (acima) e algum dos quatro botões de valores (abaixo). Depois, confirme no botão inferior, que assumirá a cor verde.

Faça uma doação mensal

Faça uma doação anual

Escolha um valor

R$10,00
R$20,00
R$30,00
R$15,00
R$20,00
R$25,00
R$150,00
R$200,00
R$250,00

Ou insira uma quantia personalizada

R$

Agradecemos sua contribuição.

Agradecemos sua contribuição.

Agradecemos sua contribuição.

Faça uma doaçãoDoar mensalmenteDoar anualmente

O bônus de hoje é Índios, com Legião Urbana.